terça-feira, 11 de novembro de 2014

Centro de congressos e gare marítimo-turística deverão ser pagos com nova taxa turística. Lisboa. Uma taxinha contra o crescimento, por Luís Rosa

A Câmara de Lisboa está à espera de uma resposta do Governo, para avançar com um projecto para a Estação Sul e Sueste


Centro de congressos e gare marítimo-turística deverão ser pagos com nova taxa turística
INÊS BOAVENTURA 10/11/2014 - PÚBLICO

A Câmara de Lisboa quer cobrar um euro a quem entrar na cidade, por via marítima ou aérea, a partir de 2015. No ano seguinte, os turistas passarão a pagar também um euro por cada noite de dormida na cidade.
A criação de um centro de congressos no Pavilhão Carlos Lopes, a transformação da Estação Sul e Sueste numa “gare marítimo-turística” e a requalificação do Campo das Cebolas, do Cais do Sodré e da frente ribeirinha de Belém são alguns dos investimentos que António Costa quer financiar através da Taxa Municipal Turística que pretende lançar já em 2015. A partir daí, quem entrar em Lisboa por via aérea ou marítima vai ter de pagar um euro, valor ao qual se juntará, no ano seguinte, um euro por cada noite de dormida na cidade.

“Não é uma receita municipal. É uma receita consignada ao Fundo de Desenvolvimento Turístico”, salientou António Costa. Segundo o presidente da Câmara de Lisboa, a gestão desse novo fundo “não será feita exclusivamente pela câmara”, mas sim “em processo de co-decisão com os parceiros” do sector do turismo, que serão chamados a pronunciar-se sobre quais os investimentos que “reconhecem como mais-valias” para a sua área de actividade.  

O autarca socialista elencou alguns dos investimentos possíveis, que constam aliás do Plano Estratégico para o Turismo na Região de Lisboa 2015-2019: a instalação de um espaço museológico dedicado às descobertas (na Ribeira das Naus), a criação de “mobilidades suaves” para o Castelo de São Jorge, um “projecto de sinalética turística e de percursos turísticos” e a “continuação da requalificação da frente ribeirinha”.

Além desses, António Costa deu particular relevo à criação de um novo centro de congressos, que segundo disse será instalado no Pavilhão Carlos Lopes, e à requalificação da Estação Sul e Sueste, onde a Associação de Turismo de Lisboa pretende concentrar a “actividade marítimo-turística”. Este último projecto continua à espera de luz verde do Governo para avançar, uma vez que o edifício desenhado por Cottinelli Telmo em 1932 está nas mãos da CP. “É uma nódoa negra que persiste no Terreiro do Paço. É uma vergonha para a cidade o estado em que o Estado está a manter este imóvel de grande valor arquitectónico”, criticou o presidente da câmara. 

O autarca apontou a Taxa Municipal Turística como a solução possível para fazer face àqueles investimentos, “fundamentais para continuar a alimentar a atractividade da cidade”, uma vez que “o próximo quadro comunitário de apoio não vai financiar estes projectos”. António Costa frisou ainda que esta nova taxa existe “em todas as capitais europeias e em muitas cidades europeias” e explicou que será uma medida “temporária”, que vigorará até 2019 e será reavaliada nessa altura.

De acordo com aquilo que foi avançado pelo presidente da câmara e pelo seu vice-presidente numa conferência de imprensa que se realizou esta segunda-feira, as entradas na cidade, por via aérea ou marítima, começarão a ser taxadas já no próximo ano, sendo cobrado um euro a cada turista. No Orçamento municipal para 2015, cujos principais aspectos foram dados a conhecer na ocasião, está previsto o encaixe de sete milhões de euros através dessa rubrica.  

A partir de Janeiro de 2016, os turistas passarão a ter de pagar também um euro por cada noite de dormida na cidade. Segundo o número dois do executivo, não deverão ser cobrados mais do que sete euros a cada pessoa, estando isentas as crianças e as pessoas que realizem “estadias prolongadas” que comprovadamente não tenham fins turísticos. Esta componente da taxa, disse Fernando Medina, deverá render oito milhões de euros por ano.

Em comunicado, a Associação de Hotelaria de Portugal informou que o seu conselho geral se manifesta "frontalmente contra qualquer aumento da carga fiscal sobre a hotelaria, independentemente da natureza e nome que venha a revestir, bem como de quaisquer taxas que penalizem a actividade turística".

O orçamento da Câmara de Lisboa para 2015 prevê outras novidades ao nível das taxas, nomeadamente a criação de uma Taxa Municipal de Protecção Civil (TMPC), com a qual se conta ganhar 18,9 milhões de euros nesse ano. O objectivo anunciado é “financiar as actividades e investimento” ao nível do Regimento de Sapadores Bombeiros e do seu departamento de Protecção Civil. 

António Costa destacou que esta taxa será “neutra para os residentes”, uma vez que estes irão deixarão de pagar a Taxa de Conservação de Esgotos (TCE) hoje existente. Mas há pessoas para as quais a criação da TMPC, que vai incidir sobre o valor patrimonial tributário dos prédios urbanos, irá implicar um acréscimo de custos: a câmara, adiantou o autarca, vai pedir “contribuições acrescidas” aos proprietários de “prédios degradados, devolutos, em ruínas” e a quem desenvolve “actividades de risco”, como “distribuição de gás e de electricidade e parques de estacionamento”.   

Ainda ao nível das taxas, vão avançar as já anunciadas alterações na área dos resíduos urbanos e do saneamento, que o executivo camarário tem vincado que visam cumprir as disposições da entidade reguladora do sector. Assim, como se diz num texto explicativo das opções do orçamento, a tarifa de resíduos urbanos será autonomizada, passando a surgir de forma isolada na factura da água, e os custos com a rede de esgotos passarão a integrar a tarifa de saneamento. Além disso, houve que “definir tarifários que assegurem a recuperação dos custos incorridos com os serviços” em causa, “tendo em vista a sustentabilidade dos sistemas”.

De acordo com as contas feitas pela câmara, uma família média terá em encargo mensal de 3,5 euros com a nova Tarifa de Resíduos Urbanos, valor que descerá para 1,27 euros nos agregados que beneficiem do tarifário social.

Quanto à Tarifa de Saneamento, estima-se que uma família média vá pagar 5,24 euros por mês quando actualmente paga 2,92 euros. Quem tiver tarifário social poderá ver a sua factura mensal diminuir 1,45 euros e quem tiver tarifário familiar (destinado a agregados com cinco ou mais pessoas) poderá poupar 0,83 cêntimos.

O presidente do município assegura que em ambos os casos estão em causa “preços competitivos, comparativamente com outros municípios da Área Metropolitana de Lisboa”.

No outro prato da balança, António Costa anunciou que quer manter os impostos “baixos e atractivos”. Nesse sentido, a Câmara de Lisboa vai, em 2015, “manter a taxa de IMI no mínimo” de 0,3%, “continuar a devolver aos munícipes 2,5% do IRS” e “manter as isenções na Derrama”, como se destaca no texto explicativo das opções do orçamento.

António Costa destacou a importância de se promover uma política fiscal “estável e previsível”, referindo que se na capital fossem praticadas as taxas máximas de IMI e de IRS os munícipes pagariam, entre 2013 e 2017, mais 350,4 milhões de euros do que vão pagar se as taxas actuais se mantiverem até ao fim do mandato. 

Contas feitas, o executivo camarário garante que o Orçamento para 2015 “mantém o apoio às famílias por via dos elevados benefícios fiscais atribuídos, política que as novas taxas não comprometem”. Segundo o presidente do município, entre 2013 e 2017 as famílias terão um “benefício líquido” (excluindo os “custos com novos tarifários”) de 111,7 milhões de euros.    

A Associação Lisbonense de Proprietários já reagiu à "reconversão da Taxa de Esgotos e à criação de uma nova Taxa de Protecção Civil", num comunicado em que diz recusar "impostos encapotados e taxas ilegais". A associação promete "bater-se" contra essas medidas "nas instâncias judiciais competentes" e diz que não aceitará que os seus associados sejam "chamados a pagar a factura pela irresponsabilidade financeira e despesismo da autarquia".

Também o vereador António Prôa fez chegar à comunicação social uma declaração escrita, na qual afirma que a proposta de orçamento municipal para 2015 "confirma os piores cenários, apresentando um colossal aumento de impostos, taxas e tarifas em relação ao orçamento do ano passado".


"Este é um orçamento do caminho fácil. Da solução preguiçosa. O Dr. António Costa, em vez de tornar a câmara mais eficiente, de racionalizar de reformar, faz o mais fácil: corta no investimento e aumenta brutalmente os encargos dos lisboetas", critica o autarca social-democrata.

Lisboa. Uma taxinha contra o crescimento
Por Luís Rosa
publicado em 11 Nov 2014 – in (Jornal) i online
Cada euro de taxas é uma machadada na competitividade do turismo de Lisboa

Parece que António Costa começou a levantar o pano sobre o seu pensamento económico. Ao contrário do que se esperava, Costa não escolheu a moção de estratégia endereçada ao XX Congresso Nacional do PS nem a sua "Agenda para a Década", mas sim a proposta de orçamento de 2015 para Lisboa. A solução é simples: aumentar as receitas fiscais e tentar cortar de igual forma na despesa corrente.

Na proposta de orçamento para Lisboa encontramos um aumento de impostos que, contudo, pode ser contraditório com a crítica geral que Costa tem vindo a fazer à política de austeridade (e do respectivo "enorme aumento de impostos") seguida pelo governo de Passos Coelho. Do acréscimo de receitas correntes do município lisboeta de 94,6 milhões de euros, cerca de 27,3 milhões resultam de um aumento de receitas dos impostos directos enquanto 971 mil euros resultam da criação de novas taxas e de um crescimento previsto para a receita de multas. Com a transferência de competências para as freguesias, Costa também conseguiu diminuir a despesa com pessoal cerca de 19,7 milhões de euros, mas é obrigado a transferir praticamente o mesmo valor para as freguesias. Isto é, a despesa não desapareceu - está noutra rubrica.

António Costa bem pode argumentar que, no total, a receita total das taxas vai diminuir cerca de 1,2 milhões de euros, em virtude da eliminação da taxa de esgotos, que a argumentação não colhe. Para compensar esta diminuição de receita não só é criada uma segunda nova taxa (além da taxa turística), chamada taxa de protecção civil (com receitas previstas de 18,8 milhões de euros), como a autarquia prevê um aumento de multas na ordem dos 2,2 milhões de euros. A Polícia Municipal e outros órgãos de fiscalização autárquicos vão entrar em 2015 numa espécie de caça à multa para conseguir concretizar este aumento de 29% de receitas provenientes de multas. A rubrica taxas, multas e outras penalidades acaba por crescer quase um milhão de euros face a 2014. Pior que isso, contudo, foi seleccionar um dos poucos sectores em que a economia nacional se tem mostrado competitiva, o turismo, para criar um novo imposto que se traduzirá num acréscimo de receita previsto de 7 milhões de euros. E aqui temos de dizer que a selecção do turismo para um aumento de impostos é contraproducente. Porque cada euro de imposto (ou 7 euros, que é o valor máximo da nova taxa) representa um aumento de preço do respectivo serviço e afecta directamente a competitividade de um sector que tem vindo a crescer todos os anos, com excepção de 2008 e 2009. De 2004 a 2013, o número de turistas em Lisboa aumentou cerca de 1,2 milhões - o que corresponde a um crescimento de 40% face a 2004. Para esse crescimento muito contribuiu a competitividade do preço dos diferentes serviços turísticos lisboetas, como os hotéis - significativamente mais baixo que noutras capitais europeias. Não tenhamos dúvidas: a nova taxa vai prejudicar o crescimento do turismo em Lisboa.

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