Um tempo de vários blocos à
esquerda
Na Grécia, o Syriza agregou. Aqui estamos no tempo da desagregação
Por Ana Sá Lopes
publicado em 14
Jul 2014 i (jornal) i online
O Bloco de
Esquerda foi um cozinhado miraculoso: conseguir juntar a UDP ao PSR, mexer
energicamente, acrescentar os ex-comunistas da Política XXI e depois agitar bem
e ter a capacidade de institucionalizar um partido que chegou a eleger 16
deputados – como aconteceu nas legislativas de 2009 – foi um acontecimento
extraordinário na política portuguesa.
Há várias razões
na origem do sucesso: um discurso que rompia com os “mêmes” da esquerda
comunista tradicional, incomporando causas que depois ficaram conhecidas como
“fracturantes”; um renascer da esperança numa renovação de rostos e de métodos
incompatíveis com o PCP da época. O Bloco conseguiu captar jovens quadros que
queriam participar politicamente mas para quem o PCP era “velho” – e a sua
morte anunciada. Um desses quadros é Ana Drago, que agora se desvincula, e à
sua corrente, do Bloco de Esquerda.
A tensão que leva
agora Ana Drago a romper com o Bloco é antiga e remonta muito antes da nova
direcção João Semedo-Catarina Martins. Só que essa tensão conseguiu ser gerida,
com altos e baixos, por Miguel Portas – e às vezes, ao contrário do
continuamente propagado, existem pessoas insubstituíveis. Que faria Miguel
Portas, se fosse vivo? Esta é a pergunta que está na cabeça de muitos os que se
interessam pelo rumo do Bloco de Esquerda.
As duas
principais tensões que existem no Bloco são eminentemente políticas: coloca-se
o partido numa posição de negociar um acordo parlamentar ou coligação com um
governo PS (o que, aliás, Miguel Portas defendia) ou o Bloco afasta--se disso? Até
aqui, vingou essa impossibilidade. A reaproximação ao PCP encetada há bastante
tempo – a reunião de sexta-feira foi mais um episódio importante – é uma
escolha que inviabiliza qualquer colagem ao PS. Este bloco (onde está a
direcção) percebe que o BE falhou na capacidade de se constituir como
alternativa na crise a um partido muito velho e com muita experiência em
crises, como o PCP.
O sucesso
relativo do “Livre” nas europeias aumentou a pressão entre os que dentro do
Bloco defendem a aproximação ao PS. É muito provável que estes que agora
abandonam o Bloco de Esquerda se preparem para concorrer às próximas eleições
legislativas em coligação com o “Livre” – se António Costa, entretanto, no meio
dos seus pisca-piscas à esquerda, não arrebanhar vários dirigentes e
apoiantes.
Ficamos, assim,
com dois blocos: o bloco mais próximo do PCP e o bloco que o PS, se quiser ou
precisar, pode ir buscar para uma coligação nas próximas legislativas. Na
Grécia, o Syriza agregou. Aqui o momento é de desagregar.
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