sábado, 6 de setembro de 2014

Uma vitória da justiça, por Luís Rosa.


Uma vitória da justiça
Por Luís Rosa
publicado em 6 Set 2014 in (jornal) i online

A pena aplicada a Armando Vara é um símbolo de mais uma derrota da impunidade
Ontem foi um bom dia para quem acredita na justiça. O tribunal de Aveiro demonstrou ao país que não se intimidou com o poder e a influência dos arguidos sentados no banco dos réus e condenou todos eles a penas pesadas que ficarão na história da nossa democracia. Pela simples razão de que demonstram que a impunidade teve mais uma derrota. Ainda não foi erradicada, mas sofreu um abalo.

A condenação de Armando Vara a cinco anos de prisão efectiva é o símbolo máximo do fim dessa impunidade ligada à influência nefasta que o PS e o PSD conseguiram ter, muitas vezes, junto de diferentes sectores da justiça para protegerem os seus militantes. Vara é o típico apparatchik que teve uma ascensão social e política à custa do cartão partidário, e sempre pensou que o partido, o "seu" partido (que, por acaso, é o PS, mas também podia ser o PSD), iria protegê-lo de tudo e de todos. Da justiça e de todas as instituições que têm como função escrutinar os poderes públicos. A pena de ontem do tribunal de Aveiro demonstra aos aparelhos partidários que o seu poder é limitado. Daí o estado de choque de Vara.

É certo que Manuel Godinho teve uma pena muito dura, de 17 anos e seis meses de prisão efectiva, mas a mesma não tem uma carga simbólica como a de Vara. O sucateiro de Ovar é a metáfora do novo-rico português que foi crescendo à custa de muitas chico-espertices, mas não deixa de ser um homem do povo - e os portugueses sabem perfeitamente que a justiça tem sempre mão dura para com o homem comum. A noção de que os tribunais costumam ter dois pesos e duas medidas, tendo em conta o poder económico e social dos réus, é o maior sentimento de injustiça e descrença que uma sociedade democrática pode ter. Porque passa a mensagem à comunidade de que não vale a pena ser honesto, de que não vale a pena trabalhar no duro e respeitar sempre a lei. O tribunal de Aveiro contrariou ontem essa mensagem e disse: a justiça é igual para todos. Maior acto de credibilização da justiça é impossível.


Os portugueses têm, e com razão, uma má imagem da justiça criminal. É lenta, desequilibrada e desigual. Mas temos de ser justos e constatar uma evolução, nos últimos anos, no combate à criminalidade económico-financeira. Com poucos meios e investimento financeiro ao nível da investigação, a justiça tem melhorado os seus resultados. O cumprimento da pena de prisão por parte de Isaltino Morais, a condenação em primeira instância de um banqueiro como Jardim Gonçalves, a detenção de Ricardo Salgado para interrogatório são alguns exemplos dessa evolução que, ao fim e ao cabo, corresponde a um aprofundamento sólido da nossa jovem democracia. Muito há para fazer. Mas estamos no caminho correcto.

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