quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

O tiro ao reformado. Quase 60% dos pensionistas do Estado afectados por duplo corte.

Quase 60% dos pensionistas do Estado afectados por duplo corte


O tiro ao reformado
Por Ana Sá Lopes
publicado em 10 Jan 2014 in (jornal) i online

O problema dos cortes aos reformados vai muito para além do confisco de direitos
O plano B que o governo sempre jurou que não existia para o chumbo das pensões pelo Tribunal Constitucional foi ontem dado à luz pelo conselho de ministros. Confirma-se que não havia plano B: os reformados são a carne para canhão deste governo, o alvo do tiro na guerra do défice, a vítima da revolução que vai extinguir de vez em Portugal e na Europa conceitos políticos antigos como social-democracia e democracia-cristã.

Para o poder em vigor, os contratos com os reformados são aqueles que podem ser alterados à vontade, sem que existam riscos de o Estado ser obrigado a pagar milhões. Com os ricos não se brinca - os governos nunca brincam com os ricos e basta ver as parcerias público-privadas e outros contratos dantescos, impossíveis de mexer porque estão em causa cláusulas inamovíveis. Não é de estranhar que enquanto Passos Coelho afirma que a crise "foi um custo que quase toda a gente teve que suportar pelas medidas difíceis", os últimos números disponíveis indiquem que em Portugal os ricos estão cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres.

Uma vez que não existem "cláusulas" de protecção do contrato realizado entre o Estado e reformados - para surpresa de todos, a Contribuição Extraordinária de Solidariedade passou no ano passado no Tribunal Constitucional - opta-se pela medida mais fácil. Aguarda-se agora a decisão do Tribunal Constitucional, reconhecendo-se que é um facto que a CES passou no TC com a presunção de que era transitória e poupava os menos "ricos".

O problema dos reformados vai para lá do confisco do contrato feito entre o Estado e os cidadãos que nasceram no Portugal de Eusébio - em que praticamente só Eusébio funcionava e dava razões de felicidade. O problema é que são os reformados que estão a fazer de cintura de segurança para os seus filhos e netos desempregados ou com empregos que não dão para a subsistência mínima. Como o i escreve nesta edição, 1/3 da população activa está desempregada ou vive de um sub-emprego que não dá para ter uma casa nem eventualmente dará para comer. Ouvir o primeiro-ministro dizer que está a

"tirar o país da crise" torna-se penoso nestas circunstâncias. Se o emprego criado obriga a recorrer aos pais reformados para subsistir, o ataque aos reformados é também um ataque ao mínimo de coesão social.


Não existe nenhum novo ciclo - existe um triste retorno ao tempo em que Eusébio consolava os agora reformados.

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