“Penso em Rui Rio para fazer a
limpeza desejável no PSD”
Entrevista
Margarida Gomes Texto Nelson Garrido Fotografia / 10-11-2014 / PÚBLICO
O fundador do PPD/PSD diz que partidos da maioria não têm sido hábeis e que
o PSD de Pedro Passos Coelho deixou de ser social-democrata
“Pessoalmente, não acredito que,
mesmo coligado com o CDS, o PSD ganhe as próximas legislativas. A vitória vai
ser dada ao PS” “Hoje em dia é difícil situar o PSD ideologicamente”
“Resta saber como é que as forças que hoje dominam [o PSD], pior que isso,
o ocupam inteiramente, poderão reagir a uma investida de Rui Rio. Eu acredito
nela, espero por ela e faço votos que consiga”
Fundador do
partido defende que Rui Rio deve ser o próximo líder do PSD, mas só se tiver
condições. Quanto às legislativas de 2015, diz que a vitória “será dada” ao PS,
porque os portugueses começam a estar fartos dos desastres deste Governo e
desta coligação. PSD e o CDS têm condições para renovar a coligação para as
eleições legislativas de 2015? Condições haverá, mas sem sucesso.
Porquê sem sucesso?
Sem sucesso porque não repetem a vitória eleitoral em 2015. Mas do seu ponto de
vista, há condições políticas para os dois partidos se entenderem? Isso há, até
por uma questão de sobrevivência de um e de outro e de afirmação política,
porque um sem o outro não vai a lado nenhum. Encontra vantagens numa reedição
de uma aliança préeleitoral entre os dois partidos ou entende que o PSD deve
estar disponível para um entendimento com o PS no caso de ter maioria relativa?
Encontraria se houvesse essa hipótese de ganho eleitoral e de vencimento
eleitoral, mas pessoalmente não acredito que, mesmo coligado com o CDS, o PSD
ganhe as próximas. A vitória nas próximas eleições vai ser dada ao PS. O que
está a dizer é que António Costa será o futuro primeiroministro? Os portugueses
começam a estar fartos dos desastres deste Governo e desta coligação e,
portanto, não querem repetir a dose. Que balanço faz do Governo liderado por
Pedro Passos Coelho? Quem dá o que tem não é obrigado a mais e eles [Passos
Coelho e Paulo Portas] podem pouco. Politicamente não têm sido hábeis e o meu
partido infelizmente, para mim, deixou de ser um partido social-democrata,
deixou de ter passado. Hoje em dia, o doutor Francisco Sá Carneiro é apenas uma
figura de cartaz, não é invocado para nada. O PSD é um partido híbrido, tendo
acolitado gente — uma gente apreciável, mas outra gente não apreciável e muito
discutível sobre todos os aspectos, a começar na fidelidade ideológica, porque
hoje é difícil situar o PSD ideologicamente. Na hora de prestar contas aos
militantes sobre o Orçamento do Estado para 2015, Passos Coelho assumiu que é
“ponto de honra” tirar Portugal do défice excessivo em 2015. Acha possível
atingir esse objectivo ou o primeiro-ministro já está com um discurso
pré-eleitoral? É muito difícil fazer esse tipo de previsões. Compreendo que ele
o faça em termos eleitorais, quanto à viabilidade desse discurso, tenho as
maiores dúvidas. E tenho também as maiores dúvidas que o PSD, com Passos Coelho
à frente, possa reeditar um ganho eleitoral. Já não seria a mesma coisa se o
PSD tivesse à frente um Rui Rio, porque essa é a chave para muitas outras
coisas. Não acredita então que o ano de 2015 seja o “momento de viragem na
recuperação do rendimento dos portugueses”, como, recentemente, proclamou o
primeiroministro? Tenho dúvidas, não tenho esse dom de adivinhação, mas não me
parece muito provável. O Presidente da República alertou recentemente para o
risco de implosão do sistema partidário português tal qual o conhecemos. O que
podem/ devem fazer os partidos para mudar este estado de coisas? Os partidos
têm uma grande dificuldade de se auto-regenerar, uma grande dificuldade, porque
há um valor de inércia muito grande. Existem pessoas que entraram para os
partidos e que se foram acomodando, que foram tecendo a sua teia de interesses
e de influências próprias, interesses muitas vezes não legítimos, mas o que é
certo é que são uma força. Desalojar esses indivíduos não é tarefa fácil. Só
com um surto novo —e é por isso que eu penso em Rui Rio — e uma mudança de
circunstâncias será possível fazer a limpeza desejável para o partido. Mas o
risco de implosão existe, como referiu o Presidente da República? Implosão não.
Os partidos estão muito arreigados e são as únicas forças políticas
organizadas. Pode dizer-se que os partidos têm sofrido uma grande erosão e isso
é uma verdade, o que dá origem a movimentos singulares díspares, quase todos de
orientação populista, na medida em que se afirmam contra os partidos. Quanto a
mim, os partidos ainda estão de pedra de cal. Se o PSD for muito penalizado nas
legislativas, Passos Coelho terá condições para se manter na liderança do
partido? Não sei. Estou muito afastado da organização partidária do PSD,
sobretudo dos seus meandros, das suas teias e, portanto, do seu sistema de
auto-segurança e de autodefesa interna. Falou de Rui Rio. O expresidente da
Câmara do Porto pode vir a ser o próximo líder do PSD? Se tiver condições para
isso.
E que condições
são essas? As condições são ter o horizonte limpo dentro do PSD, porque Rui
Rio, como toda a gente sabe, não é um adepto desta liderança e resta saber como
é que as forças
que hoje em dia
dominam, pior do que isso, o ocupam inteiramente, poderão reagir a uma
investida de Rui Rio. Eu acredito nela, espero por ela e faço votos que o
consiga. O que está a dizer é que Rui Rio pode tornar o PSD num partido
diferente daquele que é hoje e que a si o “entristece” e “revolta”? Sim, pela
simples razão que o doutor Rui Rio é um social-democrata genuíno,
ideologicamente e na prática. Portanto, tem todas as possibilidades de fazer
renascer o espírito, a alma e a afirmação de um PSD social-democrata que ele
hoje não é.
Então é o quê o
PSD hoje? É um partido híbrido que não sabe bem onde se situa, situa-se através
de determinadas personalidades que, politicamente, são também muito
discutíveis, díspares, fluidas, não convincentes e, sobretudo, não são fiéis ao
espírito da criação do partido e à mensagem deixada por Francisco Sá Carneiro,
que hoje no partido está absolutamente silenciado.
O PSD perdeu a
ideologia? Claro que sim, sem dúvida nenhuma. Continua a pensar que o PSD é um
partido apenas de Lisboa? De Lisboa e de uma certa província que se agrega, por
vezes, sempre interessadamente, mas normalmente pelos bons motivos à clique de
Lisboa. O PSD deve introduzir as primárias, abrindo o partido aos
simpatizantes? Nunca pensei a sério nisso, mas não tenho nada contra. Mas esta
direcção do PSD nunca deixará que isso aconteça. Com Rui Rio será possível. Nas
últimas eleições autárquicas apoiou o independente Rui Moreira contra o
candidato oficial do PSD, Luís Filipe Menezes, à Câmara do Porto e o partido
ameaçou expulsá-lo. Nunca deu muita importância a essa ameaça. Nenhuma. Dei uma
importância zero. Estava completamente a marimbar-me quanto à eventual reacção
do partido. Faltou coragem política ao PSD para expulsar alguns históricos do
partido que decidiram fazer campanha por Rui Moreira contra Menezes? A vezes
direcçãoos mais recuou, incapazes porque têm muitas réstias de bom senso. Que
avaliação faz do primeiro ano de Rui Moreira à frente da Câmara do Porto? Boa.
Conheço bem Rui Moreira, considero-o um homem muito competente, muito
interessado, muito sabedor e tudo quanto é tocado por ele fica com a sua
impressão digital. Continuo a apoiá-lo e a felicitá-lo. O PSD pode vir a apoiar
Rui Moreira em 2017, prescindindo de um candidato próprio à Câmara do Porto?
Não. O PSD nunca fará isso, porque hoje o PSD não é um partido que tenha esse
grau de inteligência, de mobilidade e de percepção do verdadeiro fenómeno
político. As pessoas que estão à frente do PSD agarram-se ao poder de qualquer
maneira e seja contra quem for que não seja do círculo deles. Foi um erro
político, o partido ter apoiado Luís Filipe Menezes? Foi muito mais do que um
erro político, muito mais, foi uma idiotice pegada e os resultados estão à
vista. O povo pronunciouse e de uma maneira claríssima. Luís Filipe Menezes tem
condições para regressar à política depois desta derrota? Não tenho relações
com o dr. Luís Filipe Menezes, portanto tudo o que eu possa dizer tem de ser
interpretado com esta reserva. Não sei o que ele fará —e o que ele vier a fazer
também pouco me interessa —, só sei que ele já fez tantas, tantas e tantas
coisas e tão diferentes, algumas tão más, que tudo é possível. Mas auguro que o
futuro dele não será muito risonho.
Sem comentários:
Enviar um comentário