Parágrafo numa carreira política
Por Luís Osório
publicado em 17
Nov 2014 in
(Jornal) i online
Uma podridão em grande escala. Perguntas,
rumores, pistas e políticos...
Miguel Macedo fez
o que tinha a fazer. E é legítima a conclusão: se Passos Coelho trava todos os
dias a demissão de Nuno Crato e durante tantas semanas não aceitou a saída de
Miguel Relvas, é porque o ministro da Administração Interna, o mais político
dos seus executivos, está fragilizado da cabeça até aos pés. E, além do mais,
não seria possível coabitar na mesma mesa de Conselho de Ministros com Paula
Teixeira da Cruz, a ministra que tutela a Polícia Judiciária, responsável por
esta investigação. Nem por acaso, no final da passada semana, afirmei que a
ministra só tinha duas alternativas: ou sair de fininho ou escolher a espada. Escolheu
a espada. Se sair levará alguns com ela, isso passou a ser um facto.
Também é certo
que quando o fim é o que sobra, tem importância a forma como colocamos o ponto
final na peça que representámos. Podemos viver com dignidade, coragem,
rectidão, mas há poucas coisas tão difíceis como o momento em que nos deparamos
com a ausência irremediável de opções. E perante isso, nesse fim de horizonte,
honra lhe seja feita, Miguel Macedo colocou provavelmente o parágrafo na sua
carreira política.
Estava entre a
espada e a parede. O i dá-lhe conta que António Figueiredo, um dos principais
suspeitos, dito pelo próprio em várias conversas e circunstâncias, fora
convidado para secretário de Estado por Macedo. A relação entre os dois parecia
sólida. Vários links se cruzavam, ligações comprometedoras que, mais tarde ou
mais cedo, poderiam colocar o governo em causa. Tornou-se insustentável.
Uma podridão em
grande escala.
O director do SEF, o presidente dos Registos e Notariados, o SIS
que segundo o “Expresso” tentou “varrer” uma possível vigilância da Polícia
Judiciária dos computadores de António Figueiredo, um sei lá de rumores,
perguntas e pistas. No meio de tudo isto, políticos. Miguel Macedo,
lamentavelmente travado nas suas ambições, veremos se justa ou injustamente. E
Luís Marques Mendes, sócio da filha de António Figueiredo numa empresa, viu
também o seu nome envolvido.
O que se pode
dizer? Que só uma coisa pode justificar a voragem desta rede de corrupção
desmontada pela Polícia Judiciária, com a cobertura de Paula Teixeira da Cruz:
uma ideia de inimputabilidade, a convicção de que nada ou ninguém lhes pode
tocar, que os seus aliados acabarão por pesar na balança se precisarem de ser
usados – quer sejam apoios nas secretas, na política ou em qualquer outro poder
visível ou invisível.
Penso que Marques
Mendes está envolvido? Estou convencido de que não está. Porém, o tema não é
apenas esse. O tema é perceber das razões que o levam, e a outros personagens
com nome e estatuto, a ser sócios de tantas empresas, a não questionar
determinadas parcerias, amizades, ligações. Dou de barato que possam pensar que
têm de ganhar a vida, que não podem ou devem fechar portas, que nada vai
acontecer de mal se nada de mal fizerem, mas como de ingénuo pouco têm, assumo
também que lhes passe pela cabeça que várias das oportunidades de negócio lhes
surgem pela sua influência, pelos seus nomes, pela capacidade que têm de abrir
umas portas e fechar outras. É por isso que, mais do que a maioria, deveriam
ter cuidado em escolher com quem se sentam para beber café, mesmo correndo o
risco de baixarem consideravelmente o peso da cafeína. Vale
a pena o esforço, vale bem a pena.
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