terça-feira, 11 de novembro de 2014

EDITORIAL/ PÚBLICO Isabel dos Santos joga o maior trunfo. Isabel dos Santos deixou de ser uma investidora discreta.



EDITORIAL/ PÚBLICO
Isabel dos Santos joga o maior trunfo
DIRECÇÃO EDITORIAL 10/11/2014 - PÚBLICO
A empresária angolana veio baralhar aquilo que já de si era bastante confuso.

Não é uma surpresa, mas não deixa de ser surpreendente. A OPA de Isabel dos Santos sobre a PT SGPS não é surpresa porque já na semana passada a empresária angolana e o grupo Sonae emitiram um comunicado onde diziam estar disponíveis para participar numa solução para salvar a operadora de telecomunicações nacional. Mas a OPA é surpreendente porque Isabel dos Santos avança sozinha, sem a Sonaecom, a parceira da filha do Presidente de Angola no controlo da operadora NOS. Embora isso não queira dizer que estão de candeias às avessas. E a OPA é surpreendente dada a ambição, legítima diga-se, subjacente à proposta.

Se a OPA tiver sucesso, Isabel dos Santos conseguirá, de uma só assentada, três grandes conquistas. Conseguirá controlar a PT SGPS; passará por essa via a ser accionista de referência da Oi, um dos maiores operadores no Brasil; e, por fim, conseguirá passar para o lado de lá da barricada e resolver o diferendo que a opõe à PT/Oi em relação aos 25% que estes últimos detêm na angolana Unitel.

É evidente a ambição da empresária angolana, que joga uma cartada para tentar ser a herdeira do sonho de construir um grande operador de telecomunicações de língua portuguesa. Agora, o caminho para lá chegar é ínvio e cheio de obstáculos. E são tantas as condições impostas por Isabel dos Santos e é necessária uma tão grande conjugação de vontades que dificilmente a OPA terá sucesso.

Primeiro é preciso convencer os accionistas da PT SGPS, portugueses e não só, a venderem na OPA. E aqui o preço é o factor determinante. Os accionistas terão de achar a oferta suficientemente atractiva para que possam abdicar da possibilidade de poderem vir a participar no futuro da empresa que resultar da fusão entre a PT e a Oi. Mas do ponto de vista dos accionistas portugueses, a OPA de Isabel dos Santos tem uma grande vantagem face à outra proposta que está em cima da mesa, a da Altice, já que significa embolsar dinheiro imediato. No caso da proposta dos franceses, o encaixe seria feito pela Oi e só indirectamente é que os actuais accionistas da PT SGPS poderiam beneficiar.

O outro obstáculo que Isabel dos Santos terá de transpor será convencer os accionistas brasileiros da Oi a alterar o acordo feito com a PT, o que não será fácil de acontecer. Para os accionistas brasileiros da Oi provavelmente é mais conveniente terem de lidar com vários accionistas portugueses (alguns deles financeiramente já bastante debilitados) do que com uma única empresária angolana que, sabem, vai entrar na Oi provavelmente com a ambição de mandar.

Se porventura Isabel dos Santos conseguir ultrapassar estas duas barreiras, ainda lhe sobrará um terceiro obstáculo: a Autoridade da Concorrência, que dificilmente verá com bons olhos a presença simultânea, mesmo que indirecta, de Isabel dos Santos na NOS e na PT. Mas aqui eventualmente poderia entrar a Sonaecom a assumir sozinha o controlo da NOS e libertar a empresária angolana para ficar com a PT.

Como ficará a PT no final desta história ainda é uma incógnita. Mas o facto de começarem a surgir várias opções e propostas só ajuda a valorizar a empresa.

Isabel dos Santos deixou de ser uma investidora discreta
Luís Villalobos / 11-11-2014 / PÚBLICO

Apresença de Isabel dos Santos em Portugal demorou alguns anos até ser confirmada oficialmente. No final de 2005, passou a ser accionista da Galp Energia ao lado da petrolífera estatal angolana Sonangol e de Américo Amorim, quando o Estado português vendeu uma importante fatia do capital, mas, na altura, só estes dois últimos nomes foram conhecidos.
Rumores havia muitos, mas só em 2008 se confirmou a sua participação, por via indirecta, na petrolífera portuguesa (ver infografia). Foi, aliás, nesse ano que a filha do presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, avançou para o sector bancário: o banco BIC expandiu-se para Portugal, tendo o ex-ministro do PSD, Mira Amaral, como presidente executivo, e ficou com os 9,7% do BPI que estavam nas mãos do BCP.
A partir daqui, nunca mais parou de reforçar os seus investimentos em Portugal, articulando-os com os negócios em Angola. No final de 2009, diversificou os negócios e comprou 10% da Zon, que resultara da divisão dos negócios da PT após a OPA frustrada da Sonaecom. Poucos meses depois surge a Zap, empresa de subscrição de televisão paga, em Angola. Isabel dos Santos fica maioritária e estreita as ligações à Zon. Na Unitel, lançada em 2001 em parceria com a PT (o primeiro grande negócio com sócios portugueses), o relacionamento com o accionista português passou a complicar-se por volta de 2006.
Os dividendos dos seus negócios iam ajudando a novas apostas. Há empresas vendedoras e Isabel dos Santos tem ambição, preparando bem a sua estratégia. Casada desde 2002 com o congolês Sindika Dokolo, é tida como boa e dura negociadora, é vista como alguém que beneficiou do facto de ser filha de José Eduardo dos Santos (nasceu em 1973, fruto do primeiro casamento, com Tatiana Kukanova), mas que soube multiplicar os seus negócios. “Não represento nenhum interesse e não represento ninguém, a não ser a mim própria”, escreveu Isabel dos Santos em 2007.
No final de 2011, a empresária começou a acelerar e ganhou a privatização do BPN, por apenas 40 milhões, lançando o Banco BIC Portugal para a primeira divisão. Em 2012, Américo Amorim chegou a acordo com os italianos da ENI e a Amorim Energia começou a reforçar a posição da Galp Energia, processo em que é devidamente acompanhado pela Sonangol e por Isabel dos Santos.
Por esta altura, o programa da troika já está a ser aplicado pelo Governo liderado por Pedro Passos Coelho, a economia está em agonia e há ainda mais acertos de posições accionistas. A CGD é uma das várias entidades que saem do capital da Zon (o banco do Estado tinha 10%), vendendo a posição a Isabel dos Santos. Num processo construído passo a passo, a empresária passa a ser a maior accionista da empresa de telecomunicações. Ao mesmo tempo, reforça também a participação no BPI, onde é hoje a segunda maior accionista.
O fim da fragmentação de capital na Zon permite o casamento, tantas vezes anunciado, da Zon com a Optimus, através de uma manobra de equilíbrio entre Isabel dos Santos, já milionária, e o grupo Sonae (dono do PÚBLICO). A partir daqui, a PT ganhou um concorrente mais musculado, para depois se virar para o Brasil.


A empresária angolana, que nunca conseguiu dominar Américo Amorim na Galp Energia, acabou por se separar do seu sócio na área da banca. Em Outubro deste ano, Amorim saiu do capital e da administração do Banco BIC em Angola e Portugal. Em vez de dar lugar a novos accionistas, Isabel dos Santos reforçou a sua posição (para 42,5%), tal como o presidente executivo do banco angolano, Fernando Teles.

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