Portugal leva proposta a Bruxelas para exportar
energia renovável para a UE
Governo quer prioridade para investimento nas
interligações da Península ao resto da Europa e calcula que o país tem um
potencial eólico quatro vezes superior à sua capacidade actual
A União Europeia não
conseguirá atingir as novas metas de clima e energia para 2030, a custos suportáveis
para os consumidores, se não comprar energia renovável a Portugal e Espanha,
países mais abundantes em vento e sol e, por isso, mais baratos para produzir.
É este o motivo de base que o Governo português apresenta para a proposta
inédita que enviou esta semana à Comissão Europeia e que pode levar o país a
tornar-se exportador de energia renovável para a UE.
Lurdes Ferreira / 17 jan 2014 / Público
Terça-feira passada, o ministro do Ambiente e da Energia,
Jorge Moreira da Silva, enviou aos comissários europeus com as respectivas
áreas uma carta em que propõe uma meta vinculativa de 25% de capacidade de
interligação das redes eléctricas entre todos os Estados-membros até 2030. “É
um assunto prioritário”, diz, dada “a necessidade de transferência física,
entre Estadosmembros, da electricidade produzida de fontes renováveis”, a
custos eficientes.
A meta defendida significa, na prática, que a UE deve ter
“autoestradas” de electricidade com espaço suficiente para deixar circular 25%
da capacidade de produção instalada em todo o seu território dentro de 16 anos.
Como meta intermédia para 2020, defende 12% e, “no muito curto prazo”, 10%. “Se
a política europeia para 2030 quer impulsionar o uso de energias renováveis,
isto significa que precisamos de um roteiro” para as interligações, escreve o
ministro.
Nos últimos meses de negociações para o novo pacote Clima e
Energia 2030, o Governo português tem defendido a adopção de uma quarta meta
vinculativa, em cimeiras de chefes de Governo e de Estado da UE e da OCDE, de
forma a que o assunto deixe de ser uma preocupação apenas portuguesa e
espanhola a passe a ter âmbito comunitário.
Em Dezembro passado, na votação do relatório do Conselho de
Energia sobre o Mercado Interno de Energia, Portugal chegou a ameaçar veto, por
o documento nada propor quanto ao atraso crónico na interligação entre a
Península Ibérica e a França. A Península Ibérica era apenas retratada como a
“excepção” na lista de projectos de interesse comum da UE e que não atingiria a
meta no prazo previsto. No final, a versão aprovada mostra que os Vinte e Oito
concordaram que “deve ser dada prioridade aos Estados-membros que estão mais
longe de atingir a meta”, requerendo-se “investimento significativo” nestas
infra- estruturas.
Outra carta que os ministros da Economia, Energia e Ambiente
de oito países da UE escreveram em vésperas de Natal, entre os quais a
Alemanha, França, Itália e Portugal, em defesa de metas ambiciosas para o
consumo de energia renovável (40%), também refere por duas vezes a necessidade
de “aumentar a capacidade de interligações” para que os compromissos sejam
cumpridos.
Nas metas actuais, que constam da chamada lista de Projectos
de Interesse Comum (PCI) que define as redes transeuropeias prioritárias para a
UE, o objectivo de interligação da Península Ibérica é de apenas 4%,
encontrando- se em 1,6% neste momento. Portugal considera-a insuficiente para a
ambição das metas de clima e energia que têm sido discutidas, apesar de o
acordo vir longe.
Na missiva de terça-feira, o Governo reafirma que está do
lado das metas mais exigentes para 2030: redução das emissões domésticas de
dióxido de carbono em 40%, em relação a 1990, 40% do consumo de energia a
partir de fontes renováveis, 30% de aumento de eficiência energética, a que
junta a quarta meta, de 25% nas interligações.
Os primeiros cálculos de que o Governo dispõe, segundo
apurou o PÚBLICO, dizem apenas respeito ao potencial eólico adicional. Estes
indicam que Portugal tem condições naturais para ter quatro vezes mais capacidade
instalada do que a actual (de 5 gigawatts (GW) para 20), e Espanha tem
potencial para cinco vezes mais (de 25 GW para 100 GW), de acordo com dados
desenvolvidos pela Direcção-Geral de Energia e Geologia e pela Agência
Portuguesa do Ambiente.
Com o estrangulamento histórico que impede a circulação de
energia eléctrica da Península Ibérica para França, e daí para o resto da
Europa, Portugal pede aos seus parceiros europeus que levem a sério este
assunto, ao fim de décadas perdidas a que a França resistiu. Os novos
corredores de electricidade para a Europa podem também atrair investimento,
empresas e emprego.
Interesses distintos
A discussão sobre a quantidade e a ambição das metas
vinculativas do novo pacote de clima e energia, que vão de 35% a 40%, têm
dividido os países e a Comissão Europeia. Países como a Polónia e o Reino Unido
defendem apenas uma meta, de modo a terem margem de manobra para explorar
carvão e gás xistoso. Os ingleses alegam ainda que as novas linhas de alta
tensão vão encarecer a energia eléctrica. Às três metas tradicionais que estão
em cima da mesa — redução das emissões de CO2, consumo de energia de fontes
renováveis e eficiência energética —, Portugal acrescentou à discussão uma
quarta: 25% de capacidade de interligação eléctrica.
A Comissão deverá divulgar o Livro Branco do Pacote Clima e
Energia 2030 no próximo dia 22 de Janeiro, mas tudo fica para mais tarde, para
o executivo comunitário que se segue, tendo pela frente cerca de dois anos de
negociação até as novas metas chegarem a lei.
Em
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Quase 60% da electricidade consumida em 2013 foi de
origem renovável
MARISA SOARES 14/01/2014 – in Público
Meteorologia explica aumento
do peso das renováveis no consumo de energia eléctrica.
Portugal bateu recordes em 2013 no que toca à energia
renovável: 58,3% da energia eléctrica consumida no ano passado foi produzida
por fontes renováveis, o que representa um aumento de 20% em relação ao ano
anterior. Esta variação permitiu diminuir a electricidade importada em 2,8
vezes, segundo a Quercus.
A associação ambientalista, que cita os dados mais recentes
da produção de electricidade em Portugal Continental publicados pela Redes
Energéticas Nacionais (REN), nota que, considerando apenas a produção nacional,
a contribuição das renováveis chegou ao “valor recorde” de 61,7% da
electricidade consumida.
A diferença entre os valores de 2012 e de 2013 está
relacionada com a meteorologia: 2012 foi um ano muito seco, 58% abaixo da
média, segundo a Quercus. Em contrapartida, 2013 foi “relativamente húmido”,
17% acima da média. Por isso, a produção de electricidade renovável da grande
hídrica, com recurso às barragens, mais do que duplicou no ano passado.
Também o vento soprou mais forte em 2013, levando a um
aumento de quase 20% na produção de electricidade a partir desta fonte. “Na
fotovoltaica, o aumento da capacidade instalada permitiu um aumento de 25% em
relação a 2012, apesar de ainda não ter atingido 1% do consumo, o que revela um
enorme potencial de crescimento”, nota a Quercus, num comunicado assinado
também pela Associação Portuguesa de Energias Renováveis (Apren).
Nessa nota, Francisco Ferreira, coordenador do grupo de
energia e alterações climáticas da Quercus, sublinha que a aposta nas energias
renováveis e na eficiência energética “permite a recuperação da economia sem
onerar o ambiente”, pelo que defende a continuação da aposta neste sector. “É
preciso um investimento na sensibilização e um planeamento adequado do sector
energético também em prol de uma desejável política climática exigente",
defende.
António Sá da Costa, presidente da direcção da Apren, também
citado no comunicado, salienta que, além da diminuição das importações de
combustíveis fósseis e de emissão de gases com efeitos de estufa, o reforço do
peso das renováveis na electricidade consumida “possibilitou estabilizar o
preço deste bem, o que também é positivo para ajudar Portugal a sair da crise”.
Segundo as duas associações, a aposta nas renováveis
permitiu poupar cerca de 850 milhões de euros em 2013: 806 milhões de euros na
importação de combustíveis fósseis (gás natural e carvão) e 40 milhões de euros
em licenças de emissão de dióxido de carbono (CO2).
Entre 2012 e 2013 verificou-se uma redução nas emissões de
CO2 na ordem das 2,3 milhões de toneladas, refere a nota. Deste total, um
milhão de toneladas deve-se à redução do recurso às centrais a carvão.
Este aumento do peso das renováveis no consumo de energia
tem, porém, outro lado menos positivo para os consumidores, que este ano vêem
aumentar as tarifas eléctricas em 2,8% (ou em 1% para os consumidores com
tarifa social). Isto porque a produção de electricidade de origem renovável em
regime especial (toda a renovável à excepção das grandes barragens) - que tem
prioridade na entrada na rede - aumentou mais do que o previsto (chegou aos 32%
em Portugal Continental, mais 5% do que em 2012), fazendo disparar os custos
com as energias eólica e hídrica, co-geração e gás natural em 2013, e
contribuindo para um aumento do défice tarifário, que deverá chegar aos 4,4 mil
milhões de euros no final de 2014, segundo os cálculos da Entidade Reguladora
dos Serviços Energéticos.
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