Rui Moreira avisa que pode expropriar edifícios para
salvar lojas ameaçadas pelo aumento das rendas
Patrícia Carvalho
20/09/2014 - PÚBLICO
Presidente da Câmara do Porto
quer que estabelecimentos históricos de "interesse público" sejam
protegidos do aumento muito elevado de rendas.
A sala do Hotel
Intercontinental, no Porto, estava cheia de investidores, proprietários e
potenciais proprietários de edifícios no centro da cidade e foi a eles que o
presidente da autarquia, Rui Moreira, se dirigiu, com um aviso muito claro: “Se
porventura pensarem que vão expulsar [cafés e lojas históricas] resistentes da
cidade, saibam que a Câmara do Porto utilizará todos os recursos legais ao seu
alcance para o impedir. Para sermos claros, no Estado Novo usavam-se
expropriações por esta razão”.
O autarca falava na abertura
da conferência Reabilitar para Revitalizar, que marcou o 10.º aniversário da
Porto Vivo – Sociedade de Reabilitação Urbana (SRU) e o fim do programa de
intervenção do Eixo Mouzinho/Flores, e tinha na audiência um outro interlocutor
especial – o secretário de Estado do Ordenamento do Território e da Conservação
da Natureza, Miguel de Castro Neto. Foi a ele que o presidente da Câmara do
Porto se dirigiu primeiro, manifestando-lhe o que disse ser a sua “principal
preocupação”. “Há um crescimento vertiginoso dos preços das transacções na
baixa e no centro histórico da cidade. Receio que a população autóctone possa
ser expulsa e não queremos nem imaginar a cidade sem esta população, sem a
forma como falam, como se comportam, como conhecem e se movimentam na cidade”,
disse.
Rui Moreira defendeu que a
actualização de rendas era “razoável e útil”, mas não a qualquer preço. E,
depois, voltou-se para os proprietários, dizendo que, apesar do “muito
respeito” que tem por eles, irá estar “muito alerta” em relação à forma como
eles lidam com espaços emblemáticos da cidade. “Estou muito preocupado com os
cafés históricos e lojas tradicionais da cidade. Eles que aguentaram tanto
tempo, subitamente, podem ser excluídos, quando, pela primeira vez, vêem que o
investimento que fizeram começa a dar frutos?”, questionou. E afiançou: “Não
queremos transformar o Porto na República Dominicana das cidades”.
À margem da conferência, o
autarca confirmou aos jornalistas que “no limite” está disposto a avançar com
expropriações, caso espaços que o município considere serem de interesse
municipal estejam em risco de fechar as portas por causa do aumento das rendas.
“Não consigo imaginar a cidade sem o [café] Guarany, sem o [café] Majestic, sem
a Loja das Sementes”, disse.
Ainda durante a conferência,
o secretário de Estado procurou sossegar o autarca, garantindo-lhe que a
revisão em curso da Lei das Rendas vai permitir “um regime de protecção
alargado” e, aos jornalistas, Miguel de Castro Neto, explica que o documento
que está na Assembleia da República já não prevê um regime de protecção apenas
para empresas que tenham até 5 trabalhadores e um milhão de euros de facturação
anual, dobrando, em ambos os casos, o valor. O prazo de transição para o regime
de renda livre também aumenta, passando a ser de oito anos.
Rui Moreira diz que isto não
chega. “Tenho dúvidas quanto ao número de trabalhadores”, afirmou o autarca,
referindo que “facilmente” alguns cafés históricos da cidade têm mais de 10
trabalhadores. O presidente da Câmara do
Porto pede, assim, que a intervenção na Lei das Rendas “vá um pouco mais longe”
e que haja maior protecção para estabelecimentos considerados de interesse
público. “Entendo que este interesse público não possa ser decidido pelo
município, pela proximidade, mas envolvendo, o exemplo, a Secretaria de Estado
da Cultura”, defendeu.
Na conferência, o presidente
da SRU, Álvaro Santos, mostrou-se optimista quanto ao futuro da reabilitação
urbana, defendendo que a nova missão da Porto Vivo é “alargar” essa
reabilitação a toda a cidade. Para tal, afirmou, “está a trabalhar, em estreita
parceira com a Câmara do Porto, na delimitação de novas Áreas de Reabilitação
Urbana, nomeadamente, dos Aliados, Cedofeita, Bonfim, Miragaia, Lapa e Santos
Pousada”.
O responsável pela Porto Vivo
disse ainda que a previsão para os próximos 15 anos é que estas novas ARU’s
venham a beneficiar de “cerca de 200 milhões de euros de investimento público”
e de “1300 milhões de euros” de investimento privado. Já as receitas fiscais e
de licenciamentos geradas por estes investimentos deverão ascender também aos
“200 milhões de euros”, afirmou.
O secretário de Estado também
tinha milhões para anunciar à plateia. Miguel de Castro Neto disse que o seu
gabinete está a “trabalhar” com a Secretaria de Estado do Desenvolvimento
Regional “na criação de mecanismos financeiros para a reabilitação urbana”. Uma
espécie de “balcão único” onde se poderão dirigir todos os que procuram
financiamento público – nacional, internacional e de fundos comunitários – para
a reabilitação urbana e que o governante tem a expectativa de ver nascer com
1500 milhões de euros, incluindo “600 milhões [do ciclo de fundos comunitários]
Portugal 20/20”, disse.
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