Os passadiços
estão degradados ao longo de centenas de metros
|
Câmara de Lisboa iniciou a
recuperação do Parque Tejo por um preço quase inaceitável
MARISA SOARES e JOSÉ
ANTÓNIO CEREJO 20/08/2014 - PÚBLICO
Concurso foi ganho por uma das quatro empresas que propuseram o mesmo
preço: um cêntimo acima do valor considerado "anormalmente baixo".
Hora de entrega foi o critério do desempate.
Os passadiços de
madeira que se estendem ao longo da frente ribeirinha do Parque Tejo, no Parque
das Nações, começaram esta semana a ser reparados por uma empresa contratada
pela Câmara de Lisboa. Depois de meses de abandono, que resultaram em tábuas
levantadas e partidas em muitos locais, os trabalhos iniciaram-se agora, não se
sabendo quanto tempo durarão.
De acordo com o
presidente da Junta de Freguesia do Parque das Nações, José Moreno, a reparação
vai demorar “umas largas semanas” e o contrato inclui a manutenção dos
passadiços. “Finalmente! O espaço é muito utilizado e esteve vários meses sem
manutenção, daí que tenha atingido um elevado nível de degradação”, observa o
autarca eleito pelo movimento Parque das Nações Por Nós.
Nalguns troços, a
circulação estava já interdita ou condicionada, por iniciativa da junta de
freguesia, por haver risco para a segurança de quem frequenta o local. Mas a
degradação das passagens em madeira sobre a água é apenas um dos problemas de
que os residentes e visitantes do Parque das Nações se têm queixado nos últimos
meses. Não apenas no espaço circunscrito do Parque Tejo, entre a Torre Vasco da
Gama e a foz do Rio Trancão, mas em toda a área onde se realizou a Expo 98.
O estado dos
espaços verdes e do espaço público em geral já nada tem a ver com o que se
verificava durante os 14 anos em que a sociedade Parque Expo foi responsável
pela gestão daquela zona, até há um ano e meio. No final de 2012, essa
responsabilidade passou para a Câmara de Lisboa. Com a descentralização de
competências do município para as freguesias, cerca de 25% da área total do
Parque das Nações passou a ser gerida pela nova junta, mas a câmara continua a
deter a tutela da área restante, com destaque para o Parque Tejo.
José Moreno diz
que os espaços verdes do Parque Tejo, transformados em campos amarelecidos com
árvores a secar e ervas daninhas por todo o lado, também já estão a ser
requalificados. “A Câmara de Lisboa está a proceder à recuperação, vamos ver se
as coisas continuam a evoluir nesse sentido”, afirma o presidente da junta,
sublinhando que o trabalho ainda está no início. “Esperamos que se mantenha e
que não haja mais hiatos de tempo sem manutenção, para que não voltem a
verificar-se situações como a que temos vivido até agora”, acrescenta.
Quanto às áreas
cuja responsabilidade passou para a junta nos últimos meses, a autarquia está a
preparar o lançamento de um concurso destinado a assegurar a sua manutenção por
um período alargado. Presentemente, o trabalho está ainda a ser feito por uma
empresa que tinha sido contratada pela câmara, mas as condições contratuais em
vigor fazem com que os jardins Garcia d'Orta e a generalidade dos espaços
públicos do Parque das Nações estejam em muito más condições, com plantas,
flores e árvores a secar e numerosos problemas no pavimento das ruas e no
mobiliário urbano.
Preços
"anormalmente baixos"
No que respeita à
extensa área do Parque Tejo, que esteve completamente abandonada durante o mês
de Junho e grande parte do de Julho, o serviço de manutenção e de reabilitação
dos espaços verdes foi adjudicado no dia 18 do mês passado à empresa Fitonovo. O
contrato entrou em vigor no dia 21 e terá a duração de seis meses, até 20 de
Janeiro do próximo ano, contemplando também a recuperação de algum mobiliário
urbano e de parte dos passadiços.
O baixo valor
pelo qual o serviço foi adjudicado, 69.361 euros e 86 cêntimos mais IVA - um
cêntimo acima dos 69.361,85 que determinavam a exclusão automática da proposta,
por ser considerada, nos termos do caderno de encargos, "anormalmente
baixa" -, leva, porém, a que algumas empresas que participaram no concurso
garantam que o nível do serviço a prestar será necessariamente muito baixo.
No concurso,
lançado em Maio pelos serviços dependentes do vereador José Sá Fernandes,
participaram as dez empresas que o município seleccionou em 2012 para fornecer
este tipo de serviços em toda a cidade e que são as únicas que podem concorrer,
até 2016, aos diferentes concursos que são regularmente lançados no âmbito do
acordo quadro celebrado com todas elas.
No caso do Parque
Tejo, o concurso tinha um valor base de 115.603 euros, não podendo os
concorrentes propor 69.361,85 euros ou
menos, sob pena de serem excluídos. Como o critério do preço era o único a ter
em conta e quatro das dez propostas apresentadas tinham o preço mínimo mais um
cêntimo, o desempate foi feito, como prevê o caderno de encargos, com base na
hora de entrada de cada uma delas na plataforma electrónica do concurso.
Como a proposta
da Fitonovo entrou à meia noite, três minutos e 30 segundos do dia três de
Junho e as outras entraram umas horas depois, a adjudicação foi feito a quem
carregou primeiro no botão.
O facto de quatro
dos concorrentes terem proposto preços um cêntimo acima do preço
"anormalmente baixo", valor que a própria câmara considera
incompatível com a prestação de um serviço com a qualidade mínima, está longe
de ser inédito. Vários profissionais do ramo garantiram ao PÚBLICO que isso tem
acontecido em muitos concursos para a manutenção de espaços verdes em Lisboa.
A explicação,
acrescentam, reside na dimensão da crise, que obriga as empresas a descer os
preços até ao mínimo que a câmara admite, e que alguns qualificam de
"ruinoso", por forma a terem alguma hipótese de ganhar os contratos. Mas
isso, garantem, tem consequências inevitáveis ao nível do número de
trabalhadores que são colocados nos jardins e da qualidade do serviço prestado.
Sem comentários:
Enviar um comentário