Menezes investigado por negócio
de lixos com empresa da Mota-Engil
MARGARIDA GOMES e
PEDRO SALES DIAS 19/09/2014 - PÚBLICO
Ex-autarca renegociou contrato de concessão de recolha de resíduos que vai
obrigar Gaia a pagar 150 milhões de euros. PJ investiga ainda outros negócios
que envolvem Luís Filipe Menezes e o PSD.
Um dos negócios
de Luís Filipe Menezes que está a ser investigado pela Polícia Judiciária
envolve a Suma, uma empresa de recolha de resíduos do grupo Mota-Engil, que
estará a lesar ainda a Câmara de Vila Nova de Gaia em vários milhões de euros.
O contrato, que vigorará até 2026, implica o pagamento de uma factura total de
150 milhões de euros. O ex-autarca deixou o município com uma divida de cerca
de 300 milhões de euros, o que faz de Gaia uma das autarquias mais endividadas
do país.
Um ano antes de
deixar a liderança da autarquia, em 2012, Menezes decide renegociar o contrato
de concessão que o município celebrou em 2001 com a Suma. Fê-lo, então, numa
altura em que o contrato ainda vigoraria, porém, por mais três anos. Este
contrato está na mira dos investigadores, confirmou ao PÚBLICO fonte da Polícia
Judiciária. E a Procuradoria-Geral da República assegurou também que decorre
uma investigação relacionada com actos imputados ao autarca social-democrata.
Até ao momento, porém, não foram constituídos arguidos no âmbito do processo.
Com a
renegociação com a Suma, Gaia fica, sem qualquer razão aparente, obrigada a
pagar à empresa mais 40% por cada tonelada de lixo recolhida. Com isto, os
cerca de oito milhões que eram anualmente pagos pelo serviço passam a 12
milhões, factura que é agora paga pela empresa municipal Águas de Gaia. Isto
porque, no processo de renegociação, Menezes desonerou a câmara da
responsabilidade pelo pagamento do serviço.
A empresa
municipal Águas de Gaia passou a ser a titular do contrato com a Suma,
assumindo a factura a pagar, mas a divida de cinco milhões - anterior à
renegociação - à empresa de recolha de resíduos permaneceu nas contas da
câmara. Contas feitas, o encargo traduziu-se numa penalização de mais dez euros
por cada tonelada, um encargo que foi diluído na factura mensal de cada
munícipe relativa à tarifa de recolha de resíduos. O PÚBLICO contactou a
Mota-Engil, mas o grupo empresarial não fez chegar, em tempo útil, qualquer
resposta às questões colocadas.
Suma pode pedir
mais dinheiro
Os encargos com a
renegociação podem acarretar para a empresa uma factura acrescida se a Suma
vier a exigir ser ressarcida pelo futuro transporte do lixo ao novo aterro de
Canedo, em Santa Maria da Feira, que deverá estar pronto dentro de um ano.
Quando o contrato foi revisto, Menezes não tratou de acautelar uma cláusula de
protecção que salvaguardasse a alteração do novo destino dos resíduos que
deixarão de ser levados para o aterro de Sermonde, em Gaia, passando então para
o concelho vizinho.
Se isso
acontecer, aumentará exponencialmente a factura prevista de 150 milhões de
euros a pagar por dez anos de serviços. Será necessário pagar à Suma a despesa
acrescida com os quilómetros a mais nas deslocações.
Este contrato,
que terá sido feito em forma de prestação de serviços, não mereceu o visto do
Tribunal de Contas, entidade, aliás, que decidiu investigar a contabilidade da
autarquia. Entre Abril de 2013 e Maio de 2014, aquele tribunal passou a pente
fino as contas do município.
Nesta
quinta-feira, a Câmara de Gaia confirmou que a Polícia Judiciária fez buscas a
“vastos documentos” da autarquia e das empresas municipais Águas de Gaia e
Gaianima relativos ao anterior mandato, sob o mandato de Menezes, noticiada
pela revista Visão. O socialista Eduardo Vítor Rodrigues, que tirou a liderança
da câmara ao PSD, salientou que não se vai pronunciar sobre as investigações,
em respeito pelo "bom nome das pessoas e do segredo de justiça".
Mas na mira das
autoridades estão ainda outras suspeitas que envolvem o próprio PSD e ampliam a
investigação a uma área que não se circunscreve apenas a Vila Nova de Gaia. Em
causa estão ajustes directos e concursos para campanhas do partido, contas e
facturas que não batem certo, contratações de agências de comunicação e
empresas, e transferências bancárias pouco transparentes. Cerca de um milhão de
euros do erário público terá sido usado para o financiamento ilegal de acções
de propaganda.
Em dez páginas de
investigação, a revista Visão descreve ainda em detalhe uma rede de interesses
entre empresas e figuras ligadas ao PSD que terá sido criada ao longo da última
década. Sobretudo nos últimos cinco anos, a rede terá servido para financiar
campanhas de dirigentes do partido, incluído a disputa interna pela liderança
em 2007. Não escapam a esta teia os interesses das estruturas locais e
nacionais e nem mesmo os dos Governo.
Campanhas do PSD
pagas com verbas públicas
O caso envolverá
várias pessoas, mas destacam-se duas figuras-chave entre elas, Cristina
Ferreira, directora da agência de publicidade WeBrand (e antes da Grafinvest) e
de novo Luis Filipe Menezes. Também o Correio da Manhã noticiou quinta-feira
que o património de Menezes está a ser investigado no âmbito de suspeitas de corrupção.
O jornal fala da compra, por meio milhão de euros, de um apartamento na Foz do
Douro, uma zona nobre da cidade do Porto, que consta da sua última declaração
de rendimentos enquanto titular de um cargo público.
Mas sobre isso,
Menezes escreveu na sua página pessoal desconhecer por completo a “infâmia”
descrita nas notícias. Garantiu ainda que irá responder de imediato “com todos
os meios que o Estado de Direito tem à sua disposição”.
A WeBrand está,
por seu lado, a ser investigada pelo Departamento de Investigação e Acção Penal
do Porto, a PJ e as Finanças, pelas suas ligações a empresas suspeitas de
crimes económicos e fiscais, noticiou a Visão.
Em 2007, Cristina
Ferreira, na altura líder da empresa Grafinvest, já fazia campanhas do PSD
nacional. Nesse ano, Menezes candidatou-se à liderança dos sociais-democratas,
sob o lema Ganhar Portugal, e venceu. A campanha tinha como director Marco
António Costa, que era vice-presidente da câmara de Gaia, e é hoje porta-voz do
PSD e coordenador permanente da Comissão Política Nacional. Embora a
candidatura tenha tido uma conta corrente na Grafinvest de menos de 70 mil
euros, os gastos terão sido o triplo.
Em 2009, ano de
três eleições – europeias, legislativas e autárquicas –, todas as campanhas do
PSD ficaram a cargo da nova empresa liderada por Cristina Ferreira, a WeBrand,
criada em 2008. Durante esse ano e os anos seguintes foram clientes da WeBrand
várias estruturas do PSD. De acordo com a Visão, as ordens internas na empresa eram para
triplicar os valores facturados. Além da sede nacional, as estruturas do
partido no Porto e em Gaia, lideradas na altura por Marco António Costa,
estarão entre as que geraram movimentos financeiros mais significativos.
É precisamente em
Gaia, onde Luís Filipe Menezes iniciou em 1997 o primeiro de quatro mandatos,
que se centra a investigação que terá surgido depois da última campanha
autárquica, em 2013, quando o ex-autarca se candidatou à Câmara do Porto e foi
acusado pelos seus adversários de ultrapassar os valores permitidos de gastos
em candidaturas.
Há precisamente
um ano, não tinha ainda começado a campanha para as autárquicas e Menezes tinha
já gasto 70% do orçamento para propaganda de rua, como o PÚBLICO então
avançou.
Derraparam então
as previsões feitas então pela candidatura para o aluguer de estruturas
metálicas para cartazes e telas e produção de outdoors - precisamente serviços
prestados pela WeBrand. No vermelho estavam também as despesas envolvidas com a
preparação de comícios e espectáculos, que incluíam pelo menos um porco no
espeto por cada bairro. Estas rubricas excederam três vezes mais a verba
cabimentada, que era de 10.757,02 euros.
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