Em lume brando
Por Luís Osório
publicado em 25
Set 2014 in
(jornal) i online
A pressão cresce em torno do primeiro- -ministro e a incerteza é maior que
ontem
O
primeiro-ministro pode estar inocente, mas sejamos claros: a declaração de
exclusividade assinada pelo seu próprio punho, publicada no
"Expresso" e no "Público", perdurará em muitas memórias.
Recapitulo. Na
pior das hipóteses, Passos Coelho recebeu dinheiro que não podia ter recebido. Se
entre 1995 e 1999 não era deputado em regime de exclusividade, jamais poderia
ter cobrado um subsídio de reintegração; mas se o seu contrato fosse de
exclusividade, então não poderia ter recebido dinheiro da Tecnoforma. No mais
tormentoso cenário, se não é culpado de uma coisa, é culpado da outra. Um
problema moral e mortal: é que o esquecimento atingiria os cofres do Estado,
pois, a confirmar-se tudo isto, não teria declarado os valores e pago os
respectivos impostos.
Para não ficar a
queimar em lume brando, pediu um parecer à procuradoria. A PGR ganhou tempo
adiando a resposta e o Bloco de Esquerda já avisou que não deixará arrefecer o
corpo.
Aconteceu há
quase duas décadas, tinha 30 anos e ainda cirandava pela juventude partidária e
pelos falsetes da ópera - uma eternidade. O assunto prescreveu, mas para um
primeiro-ministro em não há matérias que prescrevam. Ele sabe-o bem. O tema é
da ética republicana: o primeiro executivo do Estado não se pode comportar como
um chico-esperto saído de um livro de Eça. Isto se a pior das hipóteses se
comprovasse, uma situação que não interessa a quase ninguém.
A substituição de
líder seria um problema também para o PS. Para Costa ou Seguro é melhor que vá
até ao fim; sair agora por este "quilo de batatas" na mercearia do
bairro só atrapalharia na contagem de votos em 2015.
E mesmo para Rui
Rio e outros putativos líderes futuros seria criar um mártir, que, no altar das
vítimas, voltaria mais cedo ou mais tarde, e ainda mais forte, para ocupar o
lugar que lhe fora usurpado.
O desejo de
todos, menos do Bloco e do PCP, é que Passos Coelho prossiga até ao fim,
porque, no final de contas, todos (os que esperam no seu partido ou na
oposição) aguardam que vá até ao final num caminho que terminará com o seu
próprio calvário. Se têm razão, isso já é uma outra história, um dia tornarei
ao tema.
O
primeiro-ministro pode ainda assim estar inocente, mas conhece as regras do
jogo. Mesmo inocente haverá sempre quem o ache culpado. Não sairemos daqui, do
quentinho do lume onde todos os dias chamuscamos mais um bocadinho a
credibilidade do regime.
Sem comentários:
Enviar um comentário