segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Partidos. E em Portugal? Podemos ter um terramoto político?


Partidos. E em Portugal? Podemos ter um terramoto político?
Por Susete Francisco
publicado em 10 Nov 2014 in (Jornal) i online

Um pouco por toda a Europa, vindos da esquerda e da direita, há novos partidos a intrometerem-se na luta pelo poder. Em Portugal ninguém parece ameaçar PSD e PS. Mas há sinais de erosão nos dois grandes partidos

Em Espanha, o Podemos surgiu esta semana à frente do Partido Popular e do PSOE nas intenções de voto. Em França a Frente Nacional colecciona vitórias. Em Itália o Movimento 5 Estrelas fez tremer o sistema. Na Grécia, o Syriza eclipsou o PASOK. E em Portugal? Em Portugal as sondagens dividem-se sobre se o PS terá ou não maioria absoluta e o PSD, pese embora o mau resultado nas intenções de voto, não vê perigar o lugar de líder da oposição. Estará o sistema político português imune ao fenómeno de novos partidos e movimentos que atravessa a Europa?

"O sistema partidário já esteve mais consolidado em torno do PS e do PSD do que está agora", considera Carlos Jalali, sublinhando que o "padrão de grande estabilidade" do voto nos dois principais partidos está a sofrer alterações. Um estudo realizado pelo professor da Universidade de Aveiro mostra que, entre 1987 e 2005, a votação agregada de socialistas e sociais-democratas situou-se numa média de 77,1%. Mas, desde então, nas duas últimas eleições, a votação combinada nos dois partidos fica nos 66%, uma queda superior a 10 pontos percentuais.

E os números tornam-se mais significativos olhando apenas para as últimas europeias - distribuindo os votos na coligação de direita na proporção 25/75 entre centristas e sociais-democratas, PSD e PS não conseguiram mais que 54% dos votos. Uma votação que não lhes permitiria, por exemplo, fazer uma revisão constitucional. Conclusão de Carlos Jalali: "Há sinais de insatisfação dos eleitores. O que não há em Portugal é um partido que se afirme como alternativa que consiga mobilizar os eleitores".

Na Europa, a ameaça ao bipartidarismo dominante tem surgido de todos os lados. Na Espanha e na Grécia à esquerda, na França à direita, no Reino Unido também, na Itália sem um posicionamento ideológico definido. Diferentes no formato, na origem, na ideologia, só um ponto une estes partidos - "O discurso de que são a verdadeira alternativa a um sistema partidário ossificado e que não é verdadeiramente aberto. E esse é o discurso que tem funcionado", sublinha Jalali. Mas será qualquer um destes fenómenos repetível em Portugal?

PODEMOS, UM FENÓMENO ESPANHOL
Questionado sobre se o Podemos poderia existir e conseguir esta projecção em Portugal, Daniel Oliveira tem uma resposta pronta: "Não. Em Espanha há movimentos sociais muito fortes. O Podemos resulta disso, de movimentos sociais que se mantiveram muito activos estes três anos". Nada a ver com a realidade nacional, onde as manifestações foram esporádicas e os protestos de movimento mais organizados - os sindicatos - são "rotinizados e burocratizados".

Para o comentador e ex-membro do Bloco de Esquerda "não se está a passar nada" no sistema político português por "responsabilidade dos actores políticos" - porque o espaço político por preencher "está lá" para quem o souber ocupar. Daniel Oliveira diz acreditar que algo se vai passar, "agora ou depois", se não houver uma alteração no rumo da política nacional: "Mas não é o Podemos, será outra coisa qualquer." Será a plataforma de esquerda (com o Livre e independentes) em cuja criação o ex-bloquista está agora envolvido? "Não está no terreno, é difícil antever o impacto". Marinho e Pinto? Ocupa um "espaço de pouca clareza ideológica, é um caso de populismo unipessoal. Marinho e Pinto não vai fazer um partido, vai--se transformar num partido".

Do outro lado do espectro partidário, Francisco Mendes da Silva, comentador político e dirigente do CDS, não vê nenhum partido/movimento que, em próximas eleições, possa alterar o actual quadro partidário. "À direita ponho totalmente de parte essa hipótese. Se estivesse o PSD no governo e o CDS fora, talvez, assim é impossível. À esquerda houve uma renovação no PS que faz com que os partidos à esquerda não tenham grande margem", antecipa. E os nossos challengers, acrescenta, "não são assim tão challengers" - "O Livre quase não tinha nascido e o Rui Tavares já falava em negociar com o PS". Uma diferença substancial com o que se passa em Espanha: "O Podemos tem condições de base que a nossa esquerda não tem, veio dar um formato partidário a forças - sindicatos, movimentos sociais - que já tinham uma força política. E isso permite-lhe um discurso radical, de alternativa, não uma posição de subalternidade" face ao PS.

VAZIO GENERALIZADO À ESQUERDA

 Daniel Oliveira não tem dúvidas que a "principal vítima destes movimentos" tem sido o "centro-esquerda, seja no governo ou na oposição". Há uma razão para isso: este espaço político tinha "a obrigação de apresentar uma alternativa" e o que fez foi apresentar um discurso de austeridade mitigada: "Houve uma agregação dos partidos tradicionais em torno de um discurso que é de direita". A explicação aplica-se a Portugal, mas com uma especificidade: "Foi um dos poucos países com um primeiro-ministro que assumiu como seu o discurso da troika. Nesse sentido fez um favor ao PS, que só não ganhou nada com isso porque tinha um líder inepto. E os partidos à esquerda do PS não souberam capitalizar isso". Com António Costa o panorama mudou de figura e o comentador não nega a possibilidade de os socialistas alcançarem uma maioria absoluta - mas se o conseguirem será com os votos "à direita". Mas "há muito voto solto. Em Portugal e em todos os países europeus".

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