Coro de críticas à concessão
de espaços em Monsanto na Assembleia Municipal
A reunião
da assembleia ficou marcada pela ausência de boa parte do executivo e pelo
facto de nenhum vereador se ter mostrado preparado para prestar esclarecimentos
sobre uma proposta do Urbanismo
Monsanto pouco a pouco vai sendo esventrado”, lamentou Diogo Moura, do CDS,
acrescentando que a “alteração de uso” que vai ocorrer “viola as condições
impostas pelo ICNF”
Inês Boaventura /
18-3-2015 / PÚBLICO
A concessão a um
privado de vários espaços e edifícios no Parque Florestal de Monsanto esteve debaixo
de fogo na reunião de ontem da Assembleia Municipal de Lisboa. A recomendação
do BE, na qual se defendia a ilegalidade da proposta camarária e se pedia a sua
revogação, só não teve o apoio do PS, do Parque das Nações Por Nós e da
presidente da assembleia.
Os três campos de
basquetebol existentes junto ao Moinho do Penedo também foram a debate
As hostilidades
foram abertas pelo bloquista Ricardo Robles, que condenou aquilo que considerou
ser “um negócio inaceitável, incompreensível” e “mau para a cidade”. O facto de
a autarquia não ter ainda entregado toda a documentação solicitada pelo partido
foi também criticada pelo deputado, que, face às “muitas dúvidas” existentes,
considerou que aquele que é apresentado pela câmara como um projecto de
ecoturismo “pode rapidamente transformar-se em ecoterrorismo”.
Em causa está a
entrega a um privado, através de um concurso público que teve apenas um
concorrente, da exploração de equipamentos hoteleiros e de restauração na
chamada “Casa do Presidente”, em duas casas abandonadas, numa área no perímetro
da Quinta da Pimenteira e no Moinho do Penedo. Em troca, o concessionário terá
que pagar uma renda mensal de 2600 euros (que nos primeiros três anos será de
apenas mil euros) e proceder à reabilitação do edificado, num investimento que
a câmara estimou em 3,7 milhões de euros.
Um dos problemas,
acusou Ricardo Robles, é a falta de fundamentação desse montante, que, segundo
disse, surge referenciado em “duas folhas A4”, nas quais “não se percebe como
foram calculados os valores”. “É risível aquela contabilidade”, concordou o
independente Fernando Nunes da Silva, questionando se estaria prevista a
utilização de “design de alta categoria” e de “pedras ornamentais”.
Mas, para este
deputado dos Cidadãos por Lisboa, é “política” a principal questão em torno
deste caso. “Aquilo que está em cima da mesa é, uma vez mais, saber se esta
assembleia prescinde dos seus poderes de fiscalização relativamente à
celebração de contratos que envolvem a câmara”, afirmou Nunes da Silva, que não
hesitou em dizer que houve “uma certa incompetência” na forma como o executivo
conduziu este processo.
No debate
acalorado que se gerou foram várias as vozes a defender que, tal como se dizia
na recomendação do BE, nos termos do Regime Jurídico das Autarquias Locais,
compete à assembleia municipal “autorizar a câmara municipal a celebrar
contratos de concessão e fixar as respectivas condições gerais”. Acontece que a
concessão destes espaços e equipamentos em Monsanto foi aprovada apenas pelo município,
não tendo passado pelo crivo da assembleia.
“É uma proposta
irregular e juridicamente mal fundamentada”, criticou Diogo Moura, do CDS, na
opinião de quem houve “um desrespeito pelas competências da assembleia”.
“Monsanto pouco a pouco vai sendo esventrado”, lamentou o deputado,
acrescentando que a “alteração de uso” que vai ocorrer nalguns edifícios “viola
as condições impostas pelo Instituto da Conservação da Natureza e das
Florestas”.
Foram também
várias as vozes a trazer a debate a questão dos três campos de basquetebol
existentes junto ao Moinho do Penedo. Tanto Ricardo Robles como Cláudia
Madeira, do PEV, como Natacha Amaro, do PCP, apontaram a existência de uma
incongruência entre as garantias que têm sido dadas pelo vereador José Sá
Fernandes e aquilo que estabelece o caderno de encargos do concurso, no qual se
prevê a instalação de uma tenda para eventos nos campos de jogo.
“O que é que vale
mais: o que diz à comunicação social ou o que está assinado e
contratualizado?”, perguntou Cláudia Madeira. “Entre o executivo e os privados
lá se prepara a negociata”, afirmou ainda a deputada, criticando o facto de
este processo ter sido “desenvolvido com o maior secretismo”.
Em resposta à
avalanche de críticas, o vereador da Estrutura Verde começou por dizer que “os
campos de basquetebol estão claramente fora do concurso”, não sendo permitida a
sua utilização pelo concessionário, “a não ser em três ou quatro eventos
anuais, de não mais do que um dia, e que têm que ser licenciados”.
Só depois de
muita insistência por parte de deputados de vários partidos é que Sá Fernandes
acabou por admitir que o caderno de encargos permitia a ocupação dos campos. “É
verdade que quando se lançou o concurso havia essa possibilidade, mas a única
proposta apresentada não previa isso”, disse o vereador, que, num tom exaltado,
garantiu que essa era uma questão já “ultrapassada”.
O autarca refutou
ainda que a proposta de concessão tivesse de ser submetida à assembleia
municipal, matéria em relação à qual o CDS chegou a pedir que fosse elaborado
um parecer jurídico. Em auxílio de Sá Fernandes veio o vereador Duarte
Cordeiro, que lembrou que contratos de concessão de quiosques e espaços em
mercados municipais “nunca vieram à assembleia municipal”.
A reunião da
assembleia municipal de ontem ficou também marcada por várias críticas ao
executivo camarário, pelo facto de entre os poucos vereadores da maioria que
estavam presentes nenhum estar em condições de prestar esclarecimentos sobre
uma proposta relacionada com o cálculo de compensações urbanísticas.
António Costa,
Fernando Medina e Manuel Salgado estiveram ausentes, Duarte Cordeiro só chegou
uma hora e meia depois do início da sessão e Sá Fernandes confessou que não se
tinha “preparado” para o efeito. Já Catarina Vaz Pinto, que era quem estava
oficialmente a representar o presidente da câmara, falou num “equívoco” para
justificar o facto de não estar a contar que a proposta fosse discutida.
Carlos Silva
Santos, do PCP, viu esse facto como demonstrativo de como a assembleia municipal
é “desvalorizada” pela câmara. Também Sérgio Azevedo, do PSD, atribuiu o
sucedido a “uma questão de desrespeito da câmara pela assembleia”.
“É notável que um
vereador venha dizer que não estava preparado”, criticou o líder da bancada
social-democrata em declarações aos jornalistas, apontando como outros exemplos
de um “desrespeito constante” a falta de resposta aos requerimentos da
assembleia e as ausências frequentes de António Costa. “Não há quem tenha mão
na condução dos trabalhos do executivo”, concluiu Sérgio Azevedo, reiterando a
tese que tem defendido várias vezes de que “não é compatível o exercício do
cargo de presidente da câmara com o de candidato a primeiro-ministro”.
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