EDITORIAL
Durão e Portugal ou um amargo
elogio
DIRECÇÃO
EDITORIAL 12/04/2014 - PÚBLICO
Durão Barroso ouviu elogios e auto-elogiou-se numa conferência onde imperou
o seu ego.
Demasiado evidente, demasiado
forçado, demasiado embaraçante, talvez mesmo demasiado indecoroso. Durão
Barroso, em fim de mandato europeu, esteve ontem em Lisboa numa conferência
promovida por si próprio, na qualidade de detentor do cargo de presidente da
Comissão Europeia, para ouvir em solo pátrio os elogios que na Europa lhe
negam. E ouviu muitos, em particular pela voz do Presidente Cavaco Silva:
“Posso testemunhar, como poucos, a atenção que o dr. Durão Barroso sempre
prestou aos problemas do país e a valiosa contribuição que deu para encontrar
soluções, minorar custos, facilitar apoios e abrir oportunidades de desenvolvimento.”
Ainda Cavaco Silva: “Foi gratificante para Portugal ter uma figura com o seu
prestígio e conhecimento da realidade do nosso país e do mundo no exercício de
tão altas funções.” Ou: “Portugal e os portugueses, tal como os outros
Estados-membros, muito lhe devem.” Passos Coelho, o primeiro-ministro, também
juntou a sua voz aos agradecimentos. “A Europa apostou e confiou em Portugal e
sempre fomos apoiados pelo presidente da Comissão Europeia”, acrescentando,
como se agradecesse ainda a ajuda de Barroso, que “o novo quadro financeiro
plurianual foi tudo menos uma negociação fácil”. Ora o presidente da Comissão,
em tempos tão criticado por ter virado costas a Portugal num momento de crise
grave para subir os degraus da Europa, não teve pejo em, face a tão benévolas
considerações, fazer eco delas em afirmações auto-elogiosas: “Por proposta e
insistência — não foi fácil — da Comissão Europeia, foi possível aumentar a
taxa de co-financiamento comunitária para os países em ajustamento.” Ou: “Por
minha proposta, foram atribuídos a Portugal mais mil milhões de euros.” Prestou,
é justo dizê-lo, “uma sincera homenagem ao esforço dos portugueses”. Mas na
verdade o que o trouxe a Lisboa foi o seu ego. O que fará com ele é o que o
futuro nos há-de dizer.
“Posso testemunhar a atenção que
Durão Barroso sempre prestou aos problemas do país”, agradece Cavaco Silva
NUNO RIBEIRO
11/04/2014 - PÚBLICO
A disciplina orçamental é um meio, não um fim, recordou o Presidente da
República, na abertura da conferência promovida em Lisboa pela Comissão
Europeia. A oposição esteve ausente.
“Posso testemunhar,
como poucos, a atenção que o doutor Durão Barroso sempre prestou aos problemas
do país e a valiosa contribuição que deu para encontrar soluções, minorar
custos, facilitar apoios e abrir oportunidades de desenvolvimento”, disse na
tarde desta sexta-feira o Presidente na República na abertura da conferência
Portugal: Rumo ao Crescimento e Emprego. Fundos e Programas Europeus:
solidariedade ao serviço da economia portuguesa, que está a decorrer na
Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa.
Daí que, quase a
terminar o seu discurso de quatro páginas, Aníbal Cavaco Silva tenha sido ainda
mais claro: “Portugal e os Portugueses, tal como os outros Estados-Membros,
muito lhe devem.”
Não foi esta a
única referência de Cavaco Silva ao seu antigo ministro dos Negócios
Estrangeiros e correligionário do PSD, actual presidente da Comissão Europeia,
que promoveu esta conferência. “Quero sublinhar que, ao longo destes dez anos à
frente dos destinos da Comissão, foi gratificante para Portugal ter uma figura
com o seu prestígio e conhecimento da realidade do nosso país e do mundo no
exercício de tão altas funções”, destacou o Presidente. Avaliando, também, como
“decisivo o seu contributo para que a Europa ultrapasse a crise do Euro.”
Perante uma
plateia de vários ministros – Paulo Portas, Pires de Lima, Nuno Crato, Aguiar-Branco,
Mota Soares, Assunção Cristas, Poiares Maduro -, com a ausência de dirigentes
ou membros da oposição e a presença de Nobre dos Santos, da FESAP (Federação
Sindical da Administração Pública, da UGT) -, as referências elogiosas ao
presidente da Comissão Europeia em fim de mandato não se ficaram pela voz de
Cavaco. Também o primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, que encerrou a
conferência, destacou a acção de Barroso na definição do novo quadro financeiro
plurianual. "A Europa apostou e confiou em Portugal e sempre fomos
apoiados pelo presidente da Comissão Europeia", disse Passos, fazendo uma
confissão: "O novo quadro financeiro plurianual foi tudo menos uma
negociação fácil."
Ausentes,
estiveram os parttidos à margem da maioria. Relativamente aos convites e à sua
aceitação para assistir à conferência, os partidos da oposição dividiram-se. O
PS recebeu convite para assistir e deu liberdade a cada deputado para fazer o
que entender. Já a bancada parlamentar do PCP recusou estar presente por não
querer "legitimar" uma iniciativa de "campanha eleitoral",
segundo fonte do grupo. No caso dos bloquistas, fonte da bancada garantiu que o
partido não recebeu qualquer convite para assistir à conferência e que a única
indicação formal que recebeu nesse sentido foi através de um contacto feito
para a comissão parlamentar dos Assuntos Europeus.
Durão Barroso,
nalguns casos à margem do texto escrito do seu discurso, referiu a sua
contribuição como líder da Comissão Europeia. “Por proposta e insistência – não
foi fácil – da Comissão Europeia foi possível aumentar a taxa de
co-financiamento comunitária para os países em ajustamento”, disse. E, ainda
mais assertivo: “Por minha proposta foram atribuídos a Portugal mais mil
milhões de euros”, disse, referindo-se à dotação de um programa de
desenvolvimento agrícola.
Para além deste
balanço sobre a sua actividade em prol do seu país, Durão Barroso não olvidou a
sua origem: “Enquanto cidadão português – os comissários europeus não são
apátridas, são cidadãos dos seus países”, justificou. No que foram declarações
directas sobre o seu protagonismo, e resposta às críticas da oposição ausente
no anfiteatro da Gulbenkian, o presidente da Comissão Europeia dedicou uma
frase de elogio aos seus concidadãos: “Tenho consciência dos sacrifícios que
foram feitos pelos portugueses”. Ou: “é meu dever, aqui e hoje, prestar uma
sincera homenagem ao esforço dos portugueses”.
As suas
referências foram, ainda, dirigidas de forma geral ao país – “Manifesto mais
uma vez a minha admiração e o meu respeito pelo modo como Portugal tem vindo a
responder à crise financeira, económico e social” -, mas sem rebuço referiu um
dos protagonistas da vida política: “(…) a determinação do primeiro-ministro Pedro
Passos Coelho nas reformas operadas ou em curso.” Passos Coelho encerraria a
conferência mais tarde.
Seis comissários
para uma mensagem
Como prova do
interesse que dá ao seu país, Barroso nomeou quem o acompanhou: os comissários
responsáveis pelos fundos estruturais e de investimento, de Joahnnes Hahn, da
Política Regional, a Maria Damanak, dos Assuntos Marítimos e Pescas, passando
por Laszlo Andor (Emprego, Assuntos Sociais e Inclusão), Dacian Ciolos
(Agricultura e Desenvolvimento Regional), Androulla Vassiliou (Educação,
Cultura, Multilinguismo e Juventude), Marie Geeoghegan- Quinn (Investigação e
Inovação), e o vice-presidente Antonio Tajani, com o pelouro da Indústria e
Empreendedorismo.
Uma tão vasta
delegação tem um objectivo. Da Gulbenkian para o país, “trazer uma mensagem
europeia de solidariedade e esperança a Portugal”. Neste ponto, o presidente da
Comissão destacou que a “solidariedade e a responsabilidade são duas faces da
mesma moeda”, revelando o que já se sabia: “Há países que gostam mais da
responsabilidade e outros da solidariedade”. Na sua intervenção de nove
páginas, utilizou por oito vezes a palavra solidariedade, uma solidariamente e
outra solidária. Referentes, sempre, à forma como a União Europeia encarou
Portugal.
Outra meta
concreta da sessão desta tarde é “preparar uma nova etapa que está no nosso
horizonte imediato, uma nova fase rumo ao crescimento e ao emprego”. E deixou
uma garantia, quanto ao Quadro Financeiro Plurianual 2014-2020: “E aqui, mais
uma vez, a Europa vem ajudar. Sem a União Europeia, Portugal não conseguiria o
nível de investimento que o Quadro Comunitário
de Apoio vem proporcionar.”
Em vésperas do
40º aniversário do 25 de Abril, o antigo primeiro-ministro recordou a
importância do auxílio da Europa a Portugal, lembrou a melhoria de vários
índices de desenvolvimento e falou de um país que não tinha saneamento básico
ou água potável. Um discurso que, sem referir o eurocepticismo, apontava para
este mal da construção europeia. Por isso, José Manuel Durão Barroso não deixou
de sublinhar a importância dos consensos: “A maioria dos portugueses, e os
partidos que os representam, é claramente a favor da Europa.”
Já Cavaco Silva
não fugiu à questão: “O Quadro Financeiro Plurianual pode, nalguns
Estados-membros, servir também para corrigir ou atenuar uma percepção errónea
do papel das regras europeias de disciplina orçamental e de supervisão das
políticas económicas, um erro que, nos dias de hoje, alimenta e favorece o
eurocepticismo.”
Sem dúvida por
isso, o Presidente da República recorreu ao didactismo de professor de
Economia: “A disciplina orçamental não é, em si mesma, um objectivo da política
económica. Pertence ao domínio dos instrumentos e importa evitar que se
transforme, aos olhos dos cidadãos, em restrição que tudo absorve e condiciona.
A disciplina orçamental é um meio, não um fim. A sua exigência a nível europeu
é uma consequência lógica da interdependência entre as economias.”
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