OPINIÃO
A grande reforma da Universidade
VASCO PULIDO
VALENTE 07/11/2014 - PÚBLICO
Por vontade do sr. Justo, ele inevitavelmente fechava a parte da Universidade de Coimbra que se ocupa de ciências sociais.
Nunca gostei da
Universidade de Coimbra: nem da instituição, nem dos professores, nem da praxe
(uma selvajaria sem graça e sem sentido), nem sequer dos cafés que a oposição
frequentava. Escrevi também um livro que me deu para perceber o horror de tudo
aquilo, mesmo na altura em que Eça e Antero andavam por lá.
E, depois,
durante a Ditadura, Coimbra forneceu fielmente Salazar com os piores ministros
do país. Não espero nada de bom que venha daqueles sítios. Mas não deixou de me
surpreender a atitude do sr. António Santos Justo, hoje director da Faculdade
de Direito, que proibiu um debate entre Pedro Mexia e Rui Tavares sobre
"ideologias no mundo actual", em nome da "tradição" e da
"neutralidade". Estamos, vale a pena lembrar, no fim de 2014.
A ignorância do
sr. Justo sobre as matérias que ensina (Direito, presumo) é incomensurável e a
ignorância da Universidade sobre o sr. Justo não é com certeza menor. O sr.
Justo julga ainda, apesar da sua idade e posição, que pode à sua vontade
preleccionar sobre Direito, sem implicitamente escolher a cada palavra uma
posição ideológica. Ninguém lhe disse que desde a antiguidade se discute a
natureza da lei e os modos lícitos de a fazer e aplicar. Mas talvez o sr. Justo
tenha evitado leituras perigosas, de Platão a Rawls, e se contente com a
"sebenta" de um predecessor ilustre, como por exemplo o imortal
professor Varela (de resto, um homem simpático), que em 1970 continuava a
chamar "concubinato" à coabitação sem casamento, sem que nisso
pesasse a sombra de uma ideologia.
Há uma esperança.
Por vontade do sr. Justo, ele inevitavelmente fechava a parte da Universidade
de Coimbra que se ocupa de ciências sociais, para não falar em humanidades, que
com a sua permanente discussão ideológica só servem para confundir a cabeça do estudante
mais cauteloso e servil. Quanto às ciências sociais, basta abrir a televisão
para verificar a confusão em que vive aquela pobre gente: economista contra
economista, sociólogo contra sociólogo e por aí fora, berrando e esperneando
por causa dessa coisa infame que o sr. Justo se esforçou para banir, num gesto
heróico, da sua Faculdade de Direito. Verdade que este novo método levanta dois
problemas. Primeiro, aliviaria o orçamento do dr. Nuno Crato. E, segundo,
provocaria imediatamente uma enorme polémica ideológica sobre quem devia sair e
quem devia ficar. Mas, de qualquer maneira, os portugueses não tornariam a
esquecer o admirável sr. Justo.
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