O diabo de Paula Teixeira da Cruz
Para uma mulher assim, não
caberia na cabeça ser apanhada na curva...
Por Luís Osório
publicado em 12
Nov 2014 in
(Jornal) i online
Lembro-me de ter
pensado que só havia duas possibilidades: ou ajudava a revolucionar a justiça
ou incendiava Roma; não existiria meio-termo para Paula Teixeira da Cruz. À
partida gosto das pessoas que ousam e dividem águas, e reconheço na ministra da
Justiça essas qualidades.
Avançou para a
reforma do mapa judiciário, foi aliada da troika na urgência de melhorar a
situação das dívidas por cobrar nos tribunais, "meteu-se" e
irritou-se (por vezes ao mesmo tempo) com juízes, advogados, jornalistas,
ordens, sindicatos, populações e quem mais aparecesse. Fundiu direcções-
-gerais e desmembrou equipas, entre as quais a que em Coimbra tinha como
caderno de encargos o acompanhamento dos temas informáticos, incluindo o
Citius.
Pelo meio, contra
a opinião de muitos, fez força para que Joana Marques Vidal fosse escolhida
para procuradora- -geral da República. Ganhou a batalha e a filha de José
Marques Vidal alcançou o lugar mais alto na pirâmide da justiça. Aplaudi a
decisão, escrevi que à PGR chegava uma mulher livre, de mãos limpas e de uma
linhagem de coragem.
Só que o Diabo
está nos detalhes, o que deveria ser do conhecimento de todos os que têm ou
exercem cargos de poder. Para uma mulher que não liga a pormenores, que gosta
de ter conversas acerca dos grandes temas, que se esquece das horas e partilha
livros com os amigos apenas por julgar que mais pessoas devem pensar no que é
essencial e não nas pulhices e mediocridades, para uma mulher assim não caberia
na cabeça ser apanhada na curva por causa de um sistema informático.
Não lembra a
ninguém, mas foi o que aconteceu. O impacto poderia ter sido atenuado se
tivesse apoios; não os tem. Porventura a ministra pensou que não era uma
coincidência: deixou então escapar, ou alguém por ela, que dois agentes da PJ,
com uma possível ligação a Maria José Morgado, estariam por detrás desta
loucura. Assunto enviado para a PGR. A procuradora abriu um inquérito e
rapidamente, em 15 dias, o veredicto tornou-se público: os homens estavam
inocentes do colapso do Citius.
O que simplificou
o assunto, ou a ministra acredita que não há coincidências e tenta descobrir os
pistoleiros que arrasaram o saloon ou então, por muito que lhe custe, terá de
abandonar de fininho a mesa de jogo. A situação não é a mesma que a de Nuno
Crato. A saída da ministra criaria um problema grave a Passos Coelho; só um
manga- -de-alpaca poderia aceitar ser ministro por um ano numa pasta como a da
Justiça. O que não acontece com a da Educação, em que a continuidade por mais
um ano lectivo é um comboio-fantasma que assombra o governo e o país.
A realidade é a
que é. Aliás, o problema da realidade não existirem contas por saldar e dívidas
por cobrar - uns mais que outros, todos as temos. O problema é não as saldarmos
em devido tempo, é o arrastarmos problemas com a ideia de que se resolvem por
si, é a esperança de que o tempo seja o melhor dos conselheiros e de tudo
acabar por se atenuar. Infelizmente, quase nunca acontece. Com o tempo crescem
sim feridas que raramente deixam de sangrar. E o Ministério da Justiça é uma
ferida a céu aberto. Pode ser que sare. Há sempre quem acredite em milagres.
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