Ainda vão rolar mais cabeças VIP?
DIRECÇÃO EDITORIAL
18/03/2015 - PÚBLICO
O caso da alegada “lista VIP” de contribuintes já provocou uma baixa na
Autoridade Tributária.
Foi em Julho de
2014 que António Brigas Afonso substituiu Azevedo Pereira à frente da
Autoridade Tributária (AT). Um cargo de elevada importância, já que a AT
administra cerca de 60% de toda a receita pública. Esta quarta-feira, apresentou
a demissão do cargo de director-geral e, apesar de continuar a sustentar que
“não existe e nunca existiu” a famigerada “lista VIP” de contribuintes,
justificou a sua demissão com o facto de não ter informado a tutela sobre
“procedimentos internos” que podem ter criado a percepção de que essa lista
existia. E que procedimentos internos são esses?
Segundo o
próprio, numa carta enviada à ministra das Finanças a explicar a sua demissão,
a área de informática da AT terá mesmo chegado a propor “um procedimento de
controlo de acesso aos dados, com mecanismos de alerta de determinados
contribuintes e verificação da legalidade das respectivas consultas”. Se esse
tal procedimento não é uma lista VIP, é algo muito parecido. E, havendo essa
lista ou a intenção de criar essa lista, Brigas Afonso não tinha condições para
continuar. Uma lista VIP seria um assumir de que existem contribuintes de
primeira e de segunda, o que seria uma aberração constitucional. O que não é a
mesma coisa que dizer que a AT deva ser complacente com casos de violação do
sigilo fiscal.
O que é
surpreendente neste caso, além do caso em si, é que um director-geral dos
Impostos possa aparentemente estar meses a fio a estudar, a aperfeiçoar e a
testar um alegado mecanismo para condicionar o acesso aos dados de determinados
contribuintes sem dar nenhum cavaco à tutela, que continua a jurar a pés juntos
que de nada sabia. Nesta altura, o Parlamento, a PGR, a Inspecção-Geral de
Finanças e até a Comissão de Protecção de Dados já estão a investigar o caso. E
será uma questão de dias até se perceber se Brigas Afonso cai sozinho.
Lista VIP deixa secretário de
Estado do CDS na corda bamba
SOFIA RODRIGUES e
ROSA SOARES 19/03/2015 - PÚBLICO
António Costa lembra ao PÚBLICO que a lista foi criada na sequência do
acesso a dados fiscais de Passos Coelho e diz que os factos desmentiram o desmentido
do primeiro-ministro. Sindicato insiste que foi Paulo Núncio quem esteve na
origem da lista.
A demissão do
director da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) e a confissão de que a
informação prestada sobre a inexistência de uma lista de contribuintes VIP
gerou uma mini-crise política no Governo. No PSD paira a dúvida se o secretário
de Estado dos Assuntos Fiscais (do CDS) se consegue manter no cargo, mas para
já a sua saída foi travada publicamente pelo primeiro-ministro. O líder do PS,
António Costa, exige que o caso seja esclarecido e lembra que a lista foi
criada na sequência de processos disciplinares a funcionários por acesso aos
dados fiscais do primeiro-ministro.
Em declarações
exclusivas ao PÚBLICO, António Costa defende que “há que esclarecer cabalmente
a situação e apurar as responsabilidades. “Não é admissível que o desmentido do
primeiro-ministro na Assembleia da República, tenha hoje sido desmentido pelos
factos”, disse.
O líder do PS
recorda que “esta lista VIP foi criada na sequência de vários processos
disciplinares levantados a funcionários do fisco quando se questionava o
cumprimento pelo primeiro-ministro das suas obrigações”. “Não podem restar
dúvidas que os funcionários têm todas as condições para cumprir as suas funções
e que não há imunidades VIP”, salienta, acrescentando que rejeita mais
“passa-culpas”. “Abertura do ano letivo: culpa dos serviços; paralisação do
Citius: culpa dos serviços; caos nas urgências: culpa dos serviços. Tanta
culpa, não será culpa do governo?”, questionou.
Esse afastamento
de responsabilidades por parte do Governo pela alegada existência de uma lista
de contribuintes, à qual o acesso seria mais restrito por parte dos
funcionários do fisco, foi precisamente o ponto em que insistiram os deputados
da maioria e até Passos Coelho ao longo desta quarta-feira.
Vários membros do
Executivo – a ministra das Finanças, o secretário de Estado e o próprio
primeiro-ministro – tinham negado a existência de uma lista VIP. Essa rejeição,
como Passos Coelho disse no Parlamento, foi feita com base na informação dada
pela AT. Foi o próprio chefe do Executivo que, esta terça-feira, apontou o dedo
ao António Brigas Afonso, o director demissionário. “Acho que [Brigas Afonso]
fez bem em ter apresentado a sua demissão – nunca admitiria que uma lista dessa
natureza ou um procedimento dessa natureza pudesse existir na Autoridade
Tributária”, afirmou Passos Coelho, no Algarve, à margem de uma cerimónia da
Região de Turismo.
O
primeiro-ministro disse ainda manter a confiança em Paulo Núncio, o (único)
democrata-cristão que Paulo Portas recuperou da direcção anterior do partido
liderada por José Ribeiro e Castro. Passos Coelho disse não ver razões para
“pôr em dúvida a posição do secretário de Estado, uma vez que o Governo não
teve qualquer interferência neste processo”.
Mas, nos corredores
do Parlamento, os sociais-democratas têm dúvidas que o secretário de Estado se
consiga manter, depois de ter repetidamente negado a existência da lista, cuja
existência foi afirmada pelo chefe de serviços de auditoria da AT. No CDS, esse
é precisamente o ponto a que se agarra o partido de Paulo Portas para defender
o seu secretário de Estado. É que Paulo Núncio negou categoricamente a
existência da lista e nem hesitou.
A não intervenção
do Governo neste processo e a tentativa de responsabilização do director
demissionário foram os principais argumentos usados pela maioria PSD/CDS ao
longo do dia. “A Autoridade Tributária transmitiu ao Governo que não havia
lista. Se não acreditasse nessa informação tinha que se demitir, mas aceitou
como boa a explicação. Se subsistem dúvidas, abre-se o inquérito (…) Onde é que
o Governo agiu mal?”, questionou o social-democrata Duarte Pacheco, em resposta
ao PCP que trouxe o caso para o plenário. No período das declarações políticas
– em que o CDS ficou em silêncio – o comunista Paulo Sá afirmou que “a lista
VIP existe, mas mantêm-se as dúvidas sobre quem pediu, quem definiu os seus
objectivos, quem decidiu que nomes a integram”.
Duarte Pacheco
não assumiu que a lista existe, mas durante a manhã, horas depois de ser conhecida
a demissão de Brigas Afonso, reconheceu que a informação dada por este
director-geral não correspondia 100% à verdade. Logo depois a deputada do CDS
Cecília Meireles veio garantir que “o Governo nunca pediu para que houvesse
listas especiais”. Uma garantia que disse dar com base no que “resulta claro”
da demissão de Brigas Afonso.
O PS, pela voz de
João Galamba, acusou o Governo de tentar “culpar” os serviços do fisco pelo
problema. Para Pedro Filipe Soares, do BE, não há dúvida de que “o secretário
de Estado tem culpa no cartório” e que “o Governo teve conhecimento”.
As bancadas da
oposição exigiram que o Governo assuma “responsabilidades políticas”, mas
nenhum partido pediu a demissão de Paulo Núncio. Até porque foram aprovadas na
comissão de Orçamento e Finanças as audições do secretário de Estado e do
director demissionário (já na sexta-feira) e dos representantes dos sindicatos
dos trabalhadores dos impostos e dos inspectores tributários (quinta-feira).
Sindicato diz que
há indícios de que Núncio entregou lista VIP
Paulo Núncio
começou o dia a manifestar a sua disponibilidade para ser ouvido no Parlamento
e a rejeitar responsabilidades, embora admita que possa existir alguma
irregularidade: “Houve procedimentos internos e propostas no âmbito da
Autoridade Tributária nesta matéria, sem que jamais o Governo tenha tido
conhecimento dessa questão ou que o Governo tenha sido informado".
Mas a sua
situação pode mudar esta quinta-feira, depois da audição do presidente do
Sindicato dos trabalhadores dos Impostos. Ao PÚBLICO, Paulo Ralha defendeu que
há fortes indícios de que a da chamada lista VIP de contribuintes foi entregue
pelo secretário de Estado dos assuntos fiscais, Paulo Núncio, ao director da
Segurança Informática, que está na dependência directa de José Maria Pires,
subdirector Geral dos Impostos.
Em declarações ao
PÚBLICO, Paulo Ralha garante que na audição desta quinta-feira, na Assembleia
da República, vai avançar com nomes, como o do subdirector Geral dos Impostos,
mas também o director da Segurança Informática, o do chefe da Divisão
Informática e ainda o do responsável pelo departamento de Auditoria Interna.
Para Paulo Ralha,
“só os responsáveis referidos tinham poderes para criar os filtros” que
permitiam identificar o acesso dos funcionários dos impostos a uma lista de
contribuintes. O sindicalista adianta ainda que "é preciso encontrar
responsáveis e que têm de ser punidos".
Consulta a dados fiscais de
Portas e Manuel Pinho deu origem a processos
por S.F./Lusa
28-3-2015 / DN online
Situação foi avançada à TVI pelo presidente do Sindicato dos Trabalhadores
dos Impostos.
Segundo Paulo
Ralha avançou à TVI, foram abertos processos à consulta dos dados fiscais do
vice-primeiro-ministro Paulo Portas e ao ex-ministro da economia do governo de
José Sócrates Manuel Pinho.
De acordo com o
presidente do Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos, os processos
disciplinares aos funcionários que acederam à informação dos dois governantes
aconteceram o final de 2014.
Paulo Ralha
defendeu hoje na SIC Notícias, depois de o diretor geral da Autoridade
Tributária (AT) ter pedido a demissão, que este é "uma pessoa digna"
e não teria conhecimento da existência da lista Vip. O sindicalista referiu que
nas reuniões que teve com António Brigas Afonso, ficou com a sensação que este,
de facto, desconhecia a lista e considerou que o responsável é o
subdiretor-geral da Justiça Tributária e Aduaneira, José Maria Pires.
Paulo Ralha
defendeu ainda que o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Paulo Núncio,
tem responsabilidades no caso e que terá sido ele a entregar a lista.
O sindicalista
confirmou que ainda existem 140 processos a trabalhadores relacionados com
acesso a nomes que constam da lista.
A existência de
uma alegada lista Vip foi denunciada por este sindicato, mas sempre desmentida
pelo Governo. Na carta de demissão, Brigas Afonso realça que o Governo não teve
qualquer intervenção nesta questão, mas admite que a controvérsia sobre o tema
pode ter origem num conjunto de decisões internas da AT, organismo que detém
nos seus sistemas de arquivos informáticos informação cada vez mais
pormenorizada acerca dos contribuintes, o que, na sua opinião,
"obriga" a aperfeiçoar mecanismo que garantam que esses dados são
apenas utilizados para o cumprimento da missão da AT.
Em setembro do
ano passado, explica Brigas Afonso na carta enviada à ministra das Finanças, a
área de segurança informática da AT propôs um procedimento de controlo de
acesso aos dados, com mecanismo de alerta de determinados contribuintes e
verificação da legalidade das respetivas consultas.
No mês seguinte,
em outubro, o subdiretor-geral, substituto-legal de Brigas Afonso despachou
favoravelmente essa informação, solicitando uma avaliação sobre as medidas
propostas e que fosse apresentada uma proposta de implementação de uma medida
definitiva de salvaguarda do sigilo fiscal.
Paralelamente a
este procedimento e de forma totalmente autónoma e sem relação com os
acontecimentos anteriores de setembro e outubro, explica o diretor
demissionário, foi decidido também em setembro, e "de acordo com
procedimentos habituais", abrir um procedimento de auditoria na sequência
de notícias que revelavam indícios de violação do direito do primeiro-ministro,
Passos Coelho, ao sigilo fiscal.
Brigas Afonso diz
também que nos últimos anos foram abertos "diversos" procedimentos de
auditoria e de inquérito com base em noticias publicadas na comunicação social,
referentes a outros contribuintes, que não o primeiro-ministro.
E reafirma que
todos os processos e procedimentos em questão são do foro estritamente interno
da AT, não tendo origem na tutela politica, que não teve conhecimento desses
procedimentos em nenhuma fase.
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