"O poder político pôs-se de joelhos perante a
elite angolana"
RITA BRANDÃO GUERRA 14/01/2014 – in Público
Têm sido limadas arestas para que o poder angolano não se
irrite com as elites portuguesas. A ideia foi defendida pelo jornalista Nicolau
Santos na apresentação do livro Os Donos Angolanos de Portugal.
Vinte e sete ex-governantes portugueses da era democrática,
de ministros dos Negócios Estrangeiros a ministros da Presidência e secretários
de Estado, assumem protagonismo nas relações económicas entre Portugal e
Angola. "O poder político pôs-se de joelhos perante a elite
angolana", resumiu esta terça-feira o jornalista Nicolau Santos, na
apresentação do livro Os Donos Angolanos de Portugal, na Fnac Chiado, em
Lisboa.
Quando Francisco Louçã, Jorge Costa e João Teixeira Lopes
começaram a desenrolar o novelo da burguesia portuguesa para um próximo livro,
concluíram que as ligações económicas entre Portugal e Angola justificavam um
volume isolado. A investigação, parte de um trabalho mais amplo dos mesmos
autores sobre a burguesia portuguesa e que dará origem a outra publicação ainda
este ano, permitiu aos três dirigentes do BE concluir que não há praticamente
nenhum empresário português "relevante" que não esteja ligado a
Angola. E que Portugal tem sido uma espécie de "offshore" ou sector
estratégico para os capitais angolanos.
Na apresentação do livro, Nicolau Santos, que nasceu na
ex-colónia, tal como João Teixeira Lopes, descreveu um Portugal
"permissivo e complacente" com regras de mercado
"flexíveis" para os capitais angolanos, sem paralelo com outro
investimento estrangeiro realizado no país. "Há uma grande ligação, para
não dizer uma grande subserviência da elite portuguesa. O poder político pôs-se
de joelhos perante a elite angolana", disse.
A "hipersensibilidade" do poder de Luanda tem sido
assim tratada com pinças, até pela comunicação social portuguesa, que "já
pensa duas vezes" antes de publicar uma notícia que envolva as altas
esferas angolanas. A ideia de que se têm limado arestas para que o poder de
Luanda não se irrite com as elites em Portugal foi ilustrada pelo jornalista do
Expresso com o recente pedido de desculpas do ministros dos Negócios
Estrangeiros, Rui Machete. “Angola tem explorado isto de maneira quase
exemplar”, disse. E Portugal tem evitado qualquer incidente diplomático que
comprometa o nosso "quarto maior parceiro económico e, no último ano,
provavelmente o maior" .
Este não é, no entanto, dizem, um livro sobre Angola. É uma
tentativa de explorar o poder angolano em Portugal. Jorge Costa explicou o peso
dos interesses angolanos sobre recursos essenciais da economia portuguesa
focados na energia, telecomunicações e banca. “Não há outro caso de um país que
tenha entregue a sua soberania económica como Portugal fez com Angola”, disse.
Mas as ligações têm rostos e, segundo o dirigente do Bloco, se analisados os
currículos empresariais de todos os ministros e secretários de Estado desde o
25 de Abril, há 27 ex-governantes, “alguns de altíssimo peso político”, com um
protagonismo muito importante. São do PS, do PSD e do CDS. E foram ministros ou
secretários de Estado. Estão lá Ângelo Correia, Miguel Relvas, Nogueira Leite, Armando
Vara, António Vitorino ou Nuno Thomaz. E o destaque vai para a banca. Trinta e
dois membros de governos portugueses estão na CGD ou 18 no BCP. “Essa lista
nunca foi elaborada, mas é essencial para compreender a profundidade das
relações políticas e empresariais estabelecidas entre os capitais portugueses e
angolanos”, defendem os autores.
Francisco Louçã, dos três o mais comedido nas palavras,
preferiu sublinhar Os Donos Angolanos de Portugal como o contributo que
escolheria dar para o debate democrático do que é hoje Portugal. “Será muito
polémico, mas dará muita informação”, disse o economista e ex-líder do Bloco.
No fundo, disse, Teixeira Lopes, resume-se sempre a “saber
quem manda”.
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