quinta-feira, 13 de novembro de 2014

Juncker ensaia uma fuga para a frente. Acossado pelo escândalo do Luxemburgo, Juncker promete uma revolução fiscal.


EDITORIAL
Juncker ensaia uma fuga para a frente
DIRECÇÃO EDITORIAL 12/11/2014 - PÚBLICO

Foi na semana passada que vários jornais denunciaram a existência de acordos fiscais secretos estabelecidos entre o Luxemburgo e 340 multinacionais, à margem dos interesses dos restantes países europeus. Na altura em que foram firmados esses acordos, Jean-Claude Juncker era primeiro-ministro do Luxemburgo.

O agora presidente da Comissão Europeia esteve uma semana mudo e calado e ontem, de uma forma surpreendente, veio quebrar o silêncio para vir prometer uma revolução fiscal e uma espécie de harmonização dos impostos a nível europeu. E chegou ao ponto de dizer que este pacto fiscal deveria ser levado a nível do G20. É o que se chama "fuga para a frente". Juncker reconhece que as práticas fiscais no Luxemburgo, não sendo ilegais, beliscam os patrões éticos e morais, mas daí não tira nenhuma ilação ou consequência política.

Acossado pelo escândalo do Luxemburgo, Juncker promete uma revolução fiscal
MARIA JOÃO GUIMARÃES 12/11/2014 - PÚBLICO
Presidente da Comissão Europeia e antigo primeiro-ministro do Luxemburgo parte para a ofensiva e rompe o silêncio depois de acusações de ter permitido que o seu país se tornasse um paraíso fiscal.

Jean-Claude Juncker, presidente da Comissão Europeia, acabou de passar uma semana num incómodo silêncio sobre o caso que arrisca abalar o seu recém-iniciado mandato – de que o Luxemburgo tinha permitido uma série de acordos especiais com empresas que ali pagaram menos impostos do que nos seus países de origem.

Depois de uma demora a reagir, o recém-empossado presidente da Comissão Europeia partiu para o ataque, apresentando-se como alguém que vai liderar uma campanha europeia contra a evasão fiscal e os regimes especiais que permitem às empresas pagar menos impostos.

Perante a pergunta óbvia de um jornalista que questionou porque deverá alguém acreditar em Juncker, que liderou o Luxemburgo na época em que este serviu de paraíso fiscal para tantas empresas (mais de 340, segundo a investigação do consórcio internacional de jornalistas), Juncker respondeu secamente: “Porque eu digo que sim.”

Juncker defendeu o Luxemburgo dizendo que oferecer condições fiscais melhores a empresas estrangeiras, raramente de forma transparente, era “uma prática bem estabelecida” em 22 dos 28 membros da União Europeia. O “estado de coisas” que levou ao caso luxemburguês deve-se, acrescentou, ao facto de os Estados-membros terem sistemas fiscais “diametralmente opostos”, que podiam levar a resultados “que não estão de acordo com padrões éticos e morais”.

O modo de acabar com isto é aprovar legislação europeia que se aplique a todos os países, disse Juncker – algo que ele apoia desde 1991. Para isso seria necessária a aprovação de todos os 28, o que até agora nunca aconteceu.

O presidente da Comissão Europeia diz que irá retomar uma proposta para transparência fiscal com os governos a partilharem entre si condições especiais de impostos que ofereçam, acabando com a possibilidade de empresas multinacionais procurarem entre vários países qual o que lhes oferece as condições mais favoráveis, não só a nível europeu mas também do G20 (o grupo das 20 maiores economias do mundo), que se reunirá neste fim-de-semana na Austrália. Juncker defendeu ainda uma proposta para um método de cálculo de rendimento de empresas que dificulte tentativas de empresas para jogar com as jurisdições de impostos de vários países.

Propostas de harmonização fiscal têm contado com a oposição veemente de alguns Estados-membros como, lembra a emissora noticiosa Bloomberg, o Reino Unido ou a Irlanda.

A Comissão Europeia estava já a investigar o Luxemburgo por concessões fiscais feitas à Amazon e a uma subsidiária da Fiat. Mas a revelação de que o país tinha ajudado centenas de empresas a “canalizar centenas de milhares de milhões de dólares através do Luxemburgo e a poupar milhares de milhões de dólares em impostos” vai muito para além disso.

O que era feito não é crime: tecnicamente respeita a lei. São esquemas – “planeamento fiscal”, oferecido por bancos e consultoras financeiras aos seus clientes – que abusam dos métodos legais que permitem diminuir a carga tributária sobre as empresas. No caso do Luxemburgo, diz a investigação dos jornalistas, algumas empresas chegaram a conseguir ter apenas 1% de carga fiscal.


Juncker, que foi ministro das Finanças antes de chefiar o Governo do Luxemburgo nos últimos 18 anos, disse que pode ser considerado “politicamente responsável”, mas ao mesmo tempo afirmou: “Não sou o arquitecto do modelo luxemburguês porque não há modelo luxemburguês.”

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