sexta-feira, 11 de abril de 2014

Durão Barroso ouviu elogios e auto-elogiou-se numa conferência onde imperou o seu ego. “Posso testemunhar a atenção que Durão Barroso sempre prestou aos problemas do país”, agradece Cavaco Silva.


EDITORIAL
Durão e Portugal ou um amargo elogio
DIRECÇÃO EDITORIAL 12/04/2014 - PÚBLICO
Durão Barroso ouviu elogios e auto-elogiou-se numa conferência onde imperou o seu ego.


Demasiado evidente, demasiado forçado, demasiado embaraçante, talvez mesmo demasiado indecoroso. Durão Barroso, em fim de mandato europeu, esteve ontem em Lisboa numa conferência promovida por si próprio, na qualidade de detentor do cargo de presidente da Comissão Europeia, para ouvir em solo pátrio os elogios que na Europa lhe negam. E ouviu muitos, em particular pela voz do Presidente Cavaco Silva: “Posso testemunhar, como poucos, a atenção que o dr. Durão Barroso sempre prestou aos problemas do país e a valiosa contribuição que deu para encontrar soluções, minorar custos, facilitar apoios e abrir oportunidades de desenvolvimento.” Ainda Cavaco Silva: “Foi gratificante para Portugal ter uma figura com o seu prestígio e conhecimento da realidade do nosso país e do mundo no exercício de tão altas funções.” Ou: “Portugal e os portugueses, tal como os outros Estados-membros, muito lhe devem.” Passos Coelho, o primeiro-ministro, também juntou a sua voz aos agradecimentos. “A Europa apostou e confiou em Portugal e sempre fomos apoiados pelo presidente da Comissão Europeia”, acrescentando, como se agradecesse ainda a ajuda de Barroso, que “o novo quadro financeiro plurianual foi tudo menos uma negociação fácil”. Ora o presidente da Comissão, em tempos tão criticado por ter virado costas a Portugal num momento de crise grave para subir os degraus da Europa, não teve pejo em, face a tão benévolas considerações, fazer eco delas em afirmações auto-elogiosas: “Por proposta e insistência — não foi fácil — da Comissão Europeia, foi possível aumentar a taxa de co-financiamento comunitária para os países em ajustamento.” Ou: “Por minha proposta, foram atribuídos a Portugal mais mil milhões de euros.” Prestou, é justo dizê-lo, “uma sincera homenagem ao esforço dos portugueses”. Mas na verdade o que o trouxe a Lisboa foi o seu ego. O que fará com ele é o que o futuro nos há-de dizer.


“Posso testemunhar a atenção que Durão Barroso sempre prestou aos problemas do país”, agradece Cavaco Silva
NUNO RIBEIRO 11/04/2014 - PÚBLICO

A disciplina orçamental é um meio, não um fim, recordou o Presidente da República, na abertura da conferência promovida em Lisboa pela Comissão Europeia. A oposição esteve ausente.

“Posso testemunhar, como poucos, a atenção que o doutor Durão Barroso sempre prestou aos problemas do país e a valiosa contribuição que deu para encontrar soluções, minorar custos, facilitar apoios e abrir oportunidades de desenvolvimento”, disse na tarde desta sexta-feira o Presidente na República na abertura da conferência Portugal: Rumo ao Crescimento e Emprego. Fundos e Programas Europeus: solidariedade ao serviço da economia portuguesa, que está a decorrer na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa.

Daí que, quase a terminar o seu discurso de quatro páginas, Aníbal Cavaco Silva tenha sido ainda mais claro: “Portugal e os Portugueses, tal como os outros Estados-Membros, muito lhe devem.”

Não foi esta a única referência de Cavaco Silva ao seu antigo ministro dos Negócios Estrangeiros e correligionário do PSD, actual presidente da Comissão Europeia, que promoveu esta conferência. “Quero sublinhar que, ao longo destes dez anos à frente dos destinos da Comissão, foi gratificante para Portugal ter uma figura com o seu prestígio e conhecimento da realidade do nosso país e do mundo no exercício de tão altas funções”, destacou o Presidente. Avaliando, também, como “decisivo o seu contributo para que a Europa ultrapasse a crise do Euro.”

Perante uma plateia de vários ministros – Paulo Portas, Pires de Lima, Nuno Crato, Aguiar-Branco, Mota Soares, Assunção Cristas, Poiares Maduro -, com a ausência de dirigentes ou membros da oposição e a presença de Nobre dos Santos, da FESAP (Federação Sindical da Administração Pública, da UGT) -, as referências elogiosas ao presidente da Comissão Europeia em fim de mandato não se ficaram pela voz de Cavaco. Também o primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, que encerrou a conferência, destacou a acção de Barroso na definição do novo quadro financeiro plurianual. "A Europa apostou e confiou em Portugal e sempre fomos apoiados pelo presidente da Comissão Europeia", disse Passos, fazendo uma confissão: "O novo quadro financeiro plurianual foi tudo menos uma negociação fácil."

Ausentes, estiveram os parttidos à margem da maioria. Relativamente aos convites e à sua aceitação para assistir à conferência, os partidos da oposição dividiram-se. O PS recebeu convite para assistir e deu liberdade a cada deputado para fazer o que entender. Já a bancada parlamentar do PCP recusou estar presente por não querer "legitimar" uma iniciativa de "campanha eleitoral", segundo fonte do grupo. No caso dos bloquistas, fonte da bancada garantiu que o partido não recebeu qualquer convite para assistir à conferência e que a única indicação formal que recebeu nesse sentido foi através de um contacto feito para a comissão parlamentar dos Assuntos Europeus.

Durão Barroso, nalguns casos à margem do texto escrito do seu discurso, referiu a sua contribuição como líder da Comissão Europeia. “Por proposta e insistência – não foi fácil – da Comissão Europeia foi possível aumentar a taxa de co-financiamento comunitária para os países em ajustamento”, disse. E, ainda mais assertivo: “Por minha proposta foram atribuídos a Portugal mais mil milhões de euros”, disse, referindo-se à dotação de um programa de desenvolvimento agrícola.

Para além deste balanço sobre a sua actividade em prol do seu país, Durão Barroso não olvidou a sua origem: “Enquanto cidadão português – os comissários europeus não são apátridas, são cidadãos dos seus países”, justificou. No que foram declarações directas sobre o seu protagonismo, e resposta às críticas da oposição ausente no anfiteatro da Gulbenkian, o presidente da Comissão Europeia dedicou uma frase de elogio aos seus concidadãos: “Tenho consciência dos sacrifícios que foram feitos pelos portugueses”. Ou: “é meu dever, aqui e hoje, prestar uma sincera homenagem ao esforço dos portugueses”.

As suas referências foram, ainda, dirigidas de forma geral ao país – “Manifesto mais uma vez a minha admiração e o meu respeito pelo modo como Portugal tem vindo a responder à crise financeira, económico e social” -, mas sem rebuço referiu um dos protagonistas da vida política: “(…) a determinação do primeiro-ministro Pedro Passos Coelho nas reformas operadas ou em curso.” Passos Coelho encerraria a conferência mais tarde.

Seis comissários para uma mensagem
Como prova do interesse que dá ao seu país, Barroso nomeou quem o acompanhou: os comissários responsáveis pelos fundos estruturais e de investimento, de Joahnnes Hahn, da Política Regional, a Maria Damanak, dos Assuntos Marítimos e Pescas, passando por Laszlo Andor (Emprego, Assuntos Sociais e Inclusão), Dacian Ciolos (Agricultura e Desenvolvimento Regional), Androulla Vassiliou (Educação, Cultura, Multilinguismo e Juventude), Marie Geeoghegan- Quinn (Investigação e Inovação), e o vice-presidente Antonio Tajani, com o pelouro da Indústria e Empreendedorismo.

Uma tão vasta delegação tem um objectivo. Da Gulbenkian para o país, “trazer uma mensagem europeia de solidariedade e esperança a Portugal”. Neste ponto, o presidente da Comissão destacou que a “solidariedade e a responsabilidade são duas faces da mesma moeda”, revelando o que já se sabia: “Há países que gostam mais da responsabilidade e outros da solidariedade”. Na sua intervenção de nove páginas, utilizou por oito vezes a palavra solidariedade, uma solidariamente e outra solidária. Referentes, sempre, à forma como a União Europeia encarou Portugal.

Outra meta concreta da sessão desta tarde é “preparar uma nova etapa que está no nosso horizonte imediato, uma nova fase rumo ao crescimento e ao emprego”. E deixou uma garantia, quanto ao Quadro Financeiro Plurianual 2014-2020: “E aqui, mais uma vez, a Europa vem ajudar. Sem a União Europeia, Portugal não conseguiria o nível de investimento que o Quadro Comunitário  de Apoio vem proporcionar.”

Em vésperas do 40º aniversário do 25 de Abril, o antigo primeiro-ministro recordou a importância do auxílio da Europa a Portugal, lembrou a melhoria de vários índices de desenvolvimento e falou de um país que não tinha saneamento básico ou água potável. Um discurso que, sem referir o eurocepticismo, apontava para este mal da construção europeia. Por isso, José Manuel Durão Barroso não deixou de sublinhar a importância dos consensos: “A maioria dos portugueses, e os partidos que os representam, é claramente a favor da Europa.”

Já Cavaco Silva não fugiu à questão: “O Quadro Financeiro Plurianual pode, nalguns Estados-membros, servir também para corrigir ou atenuar uma percepção errónea do papel das regras europeias de disciplina orçamental e de supervisão das políticas económicas, um erro que, nos dias de hoje, alimenta e favorece o eurocepticismo.”

Sem dúvida por isso, o Presidente da República recorreu ao didactismo de professor de Economia: “A disciplina orçamental não é, em si mesma, um objectivo da política económica. Pertence ao domínio dos instrumentos e importa evitar que se transforme, aos olhos dos cidadãos, em restrição que tudo absorve e condiciona. A disciplina orçamental é um meio, não um fim. A sua exigência a nível europeu é uma consequência lógica da interdependência entre as economias.”

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