terça-feira, 11 de novembro de 2014

O diabo de Paula Teixeira da Cruz. Para uma mulher assim, não caberia na cabeça ser apanhada na curva... Por Luís Osório


O diabo de Paula Teixeira da Cruz
Para uma mulher assim, não caberia na cabeça ser apanhada na curva...
Por Luís Osório
publicado em 12 Nov 2014 in (Jornal) i online

Lembro-me de ter pensado que só havia duas possibilidades: ou ajudava a revolucionar a justiça ou incendiava Roma; não existiria meio-termo para Paula Teixeira da Cruz. À partida gosto das pessoas que ousam e dividem águas, e reconheço na ministra da Justiça essas qualidades.

Avançou para a reforma do mapa judiciário, foi aliada da troika na urgência de melhorar a situação das dívidas por cobrar nos tribunais, "meteu-se" e irritou-se (por vezes ao mesmo tempo) com juízes, advogados, jornalistas, ordens, sindicatos, populações e quem mais aparecesse. Fundiu direcções- -gerais e desmembrou equipas, entre as quais a que em Coimbra tinha como caderno de encargos o acompanhamento dos temas informáticos, incluindo o Citius.

Pelo meio, contra a opinião de muitos, fez força para que Joana Marques Vidal fosse escolhida para procuradora- -geral da República. Ganhou a batalha e a filha de José Marques Vidal alcançou o lugar mais alto na pirâmide da justiça. Aplaudi a decisão, escrevi que à PGR chegava uma mulher livre, de mãos limpas e de uma linhagem de coragem.

Só que o Diabo está nos detalhes, o que deveria ser do conhecimento de todos os que têm ou exercem cargos de poder. Para uma mulher que não liga a pormenores, que gosta de ter conversas acerca dos grandes temas, que se esquece das horas e partilha livros com os amigos apenas por julgar que mais pessoas devem pensar no que é essencial e não nas pulhices e mediocridades, para uma mulher assim não caberia na cabeça ser apanhada na curva por causa de um sistema informático.

Não lembra a ninguém, mas foi o que aconteceu. O impacto poderia ter sido atenuado se tivesse apoios; não os tem. Porventura a ministra pensou que não era uma coincidência: deixou então escapar, ou alguém por ela, que dois agentes da PJ, com uma possível ligação a Maria José Morgado, estariam por detrás desta loucura. Assunto enviado para a PGR. A procuradora abriu um inquérito e rapidamente, em 15 dias, o veredicto tornou-se público: os homens estavam inocentes do colapso do Citius.

O que simplificou o assunto, ou a ministra acredita que não há coincidências e tenta descobrir os pistoleiros que arrasaram o saloon ou então, por muito que lhe custe, terá de abandonar de fininho a mesa de jogo. A situação não é a mesma que a de Nuno Crato. A saída da ministra criaria um problema grave a Passos Coelho; só um manga- -de-alpaca poderia aceitar ser ministro por um ano numa pasta como a da Justiça. O que não acontece com a da Educação, em que a continuidade por mais um ano lectivo é um comboio-fantasma que assombra o governo e o país.


A realidade é a que é. Aliás, o problema da realidade não existirem contas por saldar e dívidas por cobrar - uns mais que outros, todos as temos. O problema é não as saldarmos em devido tempo, é o arrastarmos problemas com a ideia de que se resolvem por si, é a esperança de que o tempo seja o melhor dos conselheiros e de tudo acabar por se atenuar. Infelizmente, quase nunca acontece. Com o tempo crescem sim feridas que raramente deixam de sangrar. E o Ministério da Justiça é uma ferida a céu aberto. Pode ser que sare. Há sempre quem acredite em milagres.

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