PS. Não vai ser porreiro, pá
Por Rita Tavares
publicado em 24
Nov 2014 – in (jornal) i online
PS diz ter
aprendido a lição e Costa pôs freio a teorias da conspiração. Novo ciclo
arranca em clima de choque
Por estes dias é
raro o socialista que não fale da detenção de Sócrates sem disparar com a
descrição do momento em que soube, ainda que a pergunta não seja essa. O choque
é profundo, sobretudo porque chega contra a corrente do jogo. Com Congresso
marcado para o próximo fim-de-semana, o PS está em plena preparação de um novo
ciclo, agora ensombrado por outro mais antigo. E António Costa travou a fundo a
recuperação da linha de argumentação de outro tempo ainda mais atrás: o da
"tese da cabala".
"Também
vamos aprendendo e reajustando a estratégia", diz ao i um socialista
quando se fala na defesa levantada pelo PS no tempo do processo Casa Pia que
envolveu figuras de topo do partido em 2003. Nessa altura, António Costa era o
líder parlamentar socialista e dizia existirem "fortes indícios" de
que o caso teria sido "uma montagem". Hoje, perante a detenção do
ex-líder Sócrates, o líder recém-eleito alinhou um discurso bem mais recuado e
sereno face ao poder político e judicial. "Só à Justiça cabe conduzir com
plena independência" o processo, disse Costa, logo na manhã seguinte à
detenção de Sócrates para interrogatório, através de uma mensagem escrita
enviada aos militantes (ver ao lado). A urgência em serenar ânimos e ditar a
regra era grande, afinal o fim-de-semana era o da eleição do líder. Costa é
secretário-geral do PS, eleito com 96% dos votos, e na hora da vitória
homenageou ex-líderes e, sobre Sócrates, garantiu que "o PS é um partido
que não adopta as más práticas estalinistas de eliminação da fotografia deste
ou daquele. Assume toda a sua história, dos bons e dos maus momentos".
Nas eleições
primárias, Costa reintroduziu no discurso socialista a defesa da herança
Sócrates que os seus apoiantes (e ele mesmo) se queixavam de ter sido descurada
por António José Seguro. A colagem a Sócrates é inevitável, mas o líder quer
manter distância face a esse caso. Longe do tempo em que foi ouvido no
Departamento de Investigação e Acção Penal, em Junho de 2003, para
"aprofundar as pistas" que dizia ter e que sustentavam a "tese
da cabala" contra o PS no processo Casa Pia. A tese não vingou no
Ministério Público e deixou marcas profundas no PS que nem era unânime neste
argumento - em 2003, o homem que Costa quer agora para presidente do PS, Carlos
César, não o defendia. Desta vez, o secretário-geral jogou por antecipação e a
ordem foi entranhada. João Galamba, que chegou a deputado na era Sócrates,
mostrou isso mesmo ao dizer, na noite de sábado, que "é importante não
deixar que os assuntos da justiça sejam contaminados por questões
políticas".
"RESISTIR"
Um socialista
próximo de Sócrates repete várias vezes a palavra "resistir" quando
questionado sobre os tempos que se seguem para o PS. "Neste momento é só
resistir", diz ao i. Só mesmo entre o grupo mais próximo de Sócrates é que
a linha traçada por Costa é pisada. Edite Estrela na sua conta no Twitter
deixou uma pergunta sugestiva: "Qual a melhor forma de desviar as atenções
do escândalo dos vistos gold?" Ficou por aqui. O i tentou contactar a
ex-eurodeputada e amiga de José Sócrates durante o dia de ontem, sem sucesso.
O deputado do PS
André Figueiredo, um dos mais fiéis socráticos, diz que o caso "tanto
quanto parece é um misto de todos os outros que conhecemos até então, sendo que
este se destaca por uma tentativa de humilhação pública repugnante e em dose
nunca vista". O socialista diz mesmo que "não é novidade para ninguém
que Sócrates, ao longo dos anos, tem sido permanentemente perseguido, atacado e
vilipendiado". Renato Sampaio, outro deputado do PS que se enquadra no
grupo dos fiéis, escreveu no facebook: "Não nos resta outra alternativa
que não seja acreditar na sua capacidade de defesa e na sua clarividência. Eu acredito."
Augusto Santos
Silva também utilizou as redes sociais, mas para atirar à violação do segredo
de justiça, dizendo ser um dos "crimes públicos que foram já efectivamente
cometidos" nos dois últimos dias. E conclui: "Por onde pode começar o
Ministério Público a investigar esses crimes, como é sua obrigação: o próprio
Ministério Público."
E A MAIORIA?
A detenção de
Sócrates é já uma pedra pesada no caminho do PS de Costa que tem como objectivo
para as legislativas do próximo ano a maioria absoluta. "Tudo isto pode
eventualmente ter efeitos negativos para o PS, dependendo sempre da dimensão e
desenvolvimento dos acontecimentos", escreveu nas redes sociais o amigo de
Sócrates, Renato Sampaio.
Os socialistas
contactados pelo i não arriscam previsões e apenas colocam pressão na
velocidade com que pretendem ver correr o processo: "Bem" e "rápido",
disse João Galamba aos jornalistas na noite das eleições directas. Já António
Costa fica-se pelo desejo de que "a Justiça apure tudo o que houver a
apurar sobre essa matéria". E afasta o discurso político socialista do
assunto, pedindo um "PS concentrado na acção política, a fazer aquilo que
lhe compete: a oposição a este governo e a construção de uma alternativa de
futuro governo".
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