Papa mantém Banco do Vaticano,
mas com mais regras e maior controlo
RITA SIZA e SOFIA
LORENA 07/04/2014 / PÚBLICO
O IOR prosseguirá a sua missão "com prudência". Passará a
responder às novas estruturas criadas por Francisco e ao novo Secretariado da
Economia, chefiado pelo cardeal Pell, conselheiro próximo do Papa argentino.
Todas as
hipóteses estavam em cima da mesa: da mais radical, a extinção do Banco do
Vaticano, investigado por lavagem de dinheiro, à mais prudente, a sua
manutenção. Francisco, o Papa que disse que “S. Pedro não tinha conta em nenhum
banco”, decidiu que, afinal, a actual igreja Católica precisa de um.
O Vaticano
anunciou esta segunda-feira que “o santo padre aprovou uma proposta sobre o
futuro do Instituto das Obras Religiosas [designação oficial do banco] e
reafirmou a importância da sua missão para o bem da Igreja Católica, da Santa
Sé e do Estado do Vaticano”. O banco, lê-se no comunicado divulgado,
“continuará a sua actividade com prudência, trabalhando para providenciar
serviços financeiros especializados à Igreja Católica em todo o mundo”.
A proposta, que o
Vaticano não pormenoriza, foi elaborada por várias comissões de reforma e cabe
agora ao novo presidente do IOR, Ernst von Freyberg, transformá-la num plano
para “assegurar que o banco possa cumprir a sua missão, no âmbito das novas
estruturas financeiras da Santa Sé”. O comunicado precisa que “os serviços
benéficos que podem ser oferecidos pelo IOR” dizem respeito à sua “missão de
pastor universal”.
O plano terá de
ser aprovado pelo Conselho de Cardeais, que se reúne daqui a duas semanas, e pela
nova autoridade económica do Vaticano, criada pelo Papa em Fevereiro e liderada
pelo cardeal australiano George Pell – que também esteve envolvido na redacção
das recomendações relativas ao futuro do banco do Vaticano. Numa curta reacção
ao anúncio, o banco do Vaticano considerou a decisão de Francisco em manter o
banco um “poderoso apoio ao trabalho árduo [de reforma] iniciado há 12 meses”
pela direcção de Von Freyberg.
Assim que foi
eleito, há pouco mais de um ano, o Papa argentino ordenou uma investigação
interna ao funcionamento do banco, envolvido numa série de processos de lavagem
de dinheiro. Entretanto, alterou completamente a estrutura de supervisão das
actividades financeiras e administrativas do Vaticano.
Instrumento
precioso
Pell, conselheiro
próximo de Francisco e muito crítico da burocracia da Cúria (o governo do
Vaticano), é um novo “superministro”. O banco do Vaticano, até “agora
formalmente autónomo de todas as outras estruturas, dependente apenas do
conselho dos cardeais, é enquadrado dentro da estrutura económica e assim
colocado sob a autoridade do cardeal Pell e do seu Secretariado da Economia,
que vê reforçada a cada dia a sua posição”, escreve o jornal italiano Il Sole
24 Ore.
Na sua análise à
decisão do Papa, o diário económico italiano estima que o argentino “reconhece
a importância de uma plataforma financeira através da qual a Santa Sé possa
intervir onde precisar em qualquer parte do mundo, a partir das missões, para
chegar às dioceses em dificuldades”. Assim, terá concluído que “seria um erro
privar-se de um instrumento que, bem utilizado, pode ser precioso”.
Francisco
escolheu a opção prudente que era, no fundo, a mais provável. Vai manter o
banco, mas garantir que as suas actividades passarão a ser mais controladas e
integradas nas novas estruturas que acaba de criar. No último ano, já muito foi
feito para que o IOR passe a agir de acordo com as regras que vigoram na banca.
No Verão, o Papa
tinha ordenado que as normas internacionais de combate à lavagem de dinheiro e
financiamento do terrorismo integrassem a legislação em vigor no Vaticano. O
próprio banco iniciou várias investigações às suspeitas de actividades
ilícitas.
Centenas de
contas
Acusado pelas
autoridades italianas de não respeitar as normas que visam impedir que os
bancos sejam usados para lavar dinheiro, o IOR tem estado a analisar todas as
suas contas e centenas já foram encerradas – todas as que não pertencem a
instituições católicas, a membros do clero, funcionários ou ex-funcionários do
Vaticano, embaixadas e embaixadores acreditados junto do Vaticano. De acordo
com os estatutos, o IOR só existe para servir a Igreja.
Em Janeiro, a
consultora norte-americana Promontory, que foi contratada para investigar as
contas, já tinha passado revista a 55% dos clientes, uma tarefa que deve estar
concluída no Verão.
O IOR tem sido
origem de embaraços para o Vaticano ao longo de décadas, com a máfia e vários
grupos criminosos a aproveitarem o anonimato que o banco da Igreja oferecia
para lavar dinheiro. O maior escândalo aconteceu em 1982, quando o IOR se viu
envolvido na falência fraudulenta do Banco Ambrosiano, cujo presidente, Roberto
Calvi, se enforcou debaixo de uma ponte em Londres.
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