Saída de Miguel Macedo força
Passos a remodelar o Governo
O até agora ministro da Administração Interna sai do Executivo afirmando
que nada tem a ver com os vistos gold, mas reconhece que o caso diminuiu a sua
autoridade politica
Margarida Gomes /
17-11-2014 / PÚBLICO
O primeiro-
ministro, Pedro Passos Coelho, não conseguiu segurar o ministro da
Administração Interna, Miguel Macedo, que, ao terceiro dia após rebentar o
escândalo dos vistos gold - que envolve pessoas que lhe são próximas, entre as
quais altos quadros do seu ministério - pediu a demissão. Fê-lo para “defender
o Governo”.
Numa declaração
lida ontem no Ministério da Administração Interna (MAI), Miguel Macedo declarou
que a sua autoridade enquanto governante ficou diminuída com o envolvimento de
pessoas que lhe são próximas nas investigações que estão em curso e que visam
alegados casos de corrupção na atribuição dos vistos gold.
Alegando
convicções pessoais e políticas para deixar o Governo, o ministro demissionário
defendeu que “num estado de direito democrático o que tiver de ser investigado
deve ser investigado e quem, eventualmente, tenha infringido a lei deve ser
responsabilizado pelos seus actos e comportamentos”. “Quero dizer que não tenho
qualquer intervenção administrativa no processo de atribuição de vistos e que
pessoalmente nada tenho a ver com as investigações e com o processo em curso,
como de resto se infere da nota pública emitida pela Procuradoria-Geral da
República”, disse.
Vincando não ter
“qualquer responsabilidade pessoal no que está a ser investigado”, Macedo
reconhece que no plano político “as coisas se passam de maneira diferente e são
de natureza distinta os critérios da tomada decisão”. Segundo disse, “o
ministro da Administração Interna, pelas funções que exerce em áreas de
especial sensibilidade e exigência, tem que ter sempre uma forte autoridade
para o exercício pleno e eficaz das suas responsabilidades”. E continuou: “É
essa autoridade que politicamente entendo ter ficado diminuída e um ministro
nesta pasta não pode ter nunca a sua autoridade diminuída”, revelando que o
pedido foi aceite pelo chefe de Governo.
Na hora de sair,
justificou que “esta é uma decisão com exclusivo fundamento” nas suas
“convicções pessoais e políticas” e que só a estas deve obediência. E concluiu:
“Não assumo, porque não tenho qualquer culpa ou responsabilidade pessoal, saio
para defender o Governo, a autoridade do Estado e a credibilidade das
instituições”.
O até agora
ministro do MAI disse ainda que a decisão de sair já tinha sido ponderada, mas
acabou por ficar, uma vez que o primeiro-ministro não aceitou a sua demissão
quando na quinta-feira lhe formalizou o pedido. A um ano das eleições
legislativas, Passos tudo fez para travar a saída de Macedo, que há um ano
resistiu aos protestos dos polícias, que se manifestaram na escadaria da
Assembleia da República.
Desta vez, os
estilhaços políticos da “Operação Labirinto” levaram o ministro a sair. Macedo
terá sido apanhado nas escutas quando conversava com um amigo que estava a ser
vigiado no âmbito da investigação.
Apesar não ter
responsabilidades no caso, a sua saída tem óbvias consequências políticas,
porque o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras está na dependência directa do
MAI e o di-
rector do SEF,
Manuel Jarmela Palos, é acusado de dois crimes de corrupção passiva no caso da
atribuição de vistos dourados, revelou este domingo o seu advogado, João
Medeiros.
No habitual
comentário na TVI, Marcelo Rebelo de Sousa elogiou a “forma digna e
inteligente” como Macedo saiu do Governo, e aconselhou Passos a fazer uma
remodelação. E deu a táctica. “O primeiro-ministro tem aqui a ocasião de
escolher entre dois caminhos: tapar o buraco deixado por Miguel Macedo. O
segundo caminho é fazer uma remodelação mais vasta”. “Se for pelo primeiro
caminho, há soluções simples. Pega num deputado tipo Fernando Negrão e coloca-o
na Administração Interna, ou pega, supondo que ele aceitaria, em Paulo Rangel e
ele vai para o MAI”. Pode ainda fazer “uma coisa mais sofisticada” e escolher
Marques Guedes, “que dará um ministro da Administração Interna zeloso,
criterioso e calmo, e substitui o ministro dos Assuntos Parlamentares por Luís
Montenegro ou Paulo Rangel. Isto é tapar o buraco”.
“A leitura
política que as pessoas fazem disto é que o Governo está-se a partir aos
bocados”, atirou Marcelo. E ironizou: “Sai um e depois não sai outro. Outro
está ali fraquinho, como é o caso do ministro Nuno Crato, e outros estão com
problemas.”
Segundo Marcelo,
Passos deve “reforçar a Presidência do Conselho de Ministros, onde Poiares
Maduro dá para os fundos [comunitários], mas não dá para a parte política do
Governo”. “Se quer mexer na Educação, aproveita a ocasião, que é uma questão
que está pendente e devia aproveitar para mexer na Justiça - sei que isso será
a ultima coisa que fará”. Mas Marcelo vai mais longe e sugere que se “retoque a
orgânica do Governo” para que não sejam apenas os ministros do PSD a ser
substituídos.
Resta saber se o
primeiro-ministro arranja com facilidade uma personalidade para substituir
Miguel Macedo, cuja demissão já foi aceite pelo Presidente da República. É que,
no caso do ministro da Educação, Passos tentou encontrar um substituto quando
Crato lhe terá manifestado a intenção de se demitir. O social-democrata Emídio
Gomes terá declinado o convite para tutelar a pasta da Educação e da Ciência.
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