CÂMARA DE LISBOA
João Soares: abandono de um dos
símbolos do Império em Lisboa é “um disparate”
JOÃO PEDRO PINCHA 27/8/2014
/ OBSERVADOR
João Soares relembra o seu próprio mandato e uma visita a uma ex-colónia
para criticar a não recuperação dos brasões da Praça do Império. Câmara
desvaloriza críticas. Associação organiza protesto.
O antigo
presidente da Câmara Municipal de Lisboa, João Soares, considera “um disparate”
a intenção da autarquia liderada por António Costa de não recuperar os brasões
em buxo dos antigos territórios ultramarinos na Praça do Império, em Belém.
Para o
ex-autarca, apoiante de António José Seguro nas primárias do PS que opõem o
atual líder a António Costa, “a História tem de ser assumida sem complexos”. E
dá exemplos de quando foi presidente da câmara: a recuperação de uma estátua de
Óscar Carmona que estava apeada no Jardim do Campo Grande (atualmente no Museu
da Cidade) e a descoberta e posterior reabilitação de “uns brasões da Casa
Real” existentes numa das salas do edifício da câmara, após o incêndio de 1996.
“Uma coisa é a exteriorização do desagrado perante um regime” no período
imediatamente à queda desse regime, defende. “Outra é [fazê-lo] uma data de
anos depois.”
E refere o que
sucedeu em Cabo Verde. “Uma das coisas que me tocou”, relata, foi Carlos Veiga,
primeiro-ministro de Cabo Verde entre 1991 e 2000, ter mandado “repor as
estátuas dos descobridores portugueses que estavam lá apeadas”, naquilo que
classifica como uma prova de “maturidade democrática”.
A câmara de
Lisboa decidiu não recuperar os brasões dos antigos territórios ultramarinos
portugueses. “Não há brasões no local. Os brasões não existem“, na medida em
que a sua leitura é impossível atualmente, afirma ao Observador o assessor de
imprensa de José Sá Fernandes, vereador dos Espaços Verdes. Este responsável
adianta que “a câmara vai recuperar alguns desses elementos” florais mas
decidiu deixar de fora os oito relativos às antigas colónias portuguesas porque
“hoje em dia não faz muito sentido”. E sublinha: “Há uma recuperação do
património, não uma destruição”.
Em Cabo Verde,
uma das medidas tomadas pelo governo foi a reposição das estátuas do período
colonial português. Uma prova de “maturidade democrática”, para João Soares.
A Associação de
Defesa do Património de Lisboa (ADPLx) convocou para esta quinta-feira uma
manifestação ao fim da tarde junto à Praça do Império. Aline de Beuvink,
presidente da ADPLx, diz-se incrédula. “Nem tenho adjetivos para descrever” a
ideia, afirma. E diz não conseguir entender a decisão da autarquia. “Se não
fizeram isto durante o verão quente [de 1975], não vejo justificação agora”,
comenta, frisando que a ADPLx não está “a fazer a apologia do colonialismo” ao
convocar o protesto. “É uma questão de património, não podem politizar o
património”, acrescenta.
Para já, a
recuperação prometida pela autarquia não tem ainda data para avançar, porque,
ainda segundo o assessor de Sá Fernandes, está a decorrer um estudo na Câmara
com vista a esses trabalhos, que serão “complexos” por envolverem 26 elementos
em arbusto de grandes dimensões. Entre aqueles que serão recuperados estão os
brasões dos 18 distritos portugueses, uma Cruz de Cristo e uma Cruz de Avis,
entre outros.
“Vamos estar no
jardim para assinalar a nossa indignação perante esta ideia”, afirma Aline de
Beuvink, que vai pedir aos que a ela se juntarem para “retirar algumas ervas daninhas”
do local.
A Praça do
Império – e respetivo jardim – foram construídos em 1940 por ocasião da
Exposição do Mundo Português, um certame organizado pelo Estado Novo para
comemorar os oito séculos da fundação do país e os 300 anos da sua independência.
A exposição é considerada um dos expoentes máximos da propaganda salazarista e
dela ainda subsistem o Padrão dos Descobrimentos, a Praça do Império e o atual
edifício do Museu de Arte Popular.
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