sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Brigas de feira , por Vasco Pulido Valente




 Brigas de feira 
 Vasco Pulido Valente / 26-9-2014 / PÚBLICO

Não bastava o que nós sabíamos de quase toda a gente. Em pouco tempo — duas semanas — vieram à tona mais meia dúzia de presuntivos crimes da “classe política”, que tão sabiamente nos governa. O primeiro-ministro, que parecia estar acima de qualquer suspeita, foi denunciado por receber alguns dinheiros do Estado que a lei e os regulamentos da Assembleia da República não permitiam que recebesse. De qualquer maneira, recebesse ou não, as pequenas trafulhices de que o acusam, aparentemente cometidas há dezoito anos, já prescreveram e Passos Coelho não precisa de responder nada a ninguém. O que não impediu uma matilha de jornalistas e de comentadores de se atirarem à coisa como um cão a um osso. O primeiro-ministro deixou de repente de ser o homem da austeridade e da pobreza para passar a ser o homem da “exclusividade” e da “Tecnoforma”.

Se alguém investigasse com minúcia os pequenos delitos dos políticos e do funcionalismo, não tardaria a descobrir que o grosso dessas práticas é consentido e generalizado e não provoca a sombra de um sentimento de reprovação. A “exclusividade” e a “Tecnoforma” entram aqui como Pilatos no Credo. Não vêm a propósito e só se destinam a enfraquecer o Governo. Passos Coelho ficará com certeza enfraquecido e a “oposição” ganha um pretexto para vociferar aos céus em nome de virtudes que notoriamente lhe faltam; e para esconder com a gritaria do costume que lá em casa (e até fora dela) a tropa (de um lado e de outro) anda de faca na mão, pronta para um ajuste de contas muito pouco “democrático” e “transparente”.

A querela entre Costa e Seguro, de que nos servem doses diárias desde Agosto, acabou por se transformar numa briga de feira, que hoje atinge personagens menores, sem aviso ou justificação. Seguro, com o seu arzinho jesuítico e maneiras de menino de coro, puxou para a conversa Nuno Godinho de Matos e a sua suposta intimidade com os “negócios”. Não percebeu, coitado, que precisamente Nuno Godinho de Matos se queixou de que não tinha nenhuma (“entrava mudo e saía calado”); era um ornamento, não era um agente. Mas chegou isto para Seguro acusar Costa, Soares e uma parte do PS de conluio com o poder económico. A torpeza em que se tornou a nossa política não anuncia nada de bom. Do primeiro-ministro aos “candidatos” do Partido Socialista, ninguém respeita ninguém. Um país não pode funcionar assim.

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