quarta-feira, 25 de março de 2015

Governo convida câmara a concorrer à Carris e Metro, Costa não desarma


Governo convida câmara a concorrer à Carris e Metro, Costa não desarma
Concurso público internacional define o “mais baixo preço” como único critério para a adjudicação da subconcessão. Autarquia contesta e promete lutar contra o processo até às últimas consequências
Quem vencer o concurso fica obrigado a renovar toda a frota da Carris durante os oito anos do contrato

Marisa Soares e Inês Boaventura / 25-3-2015

O secretário de Estado dos Transportes desafiou ontem a Câmara de Lisboa a apresentar “a melhor proposta” ao concurso para a subconcessão da Carris e do Metro, em vez de seguir pela via judicial. “Tudo faremos para que este concurso seja anulado”, afirmou por sua vez o presidente da Câmara de Lisboa, que criticou o Governo por vir, “em final de legislatura” e de forma “precipitada”, “abrir guerras destas”.
Os termos do concurso público internacional foram publicados anteontem em Diário da República eo Governo já recebeu manifestações de interesse dos “principais operadores [de transporte] europeus”, disse Sérgio Monteiro aos jornalistas.
Em causa estão dois contratos: um para a subconcessão do sistema de transporte do Metro de Lisboa por nove anos, com obrigatoriedade de manutenção do material circulante, e outro para a subconcessão, durante oito anos, do serviço de transporte de superfície actualmente concessionado à Carris, ficando estipulada a obrigação de renovar toda a frota.
A adjudicação fica condicionada à apresentação, pelos interessados, dos comprovativos da requisição da licença ao Instituto da Mobilidade e dos Transportes para prestação daqueles serviços.
Segundo Sérgio Monteiro, os subconcessionários não poderão, durante o período de duração do contrato, aumentar o preço dos bilhetes, que fica indexado à inflação. Os interessados têm até 14 de Maio para apresentar propostas, que serão vinculativas por 180 dias. O critério de adjudicação é o “mais baixo preço”, uma opção que mereceu críticas por parte de António Costa. “Revela bem qual é a intenção do Estado”, acusou, lamentando que o critério não inclua “a qualidade, a rede, o serviço prestado”. “O critério é a degradação do serviço”, concluiu o autarca socialista durante a reunião de câmara, antecipando que se poderá também esperar “uma ofensiva muito grande sobre os direitos dos trabalhadores” da Carris e do Metro.
Sérgio Monteiro contrapôs dizendo que “os indicadores de qualidade e regularidade do serviço manter-seão iguais ou irão melhorar”. Garantiu ainda que esta operação permite ao Governo “transferir a responsabilidade do investimento no material circulante para o parceiro privado ou a entidade pública que ficar com a subconcessão”, uma vez que o Estado “não tem condições financeiras para o fazer”.
Para o vice-presidente da câmara, Fernando Medina, o que está em cima da mesa é “a manutenção da rede” hoje existente durante um período de oito anos. “É entregar uma operação fechada que sabemos que não funciona bem”, disse, lembrando que o sistema perdeu 100 milhões de passageiros em quatro anos.
Também o PCP condenou aquela que considera ser uma decisão “absolutamente desastrosa” do Governo, defendendo que o município deve “travá-la por todos os meios ao seu alcance”. Para o vereador João Ferreira, esta que é “uma decisão estruturante para o futuro do serviço público de transportes” é ainda “mais condenável” por acontecer “no fim do tempo de vida do Governo”.
Com os votos favoráveis da maioria e do PCP, e os votos contra do PSD e do CDS, foi aprovada na reunião uma proposta que mandata António Costa para “intentar todas as acções judiciais ou arbitrais, incluindo procedimentos cautelares, que se revelem necessárias à defesa dos interesses do município”. Entre as acções está a impugnação da resolução de Conselho de Ministros que deu luz verde ao lançamento do concurso, que o presidente da câmara considera ser “ilegal”. “O Estado carece de competência para abrir o concurso”, justifica o autarca, defendendo que “nos termos da lei a entidade habilitada para exercer a função de concedente é o município e só o município”.
O secretário de Estado não tem dúvidas. “O Estado é o concedente e tem plena legitimidade para lançar o concurso”, afirmou, remetendo para um parecer favorável do conselho consultivo da Procuradoria-Geral da República, que será publicado em breve. “Estamos confortáveis na solidez e robustez jurídica do parecer”, realçou, poucas horas depois das declarações de António Costa: “Nem o Estado tem competência para concessionar ou subconcessionar, nem os conselhos de administração o podem fazer sem autorização do concedente.”
O autarca deixou no ar uma pergunta em tom de desafio aos privados que venham a concorrer: estarão eles preparados para “entrar em conflito com o município” em questões como “a localização das paragens, o sentido das vias e a existência de corredores bus”?
Pelo PSD, Fernando Seara contestou a interpretação do presidente da câmara, e sustentou que é o Estado o titular das concessões que estão hoje em vigor. Já o vereador do CDS, João Gonçalves Pereira, defendeu que a votação da proposta subscrita por António Costa devia ser adiada até que fosse conhecido o caderno de encargos do concurso, ideia que não foi acolhida pelos restantes eleitos.

Em Novembro de 2014, a autarquia aprovou uma “proposta de assunção” da gestão da Carris e do Metro “por contrato interadministrativo a celebrar com o Estado”. Esta proposta, porém, foi rejeitada pelo Governo por “puro preconceito ideológico”, diz António Costa. A explicação de Sérgio Monteiro é outra: “Tínhamos de saber o que os privados propunham para saber se a proposta da câmara era melhor”. Agora, “a bola está com a Câmara de Lisboa”, afirmou o secretário de Estado, sublinhando que espera que a autarquia “valorize” a “boa-vontade do Governo”, por fazer coincidir o termo dos contratos de subconcessão com o fim dos contratos de concessão de que é titular.

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