Aviário de ministros
VASCO PULIDO
VALENTE 07/03/2015 - PÚBLICO
Do incidente fiscal de Pedro
Passos Coelho só uma coisa se deve concluir: as “juventudes partidárias”
precisam de ser abolidas, como primeiro acto para a regeneração do regime.
Pedro Passos
Coelho teve uma carreira típica. Entrou muito cedo na JSD, à força de trabalho
e zelo conseguiu chegar a presidente dessa inconcebível organização e, através
dela, entrou no Parlamento.
Quando saiu aos
35 anos, sem outra qualificação que não fosse o liceu, foi obrigado a começar
uma vida normal: resolveu tirar um curso de Economia e, como entretanto se
casara, arranjar um emprego. Por essa altura, jantei com ele meia dúzia de
vezes, por sugestão de um amigo comum, Eduardo Azevedo Soares. Achei Passos
Coelho um homem agradável e sensato, mas transparentemente inseguro. Também se
via que o dinheiro não lhe sobrava e o futuro era para ele obscuro e, de
maneira geral, pouco prometedor. Não acredito que naquele tempo lhe passasse
pela cabeça chegar a primeiro-ministro.
Como ele, houve
centenas de pessoas que, por causa de uma educação perversa nas “juventudes
partidárias”, entraram na meia-idade (os 35 anos de que fala Dante) sem um
passado profissional e com uma visão do mundo distorcida pela incessante
intriga a que se reduzia a actividade interna do PS e do PSD e em que
participavam de pleno direito e, às vezes, como personagens maiores. Pior
ainda, esta espécie de currículo dava uma certa autoridade a gente a quem
faltava qualquer outra. Não vale a pena falar de António José Seguro. Mas basta
lembrar que António Costa proclama por aí com orgulho que se inscreveu no PS
aos 14 anos, para se perceber a natureza da aberração que os partidos promovem,
julgando manifestar a sua perenidade e a sua força. Como se a perenidade e a
força consistissem em enganar inocentes, abaixo da idade do consentimento
político.
A condição dos
membros das várias “juventudes” dos partidos (que vão até aos 30 anos) acaba
por ser uma condição de relativa irresponsabilidade, sobretudo para aqueles que
exercem cargos no “aparelho”. Os deveres para com a sociedade e o Estado são
obscurecidos pelas pequenas lutas domésticas pelo poder e pela grande questão
de saber se a seita consegue ou não ocupar o governo e o Estado – fonte de
favores, recompensas, influência e dinheiro. Este mundo fechado sobre si
próprio não se importa muito com o mundo exterior e não exige um comportamento
cívico exemplar. Pelo contrário, tolera uma imensa quantidade de “erros”, por
assim dizer, em nome do interesse superior da facção. Do incidente fiscal de
Pedro Passos Coelho só uma coisa se deve concluir: as “juventudes partidárias”
precisam de ser abolidas, como primeiro acto para a regeneração do regime. Os
jovens que se inscrevam onde quiserem na idade de votar e que sejam tratados
como o militante comum. Que os partidos não sirvam mais de educadores da
“classe política” e aviário de ministros. Basta o que
basta.
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