quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Qual era a alternativa para salvar o BES? Editorial/ Público. PT manda investigar a fundo ligações ao Grupo Espírito Santo e Granadeiro demite-se. /Vítor Bento não exclui redução de trabalhadores e balcões no Novo Banco. / Caso BES é exemplo da “ligação entre o poder político e o poder financeiro”, diz Manuel Monteiro.


EDITORIAL / PÚBLICO
Qual era a alternativa para salvar o BES?
DIRECÇÃO EDITORIAL 07/08/2014 - 00:21
A política misturou-se com o caso BES na Assembleia e o resultado foi uma grande demagogia.
Maria Luís Albuquerque foi nesta quinta-feira ouvida na comissão permanente da Assembleia da República a propósito do Banco Espírito Santo (BES). Nem os partidos que apoiam o Governo nem os da oposição saíram bem na fotografia. Num debate que exigia serenidade, dada a sensibilidade com que o tema deveria ser tratado, ninguém teve a preocupação de procurar discutir, aprofundar ou encontrar alternativas ao modelo que foi escolhido pelo Banco de Portugal para salvar o BES.

Nesta altura é quase demagógico estar a comparar a actuação do Banco de Portugal e dos governos nos casos BPN e BES, como fizeram ontem o PSD e o CDS. Na altura do BPN, o contexto era outro, a emergência era outra e a própria legislação era diferente. E as medidas de resolução que foram aplicadas agora para salvar o BES resultaram de uma legislação que não é uma invenção deste Governo e dos partidos da maioria. A nova lei está a ser implementada em toda a Europa de forma concertada. Portugal teve foi o azar de estar a servir de cobaia.

À esquerda na comissão permanente do Parlamento, partidos como o PCP e o Bloco mostraram que o que os separa desta nova lei para salvar a banca é uma discordância ideológica que parece insanável.

Já o Partido Socialista, que teve a iniciativa de chamar a ministra ao Parlamento com carácter de urgência, acabou por sair da audição fragilizado, já que se limitou a criticar as opções do Governo e do Banco de Portugal sem nunca dizer o que fariam os socialistas se fossem chamados a decidir. Nacionalizava-se o BES? Liquidava-se o banco? Recapitalizava-se como se fez no BCP, BPI e Banif?


A medida da resolução não será com certeza isenta de risco, como anda a propalar a ministra das Finanças. Mas até agora parece ser a que mais protege o dinheiro dos contribuintes.


Henrique Granadeiro tem estado debaixo de fogo por causa do investimento em empresa do Grupo Espírito Santo

PT manda investigar a fundo ligações ao Grupo Espírito Santo e Granadeiro demite-se
ANA BRITO 07/08/2014 - PÚBLICO
Gestor renuncia às funções na PT e diz que não convive bem “com os encargos e responsabilidades de outros”. Administração diz que não sabia dos investimentos na Rioforte e contrata auditor externo

Sai Henrique Granadeiro, entram os auditores externos. Nesta quinta-feira, o presidente do conselho de administração e da comissão executiva da Portugal Telecom (PT) demitiu-se e ficou a saber-se que os administradores da operadora contrataram a PriceWaterhouseCoopers(PwC) para “realizar uma análise abrangente de todos os aspectos relevantes relacionados com as aplicações de tesouraria em entidades do Grupo Espírito Santo”.

Num comunicado enviado à CMVM, a administração da PT diz que nem o conselho, nem a comissão executiva, “aprovaram ou discutiram” os investimentos na Rioforte, mas querem o tema investigado a fundo. Entre outros aspectos, a administração quer saber se houve alguma irregularidade na forma como os investimentos na Rioforte foram reportados aos órgãos de liderança, apurou o PÚBLICO.

O comunicado da PT nada refere quanto ao período temporal que deverá ser abrangido pela auditoria, mas o PÚBLICO sabe que estão em causa as relações financeiras com o BES e o GES (que remonta a 2000, quando as duas empresas assinaram uma parceria estratégica e trocaram participações accionistas) nos últimos anos e não apenas os financiamentos de 900 milhões de euros que causaram a polémica. Actualmente a PT tem 2% do “BES mau” e o “BES bom” tem cerca de 10% da PT.

Granadeiro, que tem estado debaixo de fogo desde que se tornou pública a aplicação da PT em papel comercial da Rioforte (holding não financeira do GES - Grupo Espírito Santo), sai, mas deixa recados. “Convivo bem com os meus actos, mas não com os encargos e responsabilidades de outros”, escreve Granadeiro na carta de renúncia enviada ao conselho de administração e a que o PÚBLICO teve acesso.

Até à data, só Henrique Granadeiro e Luís Pacheco de Melo (administrador financeiro da PT) têm sido associados ao investimento na Rioforte. Mas agora o presidente cessante espera que a auditoria encomendada pelo conselho de administração da PT venha fazer-lhe justiça. “Estou seguro que a auditoria externa e independente (…) evidenciará os processos e as causas do incidente e demonstrará que sempre agi no melhor interesse da Portugal Telecom”, escreve o gestor.

A notícia da demissão de Granadeiro foi adiantada pelo Jornal de Negócios e confirmada uma hora e meia mais tarde pela PT em comunicado enviado à CMVM. Mas esse é parco em relação a palavras sobre a actuação do presidente cessante. “O Presidente do Conselho de Administração e da Comissão Executiva da PT, Dr. Henrique Granadeiro, informou hoje o Conselho de Administração que, tendo conduzido todos os trabalhos necessários para garantir a convocação de uma AG e toda a informação aos accionistas, apresentou a sua renúncia de todas as funções que detém no Conselho de Administração”, lê-se no comunicado da PT.


Já Granadeiro assegura que, “desde a primeira hora”, desde que foi “surpreendido com a situação de incumprimento generalizado das obrigações do BES para com a PT no quadro da implosão” do GES, entendeu dever “assumir o encargo de evitar ou minorar” as consequências do default do GES na avaliação patrimonial da PT “e na continuidade do processo de fusão com a Oi”.

E nesse âmbito o gestor assegura que “defendeu até ao limite os interesses do grupo”, em particular da PT SGPS, “desenvolvendo todas as diligências necessárias ao cumprimento pelo BES – e não só pela Rioforte – das obrigações e compromissos assumidos” quer perante a PT, quer pela Oi. Mais recados.

A fim de “deixar plena liberdade” à administração da empresa para “conduzir os trabalhos preparatórios” da assembleia-geral de accionistas (onde serão votados os termos do novo acordo anunciado a 16 de Julho para salvar a fusão com a Oi), Granadeiro sai. Mas pelo meio, fica outro recado: “Entendo que devo renunciar ao cargo de presidente do CA, seguindo a recomendação da CE da Portugal Telecom SGPS”, escreve o ex-chairman da PT.

Depois da saída de Henrique Granadeiro, o conselho de administração da PT é composto por Luís Pacheco de Melo, Alfredo Baptista, Carlos Alves Duarte, Manuel Rosa da Silva, Pedro Leitão, Shakhaf Wine (que são administradores executivos), Francisco Soares, Gerald McGowan, João Mello Franco, José Basto, Helena Nazaré, João Matos Gomes, Milton Vargas, Nuno Vasconcellos, Rafael Mora (ambos em representação da Ongoing) e Paulo Varela (Visabeira).

Estes responsáveis vieram “clarificar” na nota enviada ontem ao supervisor da bolsa “que, em relação às aplicações de tesouraria na Rio Forte Investments S.A. (“Rioforte”), nem o Conselho de Administração nem a Comissão Executiva da PT aprovaram ou discutiram, antes das notícias veiculadas na comunicação social no final de Junho, essas aplicações”.

Por esse motivo, o CA PT “mandatou directamente a PriceWaterhouseCoopers(PwC) para analisar, de forma independente, os procedimentos e actos relativos a este assunto até à data”. O PÚBLICO sabe que a comissão de auditoria da operadora de telecomunicações, encabeçada por João Mello Franco, está também a concluir um relatório sobre estes investimentos.

A notícia da auditoria foi avançada pelo Expresso, que deu conta de um pedido de auditoria forense, o tipo específico de auditoria destinado a perceber se há algum indício de crime. Segundo o Expresso, o objectivo do conselho de administração da PT é perceber se houve alguma irregularidade nas aplicações de tesouraria realizadas pela empresa no GES ao longo destes anos. A administração da PT nunca refere o termo forense, mas esta não é uma auditoria corrente, destinada a validar as contas que são apresentadas aos accionistas. As auditorias forenses realizam-se quando há dúvidas ou situações que levantam suspeitas que precisam de ser esclarecidas, que é o que o conselho de administração pretende.


Vítor Bento não exclui redução de trabalhadores e balcões no Novo Banco
Por Ana Suspiro
publicado em 7 Ago 2014 in (jornal) i online

O presidente do Novo Banco, que sucedeu ao Banco Espírito Santo (BES), admitiu ontem que “vai ter que haver um redimensionamento do banco”. Na primeira entrevista no cargo, dada à SIC, Vítor Bento reconheceu mesmo que é provável que esse processo atinja o número de trabalhadores e de balcões do terceiro maior banco português. Será um plano a acertar com os “stakeholders” (partes interessadas) da instituição.

Esta possibilidade deixada em aberto contrasta com o discurso feito horas antes no Parlamento pela ministra das Finanças. Para Maria Luís Albuquerque, a solução encontrada para resgatar BES é que “melhor defende todos os interesses em jogo”: trabalhadores, depositantes e contribuintes

A gestão do novo banco vai apresentar um plano de reestruturação, no prazo de um a três meses, cujo principal objectivo será o de assegurar que o capital que foi colocado nesta solução “é totalmente reembolsado”. No entanto, Vítor Bento foi logo avisando que: “milagres não sei fazer”. O plano irá também contemplar a venda de activos, uma estratégia que terá de encontrar um equilíbrio entre o impacto no capital e a geração de rendimento do que for alienado.

Apesar do Novo Banco ter recebido um capital de 4900 milhões de euros, a prioridade será reembolsar a parte que foi financiada pelo Estado, através da linha de troika, e que está actualmente em 3900 milhões de euros. A venda do banco que ficou com os activos bons do BES será a principal forma de devolver os fundos ao Estado. Contudo o esforço de garantir que a nova entidade é viável, e portanto passível de atrair investimento, “é um desafio que vai levar o seu tempo”, sublinhou Vítor Bento. E o tempo limite da nova gestão do banco são os dois anos do prazo limite do empréstimo concedido pelo Estado ao Fundo de Resolução da Banca.

Vítor Bento deixou contudo a garantia: “O banco hoje é mais seguro e mais forte do que era na sexta-feira”, reafirmando que os depositantes estão protegidos.

O gestor que veio da SIBS (Sociedade Interbancária de Serviços)  e não tinha conta no BES – agora já tem – confidenciou que hesitou em aceitar o convite para presidir ao Banco Espírito Santo. “Eu tinha a melhor vida possível. Era bem pago e tinha tempo para a actividade cívica”.

Vítor Bento, que se demitiu do Conselho de Estado depois de assumir a presidência do BES, revelou que recebeu apelos a um sentido de missão e de dever patriótico para evitar uma débâcle financeira. E quando o desafio lhe foi colocado, lembra, o quadro não era tão dramático.

O gestor, que assumiu a presidência do BES num domingo a 14 de Julho, mas que desde segunda-feira tem a sua equipa, justificou que deu a entrevista depois de muita gente insistir para que desse  a cara para explicar as implicações da intervenção no banco. Bento realçou contudo que apesar do silêncio que manteve até ontem, a sua cara é a que mais tem aparecido na imprensa nos últimos dias.

O presidente do Novo Banco não negou ainda que alguns depositantes terão saído   – ontem o jornal “Público” noticiava que a Caixa tinha recebido 200 milhões de euros de depósitos no dia a seguir ao resgate do BES. Mas, sublinhou na SIC: “se alguns saíram, a sua grande maioria mantém o contrato com o banco”, desvalorizando o impacto das saídas.


Caso BES é exemplo da “ligação entre o poder político e o poder financeiro”, diz Manuel Monteiro
SÃO JOSÉ ALMEIDA 07/08/2014 - PÚBLICO
Antigo líder do CDS comenta caso BES e critica proximidade de políticos da direita portuguesa com o sector bancário.

Manuel Monteiro, antigo líder do CDS, afirmou ao PÚBLICO que “a quantidade de consultores” do sector bancário que são políticos, “é um exemplo da permanente ligação entre o poder político e o poder financeiro”. Isto porque, “num país tão pequeno nada se passa sem que haja ligações entre todos”. E concretiza que “nomeadamente o Banco Espírito Santo tem tido ao longo dos anos pessoas ligadas à direita portuguesa”. O antigo deputado à Assembleia da República considera que “este é um dos problemas centrais da democracia portuguesa”.

Indo mais longe, Monteiro afirma que os responsáveis dos “partidos da área da direita portuguesa, ao longo dos anos, têm circulado de uma forma constante entre tomar posições políticas e dar pareceres para empresas da área financeira”. E conclui que “é óbvio que se perde a independência de ambas as partes e que isso prejudica o funcionamento da democracia.

Monteiro considera que “é lamentável percebermos o Estado a que chegámos perante uma conivência cúmplice e silenciosa da própria direita portuguesa”. E precisa: “A direita, tal como eu sempre a entendi, não é aquela que se rende perante a ausência de valores, nos quais a ética e a honra têm de estar sempre presentes em qualquer sociedade. Aquilo que se verifica é que a direita com responsabilidades em Portugal ou vai atras do prejuízo ou é conivente com o prejuízo.”

O antigo líder do CDS sustenta que esta situação leva a que “face a todas as soluções que são encontradas, a primeira reacção é de desconfiança em relação aos políticos que as tomam”. No seu caso particular garante que tem “a maiores dúvidas na solução encontrada”, pelo que considera que “a história dirá a quem isto beneficiou principalmente”.

As dúvidas de Monteiro prendem-se ao facto de Portugal ter “um tecido empresarial cujo grau de endividamento, que ficou no banco bom, estava dependente e associado a acções e obrigações que ficaram no banco mau”. Uma situação que, na sua opinião, “pode vir a gerar gravíssimos problemas de tesouraria por parte considerável de pequenos e médios empresários”.

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