Carlos Moedas e a ciência
portuguesa
Por Luís Osório
publicado em 11-9-2014 in
(jornal) i online
A contradição de um comissário que terá o pelouro da ciência e da
investigação
Carlos Moedas não
é um político. Não tem, aparentemente, sede de protagonismo. E a sua imagem é a
de alguém em quem facilmente confiaríamos. Tudo qualidades que, nos tempos que
correm, não são um pormenor. Um burocrata de rosto humano que, afável e zeloso,
recebeu a troika e manteve a compostura durante as várias avaliações dos
cobradores e das oposições. Muito bem.
O
primeiro-ministro ofereceu-lhe o lugar de comissário. Para muitos, uma
surpresa. Juncker, ao que se jura, preferia Maria Luís Albuquerque, mas esta
tornou-se essencial e uma “domadora” de pesadelos, como bem é sublinhado por
António Ribeiro Ferreira hoje no i. As circunstâncias fizeram o resto e o
estrangeirado Carlos Moedas tornou-se um cometa; em três anos passou de ilustre
desconhecido a ilustre senhor da investigação, ciência e inovação na Comissão
Europeia.
O problema é
outro. É de decoro, simbolismo e moral. O governo, no seu balanço entre o deve
e haver, fez coisas boas e outras más, e entre estas, na primeira linha das que
nos farão pagar um alto preço, está o desinvestimento na ciência e na
investigação. Muitas centenas de cientistas tiveram de sair do país, muitos
foram obrigados a suspender as suas colaborações com institutos públicos após
trabalharem anos sem qualquer garantia, muitos estão sem emprego sem direito
sequer a um subsídio de desemprego. Uma delapidação total de património humano
num tempo em que tanto se exalta a competitividade, a inovação, o
empreendedorismo. Um lamentável contra-senso – reforçado por esta escolha de pelouros
do novo comissário português.
Moedas dirá, ou
alguém por ele, que é uma boa notícia para a ciência portuguesa. Uma história
de embalar que se repete sempre que um português ocupa um lugar internacional. Não
significa nada. Somos o que somos. E mesmo quando falamos do que somos dizemos
“os portugueses”, não “nós, os portugueses”. Nada a fazer. Adoramos o que
detestamos, odiamos o que amamos. Temos o sol mas inventámos o fado. Temos
inveja e somos generosos. Somos uma coisa e o seu contrário. É uma marca
genética, traços que nos distinguem dos alemães, dos franceses ou dos ingleses;
ao invés deles, banhados de certezas, temos a arrogância da dúvida permanente. E
temos uma lata desgraçada. E o dinheiro que Moedas irá gerir tem estas marcas. Perguntem a um cientista que ele responderá.
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