terça-feira, 31 de março de 2015

Os desejos perigosos da maioria absoluta


Os desejos perigosos da maioria absoluta
Por Luís Rosa
publicado em 31 Mar 2015 in (jornal) i online

No domingo em que teve  a sua primeira derrota como líder do PS, António Costa produziu um soundbyte antes de as urnas fecharem:o PS precisa de ter uma maioria absoluta em Outubro, não “pela mesquinha vontade de [ter] mais deputados do que os outros”, mas “porque [quer] que o governo seja formado por decisão dos portugueses e não pelos jogos políticos na Assembleia da República ou condicionado pelo Presidente da República”. O líder do PS sente que o partido está a ser empurrado para coligações pós-eleitorais e quer evitá-las.

Obviamente que o soundbyte tentou fazer uma espécie de controlo de danos preventivo. Pressentindo a derrota na Madeira, o líder socialista tentou apagar o efeito negativo que uma derrota dos socialistas madeirenses podia ter na onda vitoriosa que António Costa quer criar no país. Mas revelou duas questões preocupantes.

A primeira foi mais um ziguezague estratégico depois do amor à primeira vista dedicado ao Syriza.

É bom recordar que no final do ano passado Costa já pedia a maioria absoluta quando era uma espécie de D. Sebastião, mas admitia coligações com praticamente toda a gente, à excepção do PSD de Passos Coelho: a extrema--esquerda doPCP e do Bloco Esquerda, a novidade do Livre e da Plataforma Tempo de Avançar e até mesmo Marinho e Pinto – pelo meio ainda houve o epifenómeno mediático de uma putativa coligação PS/CDS. Convenhamos que passar de uma espécie de coligação salada de frutas para a recusa de qualquer coligação é uma mudança algo radical em menos de um ano.

Olado mais preocupante, contudo, é outro: o perigo de alguém pensar que conseguirá a maioria absoluta em Outubro. As sondagens mostram um PS estagnado, com poucos pontos de vantagem face à actual maioria – como mostra uma insatisfação latente com a política da coligação PSD/CDS. A pouco mais de seis meses das eleições legislativas é pouco provável que os socialistas ou a coligação governamental consigam a maioria absoluta – mas quem fale com os dirigentes de um e outro lado percebe que o sentimento dos partidos que podem aspirar à vitória é que tal objectivo está perfeitamente ao seu alcance.


A ambição da maioria absoluta, normal em política, pode ser potencialmente perigosa tendo em conta o grau de conflitualidade política que se perspectiva até Outubro. Em primeiro lugar, existem vários casos judiciais em curso, como o caso Sócrates e o dos vistos gold, com informação política muito sensível que pode ser utilizada facilmente contra o PS ou a maioria PSD/CDS. A utilização de tal informação poderá legitimar uma concentração excessiva numa política de casos, em vez do debate em redor das ideias que poderão promover o desenvolvimento económico e social de que o país tanto precisa. Se a maioria PSD/CDS e o PS não o perceberem, podemos preparar-nos para uma votação histórica do partido de Marinho e Pinto e dos restantes partidos anti-sistema em Outubro. Na Madeira, os desconhecidos Juntos Pelo Povo já mostraram o que podemos esperar em Outubro: 10% dos votos na sua primeira eleição.

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