Manuel Maria Carrilho e Bárbara
Guimarães do amor ao inferno
De casal conto de fadas a
conferências de imprensa num hotel de luxo para falar sobre a ex-mulher e
conspirações políticas para ganhar votos. Como é que o casamento de um filósofo
conceituado e ex-ministro da Cultura acabou assim?
Por Rosa Ramos
com Kátia Catulo
publicado em 12
Nov 2014 in
(Jornal) i online
Posou para as
fotografias até no momento de beber água. Manuel Maria Carrilho alugou uma
sala, ontem à tarde, num luxuoso hotel do centro de Lisboa para receber
jornalistas e contar como o governo terá utilizado os seus problemas com a ex-
-mulher para atacar o PS - partido de que foi ministro e de que ainda é
militante - em época pré-eleitoral. A apresentadora de televisão foi convidada
pela secretária de Estado para a Igualdade para participar, no início do mês,
nas "Jornadas contra a Violência Doméstica". Um evento que, garante
Carrilho, terá sido, na verdade, "um exercício de manipulação política
grave e cruel, além de ilegal e inconstitucional", que visou "de
forma clara" a sua pessoa. E o PS.
Carrilho recordou
que Bárbara Guimarães foi vista dias antes a almoçar com a secretária de Estado
- algo que revela o carácter planeado do evento: "Tudo foi cuidadosamente
objecto de planeamentos, colaborações e conluios."
Para o
ex-ministro, o facto de o governo ter convidado a apresentadora de televisão
para participar num evento sobre violência doméstica numa altura em que ainda
correm nos tribunais dois processos- -crime, é uma "intromissão do
Estado" na justiça. "E encontrar o governo associado a uma coisa
destas permite concluir que existe o objectivo político de atacar alguém que se
encontra ligado ao mais importante partido da oposição, sabendo-se que nos
encontramos já em contagem decrescente para o combate político."
Manuel Maria
Carrilho, que leu um discurso escrito, referiu ainda que o evento, promovido
pela "desorientada" secretária de Estado, teve por objectivo
"manipular a opinião e os tribunais". "Está-se na presença de um
exercício de trapaça política e social, caucionada pelo governo, o qual
pretende, de forma oportunista, retirar dividendos políticos com a finalidade
de, pouco a pouco, ir ganhando posição no combate eleitoral que irá ter de
enfrentar num futuro próximo."
Só isso,
acrescentou, explica o facto de o primeiro-ministro e o ministro dos Assuntos
Parlamentares terem marcado presença no evento. "Pelos vistos, este
governo, não satisfeito com os graves problemas que tem causado aos
portugueses, ainda perde tempo a promover acções ad hominem apenas por estar em
causa um adversário político ligado ao partido que, tudo indica, se encontra
numa posição favorável para constituir um novo governo, como espero
sinceramente que aconteça, a bem de Portugal."
Apesar das
referências constantes ao PS, Carrilho garantiu aos jornalistas, já no final da
conferência de imprensa, que abandonou a política "há algum tempo" e
que está concentrado na carreira académica. No entanto, o ex-ministro garante
que é "um cidadão como outro qualquer", disponível para "exercer
a democracia". Um "nim" sobre se poderá vir a ser escolhido para
um cargo político se o PS ganhar as eleições legislativas do próximo ano.
ERA A FAMÍLIA
PERFEITA
Não é a primeira vez que Carrilho mistura a vida
privada com a política. Quando o verniz do casamento cor-de-rosa com Bárbara
Guimarães estalou, encontrou-se com o então líder do PS, António José Seguro,
para, segundo o "Expresso", discutir as implicações do escândalo. Por
esses dias, já a ex-mulher, a crítica literária Joana Varela, tinha escrito uma
mensagem de apoio na página do Facebook da apresentadora: "Parabéns,
Bárbara. Fizeste-lhe o que ele me fez. Ficaste-lhe com a casa e com o
filho." Carrilho, que foi acusado de maus--tratos físicos e psicológicos
também no primeiro casamento, atribui a culpa dos falhanços ao destino. "Tive
azar com as mulheres", disse numa entrevista à "Visão".
Bárbara e Manuel
Carrilho separaram--se no ano passado e há uma série de processos a correr em
tribunal (ver cronologia), sendo que em dois deles está em causa o crime de
violência doméstica. A apresentadora acusa o professor de agressões e o
professor garante ter sido alvo de violência. Os dois negam as acusações um do
outro. A novela do ex-ministro da Cultura envolve telefonemas para a PSP,
agressões misteriosas, um suposto rapto dos filhos menores, furtos de bens,
acusações de alcoolismo, conferências de imprensa, primeiras páginas de jornais
e de revistas. Um desfecho surpreendente, tendo em conta que, em Outubro de
2012, Carrilho dedicava à mulher o livro que acabara de lançar, "Pensar o
Mundo". E ela desfazia--se em elogios ao trabalho do marido: "É uma
obra lindíssima", dizia aos jornalistas. Se agora a apresentadora é um
problema para Carrilho, não foi assim em 2005: quando quis ser presidente da
Câmara de Lisboa, o ex-ministro mostrou a mulher e o filho no vídeo do
lançamento da campanha. Eram a imagem de uma família perfeita e que o
ex-ministro em tempos protegia.
Quando o filho
Dinis nasceu, Carrilho foi acusado de agredir um fotógrafo que tentou recolher
imagens do bebé, alegando que tinha direito à sua privacidade. O ex--ministro e
a apresentadora casaram em 2001. Completavam-se, segundo a opinião pública: ela
era uma espécie de boneca da televisão, a quem ele dava credibilidade e
cultura. E ele ganhava a admiração geral por ter conquistado uma mulher bonita
e conhecida de todo o público português.
O AMOR ACABA ASSIM?
Ao fim de 12 anos
de casamento, e já com dois filhos, deixou de haver desejo de privacidade ou
elogios mútuos. E dos filmes cor-de-rosa passou--se às conferências de imprensa
em hotéis de Lisboa para falar de assuntos do foro privado misturados com
cabalas políticas. "No contexto da dinâmica relacional, a passagem do amor
ao ódio é um processo rápido. É o acumular de feridas não saradas da
auto-estima, que se sente beliscada quando o outro refaz a sua vida",
explica o professor de Psicologia Forense Carlos Poiares.
A violência
doméstica não escolhe classes sociais, mas não deixa de parecer estranho que um
professor catedrático e uma apresentadora de televisão se vejam envolvidos em
acusações mútuas. "Neste tipo de casos em que há mediatismo e estatutos
elevados, o abandono é mais difícil de digerir", considera o especialista.
"As movimentações do outro, que são públicas, passam a ser sempre
interpretadas como sendo contra si e cai-se frequentemente no ridículo." A
seguir ao divórcio de um casal público passa a haver um jogo de egos. "Quanto
maior é o estatuto que a pessoa julga que tem, maior desconforto sente ao ver a
outra pessoa seguir a sua vida e ter sucesso. Nasce assim o desejo de
escamotear o outro." Por outro lado, explica Carlos Poiares, quanto maior
é o estatuto social, "maior é também sentimento de impunidade".
O ex-inspector da
PJ António Teixeira recorda que em estatutos sociais mais elevados a violência
- seja física seja psicológica - é mais facilmente camuflada. E o homem
"continua a não gostar de ser rejeitado, trocado ou posto de lado". Quando
há um divórcio litigioso, a única coisa que importa, de parte a parte, é
"ganhar".
António Teixeira
defende que, no caso concreto de Bárbara e Carrilho, o Ministério Público
deveria actuar. "Quando há menores e, em casos como este, com impacto
mediático, deveriam ser tomadas medidas adicionais, de maneira a proteger as
crianças, que são quem sofre com isto". Porém, o antigo inspector
considera que o governo não deveria ter convidado a apresentadora para a
conferência sobre violência doméstica: "O Estado foi pouco cuidadoso ao
chamar alguém que tem um litígio judicial por resolver, porque isso extrema
ainda mais os problemas."
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