segunda-feira, 24 de novembro de 2014

A estatística que nos deveria envergonhar. Pousar a mala, e levantar a cabeça, por ANTÓNIO SÉRGIO ROSA DE CARVALHO

EDITORIAL / PÚBLICO / 25-11-2014
A estatística que nos deveria envergonhar
Crise levou milhares a sair dos países do Sul da Europa. Cá, o caso é mais grave, porque não é de hoje

Passos Coelho foi ontem visitar várias fábricas em Vagos e tentou passar a imagem de um país a criar emprego. Reconheceu que o desemprego ainda é elevado, mas recusou a ideia de que esteja a baixar porque as pessoas emigram. Disse que Portugal tem sido um país de emigração desde há muitos anos e “hoje não é muito diferente de 2007 ou 2008”. O primeiro-ministro tem razão quando diz que a queda do desemprego não se deve exclusivamente à emigração. É inegável que a economia tem dado alguns sinais de recuperação que têm permitido criar algum (pouco) emprego. Mas daí até tentar desvalorizar ou minimizar o problema da emigração vai um grande salto. Portugal é, no contexto europeu, o país com maior emigração. Os portugueses emigrados representam mais de um quinto (21%) da população residente. E o primeiro-ministro tem razão: a tendência não vem de hoje e é isso que nos devia preocupar.
Os dados da OCDE mostram que nos últimos anos têm sido sobretudo os mais velhos e os menos qualificados a sair do país. Mas mais preocupante ainda são os dados publicados ontem pelo projecto Generation E e que dão conta que mais de 200 mil portugueses entre os 20 e os 40 anos deixaram oficialmente o país desde 2010. E o problema, dizem, é que esta estatística oficial sobre a emigração mais jovem pode estar a subestimar bastante a realidade, já que quase metade dos inquiridos que emigraram disse não ter registado oficialmente a mudança de residência.
Menos surpreendentes são as razões apontadas pelos mais jovens para abandonar o país: a esmagadora maioria fala em “questões laborais”. Jovens que foram “empurrados” para fora do país por uma economia que não cria emprego suficiente e que há mais de uma década está em recessão ou apresenta crescimento anémico. Esta é a estatística que realmente nos deveria preocupar e envergonhar.
António Sérgio Rosa de Carvalho
OPINIÃO
Pousar a mala, e levantar a cabeça
ANTÓNIO SÉRGIO ROSA DE CARVALHO 12/01/2014 - PÚBLICO
Quando irá Portugal, finalmente, pousar a mala e levantar a cabeça?


Infinito e promissor horizonte Atlântico. Proibitivo e intransponível muro Castelhano. Estes foram os factores que determinaram a expansão Portuguesa. Mas, também, o seu eterno escapismo quimérico, na procura do Devir / Identitário. Sempre baseada no acto de Partir, isto, de forma indissociável, tragicamente e dialecticamente a uma eterna fidelidade à ideia metafísica da Pátria mítica, mas inatingível.

Enquanto o mundo Protestante transforma o seu cepticismo perante a imperfeição do Mundo, precisamente numa capacidade de intervir nessa mesma realidade e transformá-la, tal como Max Weber demonstra na sua associação entre Protestantismo e a formação do Capitalismo pré Neo-Liberal...  os misteriosos Lusitanos, saltitam de escapismo em escapismo.

Agora o “Império”. Depois, o deslumbramento das promessas de abundância do clube prestigiante do desenvolvimento Europeu, como se tratasse de fenómeno mágico e instantâneo, sem inclusão de preço e responsabilidade.

Progresso? Sim houve-o. E uma das mais importantes manifestações desse mesmo Progresso constituiu o acesso ao ensino e a formação de milhares de jovens. Os tais que iriam determinar o Portugal pós Abril. Que iriam garantir e confirmar o fim desta dialéctica de Êxodo, finalmente, o interromper deste ciclo de Diásporas.

Que iriam constituir a primeira geração que iria ficar e finalmente investir neste misterioso rectângulo plantado à beira-mar atlântica.

Portugal iria finalmente ser cumprido, de forma Adulta, com a capacidade de aceitar as suas fronteiras físicas, geográficas e reais, assumindo finalmente, sem escapismos, as suas verdadeiras capacidades e transformando assim a realidade, quebrando o feitiço, destruindo esta maldição.

As centenas de milhares que partem de novo, com o sabor amargo da decepção e mágoa, para o exílio, restabelecendo o ciclo da Diáspora, ilustram um grave fenómeno com consequências não apenas demográficas e económicas para o futuro do País.

Precisamente na área da vivência/ocupação/ futuro das cidades e respectivo Património, as consequências serão terríveis.

Pois não seria esta geração que iria, através da sua criatividade cultural/empreendedorismo e actividade profissional, exigir o seu espaço, ocupar finalmente os centro históricos e habitá-los?

Em vez disso, assistimos à transformação das duas principais cidades do País, numa plataforma de eventos, num palco de investimento exclusivo na sua ocupação temporária através de hotéis, hostels e oferta de casas na hotelaria paralela.

Tudo dirigido ao novo “Bezerro de Ouro” que se chama Turismo, fenómeno importante com indiscutível potencial de reconhecimento e prestígio, com vasta dimensão económica, mas que sem gestão equilibrada, transforma as cidades em produto efémero e temporário.

Tudo isto é interpretado de forma relativizadora como fenómeno temporário, associado a uma crise, que se assume descaradamente e oficialmente de forma derrotista com declarações oficiais com apelos explícitos à emigração dos jovens, capazes e formados, como se isso não constituísse uma sangria irreversível e uma ilustração traumatizante de um falhanço da promessa que Abril, iria finalmente interromper este ciclo de eternas Diásporas.

Investe-se na tentativa de aliciar capital Internacional, nomeadamente na área do Imobiliário e Reabilitação Urbana, com promessas “douradas”, mas quem irá garantir o rigor das intervenções no Património Arquitectónico e respectivos interiores, quando estes projectos se destinam à ocupação temporária, à curta estadia e à vivência efémera da cidade vista exclusivamente como produto?

Onde estão as famílias locais a apropriar-se da cidade? A ocupá-la e a habitá-la permanentemente?

Quando irá Portugal, finalmente, pousar a mala e levantar a cabeça?


Historiador de Arquitectura

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