Financiamento no pós-troika cria
mal-estar entre Finanças e Banco de Portugal
CRISTINA FERREIRA
e PEDRO SOUSA CARVALHO 08/04/2014 - PÚBLICO
Existe uma
“relação cordial” com o BdP, garantiu um responsável das Finanças, para quem
“não é justo estar a julgar a posteriori se o BdP actuou da melhor forma".
Fontes ligadas à
banca e às Finanças estão a questionar a forma como o Banco de Portugal actuou
junto do Banco Central Europeu (BCE), por não ter acautelado atempadamente a
possibilidade de Portugal ter uma saída "limpa" sem que o sistema
financeiro ficasse refém das agências de rating para se financiar.
O problema de
fundo é que, enquanto o país esteve intervencionado, Mario Draghi suspendeu a
aplicação de uma cláusula que obriga os bancos que peçam empréstimos ao BCE a
ter de apresentar como garantias dívida pública com um nível de rating acima de
lixo (das quatro agências credenciadas pelo BCE, pelo menos uma tem de
classificar o país como investment grade). Porém, se o Governo optar pela saída
"limpa", a regra volta a aplicar-se e, neste caso, Portugal fica
refém da agência canadiana DBRS, a única que tem um rating acima de lixo. E, se
perder essa classificação, os bancos terão maiores dificuldades em se financiar
junto do BCE.
O mal-estar
sentido pela banca e pelas Finanças provocado por este cenário já foi dado a
conhecer ao BdP, que é acusado de não ter acautelado essa situação. Uma fonte
do sector financeiro disse que “não há um único papel a dizer que as condições
de acesso da banca portuguesa ao BCE, depois da saída da troika, se alteram”. A
mesma tese é defendida por um membro do Governo. Mas o BCE já veio dizer que,
se Portugal deixar de estar sob a alçada de um resgate ou cautelar, então a
dívida pública terá de ter um rating acima de lixo para ser aceite como
colateral em Frankfurt.
Sobre esta
polémica um responsável oficial das Finanças disse ao PÚBLICO: “Não comentamos,
nem temos de comentar a actuação do BdP no âmbito do eurossistema." Outra
fonte da instituição liderada por Maria Luís Albuquerque optou por evidenciar
que existe uma “relação cordial” com o BdP e que “não é justo estar a julgar a
posteriori se o BdP actuou da melhor forma” neste caso. Por seu turno, o BdP não se pronunciou.
Para os
banqueiros ouvidos pelo PÚBLICO, a decisão da equipa de Mario Draghi vai atrasar
e complicar a posterior resolução do acesso do sector aos mercados e torna mais
difícil a colocação de dívida pública junto dos investidores. É por isso que “a
medida do BCE deveria ter sido contrariada pelo BdP, pois trata-se de uma
posição tomada pelo board do BCE onde Carlos Costa tem assento”. Mas também não
é linear que o governador português conseguisse convencer os seus pares. Em vez
disso, salientou a mesma fonte, o BdP “enviou uma carta burocrática para os
serviços do BCE a tratar do tema e outra para os bancos a pedir-lhes que
estimassem as consequências da decisão e refizessem os seus planos de capital”.
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