Ilustrações de Charlrmagne na revista "THE ECONOMIST"
Europa. Um regresso às origens
Por Luís Rosa
publicado em 11
Mar 2015 in
(jornal) i online
Algum dia a Europa perde a paciência com os gregos e a União Europeia
inicia uma nova vida: um clube exclusivo para Alemanha, França, Bélgica,
Holanda, Luxemburgo, e pouco mais
Desde o início da
crise da dívida soberana, a secção Charlemagne da influente revista “The
Economist” passou a ter outra importância, já que é naquele espaço que se
aborda o futuro e o presente da União Europeia. O título da secção traduz o
nome francês de Carlos Magno – imperador da Idade Média que liderou um povo, os
Francos, que ocupava os territórios que correspondem hoje ao Oeste da Alemanha,
à França, à Bélgica, ao Luxemburgo e à Holanda. As suas vitórias militares
levaram à união dos diversos povos germânicos e ao domínio da Europa ocidental.
Quando morreu, Carlos Magno era de facto o pai da Europa, responsável pela
consolidação do cristianismo e pela expansão cultural do continente.
A forma como a
União Europeia está a evoluir tem levado os especialistas a pensar numa
Charlemagne que corresponda ao território que os Francos ocupavam quando Carlos
Magno chegou ao poder. Pode parecer uma utopia mas não é. É bom que tenhamos
isso presente sempre que falamos da Grécia e da sua possível saída do euro e da
União Europeia.
Isto porque a
questão da Grécia faz lembrar cada vez mais uma telenovela. Mas uma telenovela
em que história está estagnada – os episódios repetem-se, os personagens dizem
as mesmas coisas e continuamos muito longe de saber o fim da história. Nos
últimos dias temos vindo a assistir ao mesmo melodrama semelhante ao de
Fevereiro. Mais uma vez, os gregos vão ficar sem dinheiro no final do mês e
vêem--se aflitos para pagar os salários dos seus funcionários públicos e
novamente a Europa pede que se façam mais reformas. A Grécia quer os 1,9 mil
milhões de euros que correspondem ao lucro que os bancos centrais da zona euro
tiveram com compra e venda de dívida pública grega mas o Banco Central Europeu
(BCE) não transfere o dinheiro. A Grécia quer o desembolso de 7,2 mil milhões
de euros do empréstimo da troika mas o Eurogrupo, o BCE e o FMI só desbloqueiam
o dinheiro com mais reformas – essa palavra maldita.
É importante
recordar que o acordo melodramático de Fevereiro com o Eurogrupo serviu apenas
para a Grécia ganhar tempo, não serviu para a Grécia ter acesso imediato a
dinheiro, sendo certo que a Grécia terá de pagar mais de 4 mil milhões aos
credores durante o presente mês. Para agravar toda a situação, o governo do
Syriza decidiu ontem retirar 555 milhões do fundo que serve para recapitalizar
a banca grega – sector esse que tem sofrido uma gravíssima fuga de depósitos
para o estrangeiro.
Como pano de
fundo desta novela temos a eventual necessidade de negociar um novo resgate – o
terceiro – até ao próximo Verão. Serão mais 30 a 50 mil milhões de euros –
o que fará com que os empréstimos da troika totalizem mais de 300 mil milhões
de euros.
Para agravar toda
esta situação, temos ainda um irresponsável e xenófobo ministro da Defesa grego
a ameaçar a Alemanha de que abre as portas à imigração árabe e do Norte de
África para que os terroristas jihadistas cheguem mais depressa a Berlim.
A paciência da
Europa com a Grécia não é ilimitada e algum dia, a continuar esta escalada,
terminará. A utilização permanente da chantagem como método de negociação
política não é aceitável – nem da Alemanha com a Grécia nem da Grécia com a
Europa. Quem pede dinheiro emprestado tem de mostrar que é capaz de o pagar –
esse é o pensamento de qualquer contribuinte do Norte da Europa como de
qualquer credor com amor ao seu dinheiro. Aplica-se à Grécia como a Portugal e
a qualquer outro país. Se a Grécia não perceber isso, e é possível que não
queira perceber, uma União Europeia que corresponda apenas ao antigo império
carolíngio (porventura, com o acréscimo dos nórdicos) não estará assim tão
longínqua.
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