Ex-Presidente francês Nicolas
Sarkozy detido para interrogatório
MARIA JOÃO
GUIMARÃES 01/07/2014 – PÚBLICO
O ex-Presidente
francês Nicolas Sarkozy foi detido nesta terça-feira para ser interrogado por
investigadores anticorrupção, algo sem precedentes numa investigação a um
antigo Presidente em França. Sarkozy é suspeito de “tráfico de influência” e
“violação do segredo de justiça”. A imprensa francesa fala da suspeita de
existência de uma “rede de informadores” que mantinha Sarkozy e o seu advogado
a par dos desenvolvimentos de processos judiciais contra si.
Sarkozy, 59 anos,
compareceu perante os investigadores em Nanterre, perto de Paris, para o interrogatório
desta terça-feira pelas 8h de Paris (menos uma hora em Lisboa), e ficou sob
custódia judicial. Pela lei, pode ficar detido para interrogatório por um
período de 24 horas com uma possível extensão por mais um dia. No entanto,
ninguém espera que durma na prisão – os investigadores deverão suspender a
medida para que passe a noite em casa.
No dia anterior,
o advogado do antigo Presidente, Thierry Herzog, e dois altos magistrados foram
também detidos e interrogados por suspeitas de tráfico de influência e violação
do segredo de justiça, segundo a agência francesa AFP. Estes continuaram
detidos.
A investigação
começou no início do ano passado, quando foram ordenadas escutas a Sarkozy no
âmbito do caso de suspeitas de financiamento ilegal de 50 milhões de euros para
a campanha presidencial de 2007 pelo então ditador líbio, Muammar Khadafi. Estas
escutas já foram um passo inédito contra um antigo Presidente.
Os investigadores
aperceberam-se então de que Sarkozy tinha informações sobre o processo líbio
(que ainda decorre) e ainda sobre outro caso de possíveis irregularidades, de
verbas dadas ao seu partido pela herdeira da L’Oréal, Liliane Bettencourt (caso
entretanto encerrado com Sarkozy ilibado). O jornal Le Monde diz que, nas
conversas escutadas, Sarkozy se refere mesmo a alguém bem colocado que lhe
daria informações no âmbito do processo líbio.
Suspeita-se de
que Sarkozy tenha sido alertado para o facto de o seu telefone estar sob
escuta. O ex-Presidente e o seu advogado compraram discretamente telefones sob
nomes falsos (Sarkozy era Paul Bismuth), através dos quais terão chegado a
combinar conversas para terem no telefone que sabiam ser escutado.
Sarkozy, pensam
ainda os investigadores, terá ainda prometido um cargo de prestígio no Mónaco a
um dos altos magistrados agora interrogados, Gilbert Azibert, em troca de
informação sobre o caso Bettencourt.
A investigação
deverá ainda esclarecer outra suspeita, de que Azibert teria não só passado
informação como teria tentado beneficiar o ex-Presidente numa decisão sobre se
a manutenção nas mãos da Justiça das agendas de Sarkozy investigadas no âmbito
do caso Bettencourt era ilegal por contrariar a imunidade presidencial (que se
mantém para acções levadas a cabo durante a presidência, mesmo que o Presidente
já não tenha o cargo). As agendas seriam úteis nos casos do alegado
financiamento líbio e ainda num outro envolvendo o empresário Bernard Tapie e a
então ministra das Finanças, agora directora do FMI, Christine Lagarde.
A Justiça acabou
no entanto por decidir, contra a opinião de Azibert, que as agendas poderiam
ser usadas nos outros processos.
Acção sem
precedentes visa determinar se o antigo Presidente francês tentou obter acesso
a informação sobre uma investigação judicial relativa a financiamento de
campanha.
Recentemente
abriu mais uma investigação ao antigo Presidente, esta sobre alegadas
irregularidades no financiamento da sua campanha eleitoral de 2012, em que foi
derrotado pelo actual Presidente, François Hollande.
Apesar de vários
políticos franceses se terem envolvido em casos de corrupção e utilização
ilícita de verbas, a imprensa francesa nota que é a primeira vez que um antigo
Presidente está sob custódia policial, ainda que apenas para ser interrogado –
tal como não se sabe de nenhum caso de escutas telefónicas feitas a um antigo
Presidente (a instituição é reverenciada e a imunidade presidencial é forte). Jacques
Chirac, por exemplo, chegou a ser condenado já depois de deixar a Presidência
da República, por um escândalo de corrupção enquanto era presidente da câmara
de Paris. A pena de prisão de 2011 foi suspensa e Chirac nunca chegou a ser
detido.
Tudo isto
acontece quando Sarkozy, que foi Presidente de 2007 a 2012, se prepararia
para voltar à liderança do seu partido UMP (conservador) em Outubro e concorrer
de novo à presidência em 2017, com sondagens a mostrar que é mais popular do
que Hollande. Isto leva os seus apoiantes a dizer que a campanha é motivada
politicamente. Christian Estrosi, presidente da câmara de Nice, escreveu na sua
conta do Twitter: “Nunca nenhum antigo Presidente foi vítima de tal tratamento,
de tanto ódio.”
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