Ó Ricardo Salgado, quanto do teu
capital subtraíste a Portugal?
JOSÉ DIOGO
QUINTELA / 24/11/2014 / PÚBLICO
Depois das
primeiras audições na comissão de inquérito, estou convencido de que mais
depressa o mar responde a Fernando Pessoa do que Ricardo Salgado se descose
convenientemente sobre o dinheiro. Uma conversa entre o oceano Atlântico e um
poeta morto, na Caparica, é mais provável que uma admissão do banqueiro aos
deputados da nação, no Parlamento.
Se Ricardo
Salgado andou anos a tourear o Banco de Portugal, não são três ou quatro horas
à frente dos deputados que o vão fazer quebrar. Até porque, no tempo que demora
uma audição, não se consegue exercer a persuasão moral. Como se ficou a saber
pelo vice-governador Pedro Duarte Neves, foram precisos meses para persuadir o
banqueiro a conceder que já não tinha condições para liderar o BES. Meses que
foram aproveitados para perseverar nas mesmas moscambilhas que, justamente,
tinham feito perceber que já não tinha condições para liderar o BES.
Atenção, não estou
a insinuar que o processo de persuasão moral não funciona. O problema não está
no mecanismo da persuasão moral em si, que é excelente. Nem, neste caso
particular, na moralidade do persuadido, que já provou que se deixa persuadir.
O problema está na capacidade do persuasor, que não foi capaz de empregar o
tipo específico de persuasão moral que funciona comprovadamente com Ricardo
Salgado. Refiro-me, como é notório, ao tipo de persuasão moral que leva o
persuadido a contratar uma brigada de seguranças israelitas.
Ou consideram os
senhores do BdP que os mercenários hebreus são para defender Ricardo Salgado de
cidadãos portugueses que tenham perdido dinheiro no BES? Se consideram, padecem
de um problema de dupla não regulação, já que não regulam bem o mercado, nem
regulam bem da cabeça.
Notem, eu moro na
mesma rua que Oliveira e Costa. Já assisti a diversas situações em que o
ex-presidente do BPN atravessa a estrada. Em nenhuma delas houve um condutor
que tenha acelerado ou, sequer, se tenha abstido de travar. Nem uma vez. E
estou a contar com o ocasional atravessamento fora da passadeira. Aliás, é a
mesma rua onde estão situadas a ESAF e a Rio Forte. Nunca nenhum burlado pelo
BES veio aqui tirar desforço. Não houve montras partidas, pneus furados ou
ameaças iradas. Nada.
(Agora que penso
nisso, sinto que a minha rua é uma espécie de sala de espera do escritório do
Proença de Carvalho. Só faltam os Irmãos Metralha no prédio em frente e Jack, o
Estripador, no andar de baixo.)
Portanto, a
segurança de Ricardo Salgado não é contra os seus pacatos compatriotas. É para
salvaguardar face a clientes estrangeiros, possivelmente venezuelanos,
angolanos ou russos. Esses sim, especializados no uso do tipo de persuasão
moral a que Ricardo Salgado é mais sensível. Um tipo de persuasão moral que não
se utiliza em Portugal e que levou Ricardo Salgado (durante todo o tempo que
demorou a ser convencido pelo BdP que devia largar o BES) a transferir 800
milhões de euros do banco para offshores, para pagar certas dívidas do GES. Curiosamente, apenas as dos clientes mais persuasivos.
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