O leitor tem opinião sobre o caso
José Sócrates? Não tenha
JOSÉ DIOGO
QUINTELA / 30-11-2014 / PÚBLICO
O leitor tem opinião sobre o caso
José Sócrates? Não tenha. Isso configura um delito de julgamento na praça
pública. A não ser que ache que José Sócrates está a ser vítima de
justicialismo. Nesse caso, tem licença de porte de opinião. Para não haver dúvidas,
aqui vai uma cartilha com o que é admissível pensar:
a) Avaliar a
hipótese de José Sócrates ser culpado? Não se pode.
b) Levantar
dúvidas sobre a idoneidade do juiz Carlos Alexandre? Pode-se.
c) Questionar as
reais motivações do procurador Rosário Teixeira? Pode-se.
d) Sugerir que
Joana Marques Vidal orquestrou este charivari? Pode-se.
e) Desconfiar de
um propósito tenebroso do sistema judicial? Pode-se.
f) Suspeitar de
manipulação obscura pela comunicação social? Pode-se.
g) Insinuar que o
Passos Coelho lucra com isto? Pode-se.
h) Alvitrar que
Portas é que devia ir preso por causa dos submarinos? Pode-se.
i) Considerar que
Cavaco Silva tem negócios ilícitos com os seus amigos do BPN? Pode-se.
j) Conjecturar
que isto é tudo uma cabala montada pelo PSD para distrair dos vistos gold? Pode-se.
Em termos de
limitação à liberdade de opinião, só é proibido achar que José Sócrates pode
ser culpado. Quem violar esta disposição tem de se haver com a brigada de
trânsito em julgado. De resto, é tudo debatível.
Mas mesmo a
defender José Sócrates há que ter cautela. Por exemplo, João Soares disse que
“excepto por crime de sangue, em flagrante delito, não aceito a prisão (…) de
um ex-primeiro-ministro como José Sócrates”. Precipitou-se. Mesmo segurando
arma pingona de sangue cravada em cadáver, nunca se aceitaria a detenção de
Sócrates. A presunção de inocência manter-se-ia. Possivelmente seria legítima
defesa. Ou um acidente. Ou, o mais provável, uma armadilha da suposta vítima
que se lançara contra Sócrates enquanto este cortava o pão, para se empalar 17
vezes na faca e incriminar quem só desejava fazer uma sandes mista.
Entretanto,
debrucemo-nos à enorme parcialidade demonstrada pela Justiça. De todos os
ex-primeiros-ministros vivos, por acaso detiveram Pinto Balsemão no aeroporto
por suspeitas de corrupção no caso Cova da Beira? E à chegada de que voo é que
incomodaram Mário Soares a propósito da falsificação de documentos da
Licenciatura em Engenharia? Ou Cavaco Silva, por alegada troca de favores no
caso do TagusPark? E Guterres por beneficiar de um RERT por ele aprovado? Já
para não falar de Durão Barroso, pelo Face Oculta, e Santana Lopes, pelo
Freeport. Porque é que tinham de embirrar logo com
este?
Num ranking de
sanha persecutória, José Sócrates entra directo para o top 5 dos mais injustiçados
da História. Neste momento, a tabela organiza-se assim: 5) Bruxas de Salém; 4)
Capitão Dreyfus; 3) Galileu; 2) José Sócrates [nova entrada]; 1) Jesus Cristo. Apesar
de uma detenção no Jardim de Getsémani ser menos maçadora do que na manga de
desembarque de um voo TAP, e mesmo tendo em conta que, na verdade, Jesus estava
mesmo a pedi-las, o Nazareno continua à frente porque a sua condenação injusta
originou a maior religião do mundo. Mas José Sócrates
ainda tem tempo.
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