Altos dirigentes do Estado em
prisão preventiva no caso dos vistos gold
ANA HENRIQUES e
PEDRO SALES DIAS 18/11/2014 - 22:10 (actualizado às 23:46) PÚBLICO
Medidas mais gravosas decretadas ao ex-presidente do Instituto dos
Registos, à ex-secretária-geral da Justiça e ao director do SEF que apresentou
esta terça-feira a demissão que foi aceite pelo Governo.
O ex-presidente
do Instituto dos Registos e Notariado (IRN), António Figueiredo, o ex-director
do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), Manuel Palos, e a
ex-secretária-geral do Ministério da Justiça, Maria Antónia Anes, vão ficar em
prisão preventiva no âmbito da investigação dos vistos gold. O mesmo sucederá
com um dos empresários chineses visados pela chamada Operação Labirinto.
Mas enquanto
Manuel Palos, do SEF (cujo pedido de demissão foi apresentado e aceite esta
terça-feira pelo Governo) poderá ver substituída, no futuro, a prisão
preventiva pela pulseira electrónica no domicílio, se o juiz considerar que os
requisitos necessários estão cumpridos, uma medida de coacção semelhante à
aplicada à ex-secretária-geral, o mesmo não sucede com António Figueiredo nem
com o empresário chinês Zhu Xiaodong. Para estes, o juiz de instrução Criminal
Carlos Alexandre não deixou outra opção de futuro: vão aguardar num
estabelecimento prisional o decurso das investigações.
Estão a ser
investigados factos susceptíveis de integrarem a prática dos crimes de
corrupção activa e passiva, recebimento indevido de vantagem, prevaricação,
peculato, abuso de poder e tráfico de influências, de acordo com o comunicado
lido por uma funcionária do Tribunal Central de Instrução Criminal de Lisboa. Os
restantes arguidos chineses, Zhu Baoe e Xia Baoliang, estão proibidos de se
ausentarem do país e obrigados a prestar cauções de 250 mil e de 500 mil euros,
respectivamente.
Tanto o director
do SEF como outro suspeito, Jaime Gomes - que tem uma sociedade com a filha do
director do IRN na qual participa também Marques Mendes, e em que o ex-ministro
da Administração Interna Miguel Macedo chegou a ter uma quota - ficam ainda
proibidos de contactar funcionários do Serviço de Informações e Segurança, do
SEF, da Polícia Judiciária, do Ministério da Administração Interna, da
magistratura judicial e do Ministério Público - mesmo aqueles que já não
trabalhem nestes organismos. Medida idêntica foi, de resto, aplicada a Maria
Antónia Anes e aos funcionários do IRN implicados no caso que ficam suspensos
de funções.
Há seis dias que
estavam detidos 11 visados nesta operação que mobilizou 200 inspectores da PJ
em todo o país. A acção da polícia marcou principalmente os serviços de três
ministérios onde foram realizadas buscas aturadas: o da Administração Interna,
o do Ambiente e o da Justiça. Aqui, os investigadores pretendiam encontrar
indícios referentes à ex-secretária-geral do Ministério do Ambiente, Albertina
Gonçalves.
Esta responsável,
que é sócia do ex-ministro da Administração Interna, Miguel Macedo, num
escritório de advogados, não foi detida. Devido às polémicas ligações, aliás, o
caso levou à demissão do ministro no domingo passado e à nomeação de Anabela
Rodrigues como nova ministra da Administração Interna.
A PJ realizou 60
buscas e demorou-se principalmente no IRN e em instalações daqueles
ministérios. Centenas de documentos foram apreendidos. A sede do SEF em Porto Salvo, Oeiras, foi outro
dos locais alvo de buscas, assim como a sua Direcção Regional de Lisboa, Vale
do Tejo e Alentejo. A Comissão de Recrutamento e Selecção para a Administração
Pública (Cresap) também foi alvo de buscas. Ao que o PÚBLICO apurou, os
inspectores procuraram documentos sobre a intervenção em concursos públicos de
Maria Antónia Anes, a secretária-geral do Ministério da Justiça que foi detida
e que entretanto apresentou a sua demissão.
Em causa na
operação Labirinto estão comissões cobradas ilegalmente para a obtenção dos
vistos gold. Os desenvolvimentos deste processo não terão surpreendido o
responsável pelo IRN. António Figueiredo sabia há meses, até pelos jornais, que
estava a ser investigado, o que aumentou a preocupação dos investigadores que
acreditam que a divulgação da informação sobre o seu trabalho visou
comprometê-lo.
Sob investigação
está também uma empresa de Ana Luísa Figueiredo, filha do presidente do IRN. A
Golden Vista Europe tem um objecto social variado, desde a compra e venda de
automóveis até à prestação de serviços de documentação, passando pela
comercialização de mármores e pela exploração de estabelecimentos de ensino. A
empresa conta com mais cinco sócios, dois deles os cidadãos chineses também
detidos no âmbito desta operação.
João Amaro da
Luz, advogado e amigo de António Figueiredo, confirmou à SIC que também foi
constituído arguido do processo.
PJ fez buscas na comissão que
recruta dirigentes públicos
Raquel Almeida
Correia / 19-11-2014 / PÚBLICO
AComissão de
Recrutamento e Selecç ão para a Administração Pública ( Cresap) foi uma das
entidades alvo de buscas da PJ na quinta-feira, no âmbito da investigação de
casos de corrupção e outros crimes relacionados com os vistos gold, que
resultou na detenção de 11 pessoas. Os inspectores procuraram documentos
relativos à participação em concursos públicos de Maria Antónia Anes, a
secretáriageral do Ministério da Justiça (MJ) que se demitiu logo após ser
detida.
Maria Antónia
Anes tinha sido indicada pelo MJ para integrar a bolsa de vogais
não-permanentes da Cresap, que participam na escolha de dirigentes do Estado. O
seu nome ainda consta, aliás, no site da comissão. A secretária-geral do MJ
participou no júri para o cargo de presidente do Instituto dos Registos e do
Notariado (IRN). Um cargo ocupado por António Figueiredo, outro dos detidos.
A nomeação de
Figueiredo não resultou, contudo, deste concurso, já que o processo de
recrutamento foi suspenso por não terem sido encontrados candidatos com mérito.
O cancelamento dos concursos está previsto quando a Cresap não encontra pelo
menos três pessoas com um perfil adequado para indicar ao Governo.
Numa notificação
enviada à ministra da Justiça, a Cresap refere que foram convocados quatro
candidatos para a fase das entrevistas. Da lista consta o nome de António
Figueiredo. “Terminadas as entrevistas, o júri deliberou (...) que, não tendo
verificado a existência de três candidatos com mérito, pode o membro do
Governo(...) proceder ao recrutamento por escolha de entre os indivíduos que
reúnam o perfil definido pelo aviso de abertura” do concurso, lê-se no
documento de Fevereiro de 2014.
A reunião contou com a presença de João Bilhim,
presidente da Cresap, de Maria Margarida de Almeida, na qualidade de vogal
permanente da comissão, de Maria Antónia Anes, como vogal não permanente, e de
Maria Lagarto Pereira, na qualidade de perita.
Poucos dias
depois, a 12 de Fevereiro, foi publicado em Diário da República um despacho da
ministra Paula Teixeira da Cruz que nomeava António Figueiredo para a o IRN
“por um período de cinco anos”.
A nomeação
contraria declarações proferidas na semana passada pela governante que, citada
pelo semanário Sol, sublinhou que nem o presidente do IRN nem a
secretária-geral do MJ tinham sido escolhidos por si, mas sim “nomeados na
sequência de concurso conduzido pela Cresap”.
Numa nota enviada
ao PÚBLICO, a Cresap frisou que “não indicou o nome do Dr. António Figueiredo à
senhora ministra da Justiça, porque não chegou a apresentar uma proposta de
designação pelas razões acima apresentadas”. Quanto à escolha de Maria Antónia
Anes, a comissão explica que “enviou para a tutela, no dia 7 de Março de 2013, a proposta de
designação com os três nomes seleccionados para o desempenho do cargo, por
ordem alfabética (...) dos quais a tutela escolheu um”.
Na sequência
desta proposta, Paula Teixeira da Cruz escolheu Maria Antónia Anes, por
despacho publicado logo a 15 de Março em Diário da República. A mesma
responsável já estava no cargo, tendo sido nomeada, em regime de substituição,
pela ministra.
Contactado pelo
PÚBLICO, o MJ esclareceu que, “desde que assumiu funções, a ministra da Justiça
decidiu manter todas as equipas dirigentes por entender que a administração
pública deve funcionar independentemente das mudanças de poder político e à luz
de critérios de mérito e competência”. E, por isso, “só quando confrontada com
pedidos de cessação de funções de alguns dirigentes, como foi o caso dos
dirigentes da secretaria-geral, é que a Ministra da Justiça procedeu a
nomeações, em regime de substituição, de novos titulares dos cargos para
garantir o regular funcionamento dos serviços”.
No que diz
respeito ao IRN, o ministério refere que a comunicação da Cresap levou a
ministra a determinar, “por não haver alternativa, a continuaçao do presidente
então em funções, desde 2004, procurando, desta forma, assegurar o regular
funcionamento dos serviços”.
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