Líderes fracassam na escolha dos
cargos europeus
A Rússia tornou-se num tema muito sensível da política externa europeia.
Decisões adiadas para Agosto
Teresa de Sousa /
18 jul 2014 / PÚBLICO
Cumpriu-se o cenário
que recolhia quase todas as apostas: os líderes europeus adiaram para final de
Agosto a escolha dos nomes que vão chefiar as principais instituições
europeias. A chanceler alemã tinha avisado que a decisão teria de ser global,
afastando a possibilidade de decidir apenas da substituição de Lady Ashton à
frente da diplomacia europeia.
A
alta-representante também é a primeira vice-presidente da Comissão. Mas a questão
não era apenas de cumprir o princípio segundo o qual nada está negociado até
tudo estar negociado. As posições dos governos estavam muito distanciadas para
permitir um compromisso e faltavam nomes que se impusessem por si.
Antes do início
da cimeira, atrasado de quase duas horas, sucederam-se encontros bilaterais que
não chegaram para gerar consensos, mas que permitiram aos mais altos
responsáveis europeus levar para casa matéria para digerir. As negociações para
escolher os responsáveis pelas instituições europeias sempre foram um exercício
difícil. Há equilíbrios a preservar, entre grandes e pequenos, entre famílias
políticas, entre leste e oeste (desde 2004).
A entrada em
vigor do Tratado de Lisboa (2009) acrescentou mais dois cargos importantes: o presidente
do Conselho Europeu e o chefe da diplomacia. A crise do euro abriu mais uma
brecha, entre devedores e credores e voltou a dar ao Eurogrupo (ministros das
Finanças dos países que fazem parte da união monetária) uma enorme relevância,
incluindo a escolha de quem o preside. Desta vez, o Parlamento Europeu, com
poderes reforçados também pelo Tratado de Lisboa, quer exercer uma vigilância
maior. Exige uma nova Comissão com muitos mais rostos femininos, ameaçando não
a investir, se não cumprir este critério.
Mesmo assim, há
coisas que já se sabem. A chanceler e o Presidente francês deixaram claro que o
posto de chefe da diplomacia seria para uma mulher de centro-esquerda. Matteo
Renzi apostou o seu sucesso europeu na indigitação da sua ministra dos Negócios
Estrangeiros, Frederica Mogherini, que cumpre as duas condições. Mas o seu nome
gerou uma polémica, não tanto pela aparente falta de experiência da candidata,
mas porque a Rússia se tornou num tema muito sensível da política externa
europeia.
Os países de
leste rejeitam alguém que vem de um país que defende uma política de maior
tolerância em relação a Vladimir Putin. Renzi já respondeu que a sua posição
não é diferente da de Angela Merkel — ambos consideram que se trata de uma
relação estratégica. As duas outras alternativas, a comissária búlgara
Kristalina Georgieva, preferida de Jean-Claude Juncker, ou o chefe da
diplomacia polaca, Radeck Sikorski (um nome com peso), podem ser excluídas,
pois ambos pertencem ao centro-direita. E pode aparece um candidato-surpresa
que consiga fazer a ponte entre as duas posições.
Mais complicada
ainda parece ser a escolha de quem vai substituir Herman van Rompuy. Há muitos
nomes de muitos primeiros-ministros ainda em funções. Mas nenhum deles chegou a
apresentar a sua candidatura, porque ninguém se arrisca a avançar para depois
ter de recuar, se perder a corrida. Acresce que a chanceler e outros chefes de
governo de centro-direita não vêem como óbvia a atribuição do cargo a um
socialista, ao contrário dos líderes de centro-esquerda, que acham que o lugar
também é seu.
O critério menos relevante
Há algumas
considerações a ter em mente para tentar antecipar o que pode acontecer no
final de Agosto. A primeira é que, daqui a um mês, os governos podem chegar a
Bruxelas com nomes muito diferentes no bolso, para tentar superar as
divergências que ficaram explícitas. Do mesmo modo, a repartição das pastas
mais importantes da Comissão (ligadas à economia) também não será fácil. A
missão mais difícil e mais importante de Juncker é recuperar a capacidade de
liderança da Comissão, muito desgastada nestes anos de crise. Em algumas
capitais atribui-se esse desgaste a uma estrutura ingerível de 28 comissários
para 28 pastas. Alguns países, sobretudo os grandes, querem mudar a orgânica do
executivo, de forma a haver comissários “seniores” para supervisionar as
grandes áreas e comissários “juniores” para funções mais específicas dentro de
cada área. Nem Portugal, nem a maioria dos pequenos países quer ouvir falar de
tal coisa, embora a ideia já esteja contida no Tratado de Lisboa.
Finalmente, uma
última lição. Quem pensou que esta crise profunda levaria os líderes europeus a
apostar, ao contrário do que fizeram em 2009, em nomes politicamente fortes
desengane-se. O critério da competência e do reconhecimento, se for utilizado,
continuará a ser o menos relevante.
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