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POLÉMICA COM IDA DE JOSÉ LUÍS ARNAUT PARA O GOLDMAN SACHS
Está a gerar polémica
a nomeação do antigo ministro José Luís Arnaut para o conselho consultivo
internacional da Goldman Sachs. O PS fala em confusão entre a política e
negócios. Lembra que o ex-ministro interveio em privatizações como a dos CTT,
em que o Banco é acionista. José Luís Arnaut passa a ser o segundo português,
depois de António Borges, a ocupar um cargo de relevo num dos bancos de
investimento mais poderosos do mundo. Vai substituir Mario Monti,
ex-primeiro-ministro italiano. O jornal "Expresso" adianta que nas
negociações dos swaps com o Estado, a firma de advogados de Arnaut representou
os interesses de bancos como o Goldman Sachs e o JP Morgan. Arnaut foi ministro
no Governo de Durão Barroso, secretário-geral do PSD e é ainda membro do
conselho de administração da REN.
Arnaut, um facilitador.
Por Daniel Oliveira
Segunda feira, 13 de janeiro de 2014 in Expresso online
José Luís Arnaut foi ministro de Durão Barroso e de Santana
Lopes. Anda nos corredores da política há muitos anos, e teve direito, claro
está, a uma comenda. Nos tempos em que parecia que Arnaut se dedicava à
política, era uma espécie de Relvas que sabia ler e escrever. Mais polido do que
o aprendiz de Tomar, dedicou-se a uma das mais antigas profissões das
democracias: fazer uma ponte entre o mundo dos negócios e o Estado, quase
sempre com vantagem clara para o primeiro. Era e continua a ser, usando alguma
liberdade de linguagem, um facilitador.
A Rui Pena & Arnaut, sociedade de advogados de que é um
dos sócios, esteve ligada à privatizações da REN e da ANA e envolvida na
fracassada privatização da TAP. Nunca sendo muito claro de que lado joga, como
foi o caso da REN, onde o escritório tinha como cliente da Rede Elétrica
Nacional e, em simultâneo, participava na elaboração das propostas de lei de
base e diplomas regulamentares do novo enquadramento legislativo nos sectores
da energia. Essa é, aliás, uma das funções destes escritórios: autênticos
órgãos não eleitos de produção legislativa para o Estado, sem qualquer
verdadeira fiscalização de conflitos de interesses. A RPA também participou nas
negociações dos swaps com o Estado e representou os interesses da Goldman e da
JP Morgan.
Resumindo: o escritório de José Luís Arnaut é, com mais um
ou outro, uma placa giratória onde os interesses de alguns políticos mais
ambiciosos e empresários que dependem de decisões do Estado se cruzam, num
emaranhado de cumplicidades em que se perde o rasto de quem representa quem e
mais não se pode fazer do que escrever, com cuidado, em textos como este, o que
toda a gente sabe: que por ali se faz o que a democracia não deveria tolerar.
A ida de José Luís Arnaut para a Goldman Sachs não me choca
rigorosamente nada. Não se pode dizer, desta vez, que alguém mudou de campo. É
apenas a conclusão lógica de toda uma carreira. Fazer lá fora o que já se faz
cá dentro é o que se lhe pedirá, como administrador não executivo daquele
gigante bancário, com participação tão ativa na crise financeira que o mundo
vive hoje. Servir de apoio para os principais clientes em todo o mundo, é o que
fazem estes administradores. Traduzindo para a realidade: sacar das agendas de
contactos e pô-las a render. E a agenda de Arnaut será pequena quando comparada
com a de alguns senhores que lhe farão companhia.
É isso mesmo que lá faz Otmar Issing. O alemão foi, como
membro da Administração do Bundesbank e do Banco Central Europeu, um dos
principais arquitetos dum Euro mal parido e da catastrófica política monetária
europeia. Ou Robert Zoellick, que, depois de trabalhar no Departamento do
Tesouro dos EUA, foi para a Goldman Sachs, da Goldman Sachs para a presidência
do Banco Mundial e do Banco Mundial regressou para a Goldman Sachs. No meio,
trabalhou para a Enron e teve, como representante dos EUA, um papel central nas
negociações para a entrada da China na Organização Mundial de Comércio. Ou Lord
Griffiths, antigo conselheiro de Margaret Thatcher, grande amigo, na política,
dos interesses da banca e autor da ideia de que devemos "tolerar a
desigualdade [promovida pelos brutais bónus dados aos banqueiros] como uma
forma de atingir a maior prosperidade para todos".
Mas os caminhos paralelos dos organismos públicos, da
burocracia europeia e internacional e da Goldman Sachs são tantos que um texto
não chegaria. Basta lembrar Peter Sutherland, ex-procurador-geral irlandês,
comissário europeu para a concorrência e com um papel central no vergonhoso
resgate à banca irlandesa. Homem que foi diretor não executivo do Royal Bank of
Scotland, até este colapsar e ser, claro, nacionalizado. Chegou a diretor não
executivo da Goldman Sachs. Ou Mario Draghi, atual presidente do Banco Central
Europeu. Antes de regressar ao Banco de Itália foi, entre 2002 e 2005,
vice-presidente da Goldman Sachs. Ou o falecido António Borges, que foi
responsável do FMI para a Europa e conselheiro do governo português para as
privatizações (algumas das que Arnaut também participou). Foi vice-presidente
da Goldman Sachs. Ou Mario Monti, primeiro-ministro italiano nunca eleito (e
que, depois, nas urnas, não conseguiu mais do que 10%). Foi conselheiro sénior
da Goldman Sachs. Ou Petros Christodoulou, que, à frente Banco Nacional da
Grécia (privado), e com a ajuda da Goldman Sachs, participou num esquema para
esconder o défice do Estado antes da crise rebentar. Começou a sua carreira na
Goldman Sachs e a última vez que ouvi falar dele estava à frente da agência
governamental da dívida pública grega.
Resumindo: em todos os momentos fundamentais na desregulação
económica e financeira do mundo e da Europa e na transformação do projeto
europeu no monstro que hoje conhecemos encontramos gente da Golman Sachs.
Generais, como Otmar Issing, Zoellick, Griffiths, Draghi ou Monti. Ou soldados,
como Arnaut. Porque um dos ramos fundamentais da atividade deste colosso é a
compra da democracia, pondo os Estados a decidir contra os seus próprios
interesses, roubando o sentido do nosso voto e entregando o poder que deveria
ser do povo a quem tem dinheiro para o pagar. São um verdadeiro partido
invisível, um poder acima das nações que regula as nossas vidas
independentemente das nossas vontades. Privatiza o que é nosso, vende lixo aos
Estados, armadilha leis, governa em favor de poucos e premeia quem lhe preste
vassalagem.
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