Operação em Gaza provoca aumento
de ataques anti-semitas na Europa
MARIA JOÃO
GUIMARÃES 22/07/2014 - PÚBLICO
Sinagogas foram
atacadas em França e na Alemanha ouviram-se slogans violentos como não se
ouviam há décadas. Responsáveis da comunidade judaica expressam preocupação.
Slogans
anti-semitas em algumas manifestações pró-palestinianas, violência contra
sinagogas e lojas de produtos kosher, ameaças de morte, ataques a judeus. Aconteceu
em França, Alemanha, ou Reino Unido. A ofensiva de Israel em Gaza está a levar
a acções anti-semitas em alguns países, a maioria levadas a cabo por franjas
extremistas de populações de origem árabe ou muçulmana.
França, onde vive
a maior comunidade judaica a seguir aos EUA e Israel (500 mil pessoas), e a
maior comunidade muçulmana da Europa (entre 3,5 e 5 milhões), é vista como uma
caixa de ressonância do que se passa no Médio Oriente. Mas representantes da
comunidade judaica pedem que não se repliquem as hostilidades. “O conflito em
Gaza acontece no Médio Oriente, e nós somos os judeus de França, não queremos
importar este conflito”, disse Laura Nhari, porta-voz do conselho
representativo das Instituições Judaicas de França, ao New York Times.
Em França, há
quem considere que o factor decisivo foi a proibição de algumas manifestações
pró-palestinianas. “A excepção francesa não foram as manifestações de apoio às
vítimas de Gaza. Essas há em todo o lado, até em Israel”, diz o investigador
Eric Fassin, do Instituto de Investigação Interdisciplinar das Relações
Sociais. “É a proibição de se manifestar.”
Alguns políticos
da oposição dizem o mesmo, enquanto o primeiro-ministro, Manuel Valls,
argumentou que a violência mostrava que a proibição tinha sido necessária. As
autoridades acabaram por autorizar uma manifestação para esta quarta-feira por
os organizadores terem sido considerados “sérios e responsáveis”, segundo o
jornal Le Parisien. Apenas as manifestações da área de Paris foram antes
banidas, várias outras decorreram em muitas cidades sem qualquer incidente.
O anti-semitismo
incomoda também o secretário-geral da Associação de Solidariedade
França-Palestina, Didier Fagart. O responsável refere que a maioria dos cerca
de 300 protestos em 80 cidades francesas promovidos pela associação decorreram
sem qualque rincidente. “Queremos mostrar a dor dos franceses pelo massacre em
curso em Gaza”, disse. “Condenamos qualquer forma de violência e racismo,
incluindo anti-semimismo.”
França tem
especiais preocupações com o anti-semitismo, com a Frente Nacional a ter obtido
vitórias consecutivas nas eleições regionais e europeias e onde um comediante,
Dieudonné, tem sucesso com tiradas abertamente anti-semitas. Apesar da
estratégia de “normalização” de Marine Le Pen, esta por vezes tem sido
comprometida pelo pai, Jean Marie, que ainda recentemente sugeriu “fazer uma
fornada” com críticos do partido de extrema-direita.
Em Sarcelles,
subúrbio de Paris conhecido como “pequena Jerusalém”, foram atacadas uma
farmácia de um judeu e uma loja de produtos kosher, para além do rasto de
destruição deixado pela violência da manifestação proibida – vidros de carros
partidos, etc. “Não dormi de noite, não estava tranquilo”, conta um homem de 67
anos cujo carro foi destruído, que não quis dar o nome, à agência AFP. “As
pessoas ficaram atordoadas, a comunidade judaica tem medo”, disse o presidente
da câmara, François Pupponi.
Políticos
estabeleceram a diferença. “Protestos contra Israel são legítimos”, disse o
ministro do Interior, Bernard Cazeneuve. “Quando se ameaçam sinagogas e quando
se incendeiam mercearias porque o dono é judeu, isso são actos anti-semitas,
isso é intolerável”, sublinhou. Na zona de Paris foram atacadas já oito
sinagogas nas últimas duas semanas.
Na Alemanha, um
imã de uma mesquita de Berlim apelou à “destruição dos judeus sionistas”,
pedindo que fossem “mortos, até ao último”, segundo um vídeo divulgado pelo
diário hebraico Ha’aretz. Em manifestações pró-palestinianas ouviram-se slogans
anti-semitas, como “gaseiem os judeus”, conta a agência norte-americana
Associated Press.
Na imprensa alemã
também surgiram relatos de slogans ofensivos e violentos, como “judeu, porco
cobarde”. O jornal Tagesspiegel não hesitava em escrever que “desde que a época
dos nazis não se ouviam palavras anti-semitas ditas tão abertamente como nas
manifestações de jovens árabes contra o conflito em Gaza”. Ditas em frente da
polícia que, criticava o jornal, “não fez nada”. Ainda em Berlim, um turista
israelita que passava perto da manifestação foi arrastado por um pequeno grupo,
mas salvo pela polícia.
“Nunca nas nossas
vidas pensámos na possibilidade de que este anti-semitismo tão primário se
ouvisse nas ruas da Alemanha”, reagiu Dieter Graumann, presidente do Conselho
Central Judaico do país. No caso alemão, um estudo recente mostrou que a
maioria (60%) das mensagens de ódio anti-semitas enviadas por email ao
organismo vinham de alemães com formação, incluindo professores universitários
(muitos nem hesitavam em usar contas de email em que eram facilmente
identificados), e que apenas 3% vinham de extremistas ou neonazis.
Em Londres, uma
grande manifestação decorreu pacificamente no fim-de-semana, mas uma mulher de
57 anos, judia, relatou um ataque em Oxford Street – ia a falar sobre o
conflito ao telemóvel quando passou pela manifestação, e depois de ter sido
insultada por um grupo de jovens que pareciam ser do Sudeste asiático,
perguntou-lhes porque é que o Hamas disparava rockets contra a sua filha, que
estava em Telavive. Foi perseguida e agredida até ter entrado numa loja. “Como
é que isto acontece em Oxford Street em 2014?” perguntava.
Os ministros dos
Negócios Estrangeiros de França, Alemanha e Itália condenaram, numa declaração
conjunta emitida esta terça-feira, o que dizem ser um aumento do anti-semitismo
nos seus países. “Retórica anti-semita e hostilidade contra judeus, ataques contra
crentes na fé judaica e sinagogas não têm lugar na nossa sociedade”, disseram
os responsáveis.
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