A balcanização do PS
Por Luís Rosa
publicado em 25 Ago 2014 in
(jornal) i online
Costa parece a cara do
guterrismo: o diálogo com tudo e todos do tempo do orçamento limiano
1. Não é a primeira vez os
socialistas se comem vivos em público. Os apoiantes de António Guterres e Jorge
Sampaio já o fizeram no início dos anos 90, repetindo-se agora o filme com
Seguro e Costa. Mas não é certo que os históricos do PS consigam colar todos os
cacos da luta que vai aumentar até 28 de Setembro, tal como Jorge Coelho e
Ferro Rodrigues fizeram há quase 20 anos. O PS arrisca-se a uma balcanização
que pode pôr em perigo a coesão do partido.
A entrevista de António Costa
ao "Expresso" demonstra isso mesmo. A forma acintosa como se refere a
António José Seguro, acusando-o indirectamente de "comprar votos", de
ser cúmplice de irregularidades eleitorais "ao ressuscitar mortos"
nos cadernos eleitorais e de nada ter feito na sua carreira política é o tiro
de partida para uma violência verbal que vai atingir níveis inauditos para uma
campanha interna. Socialistas prudentes neste momento são muito poucos.
Pior que as cenas de pugilato
em forma de palavras, é a forma eleitoral escolhida para dirimir a luta entre
Seguro e Costa. As primárias podem ser uma boa forma de abrir os partidos à
sociedade e promover uma maior participação política, mas nunca foram usadas em
Portugal - o que exigiria muita prudência e tempo para um processo transparente
e seguro em vez de uma montagem rápida em apenas três meses. O simples facto de
serem eleições abertas a meros simpatizantes do partido exige um escrutínio com
regras muito apertadas contra qualquer tipo de fraudes. Se nas eleições
internas muito disputadas há sempre suspeitas de irregularidades, como
aconteceu na semana passada em Braga, nas primárias essas suspeitas vão
aumentar exponencialmente. Se o resultado final for muito apertado, é provável
que o derrotado caia na tentação de tentar anular o escrutínio. Como resistirá
o PS a essa divisão a um ano das eleições?
2. A entrevista de António
Costa também revelou também uma espécie de regresso aos tempos gloriosos do
guterrismo. A punch line da entrevista ("Verdadeiramente, o meu adversário
é Rui Rio") serve para desqualificar António José Seguro e desgastar
Passos Coelho, ao mesmo tempo que Costa admite governar em minoria e afirma a
necessidade de "compromissos políticos". Mas os compromissos
admitidos são uma espécie de rosa dos ventos. Tanto abre soluções para Rio como
fala das "emergências mais livres", numa alusão ao Livre de Rui
Tavares ou a movimentos como o 3D, ou até a Marinho e Pinto. António Costa
corporiza assim o melhor do guterrismo, que ficou conhecido por negociar com
tudo e todos para evitar e adiar reformas dolorosas e inevitáveis. O exemplo
maior dessa estratégia de manutenção do poder foi a negociação com o deputado
Daniel Campelo (CDS), no que ficou conhecido como o orçamento do queijo
limiano, num dos episódios mais anedóticos de sempre do parlamento. Verdade
seja dita, há aqui uma certa coerência: Quem negoceia com Daniel Campelo não
terá dificuldade em negociar com Marinho e Pinto.
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