Passos Coelho. Remediado e
transparente
O primeiro-ministro deve ter a mesma transparência que teve no caso da
licenciatura da Lusíada e mostrar as suas contas bancárias
Por Luís Rosa
publicado em 27
Set 2014 in
(jornal) i online
O debate
parlamentar de ontem não trouxe as respostas claras que se exigiam a Pedro
Passos Coelho. Passamos a saber que o primeiro--ministro recebeu despesas de
representação do Centro Português para a Cooperação (CPC), organização não
governamental ligada ao grupo Tecnoforma entre 1995 e 1999, mas desconhecemos
os montantes, a forma e as datas em que tais despesas foram pagas. A informação
é importante na estrita medida que existe uma denúncia anónima que refere um
valor de 150 mil euros que terá sido pago entre 97 e 99 – valor que Passos
Coelho continua a não desmentir. A situação, portanto, não ficou clarificada.
Todas as dúvidas
podiam ter ficado esclarecidas se Passos Coelho tivesse respondido afirmativamente
ao desafio de António José Seguro: que mostrasse as suas contas bancárias para
se perceber que montantes entraram na sua conta e de que forma. A quebra do
sigilo bancário, conjuntamente com a disponibilização das declarações de IRS,
poderia permitir o esclarecimento das dúvidas. Seria uma decisão a favor da
transparência. Quem não deve, não teme. Não seria nenhum “striptease” porque os
valores da transparência e do escrutínio dos titulares dos órgãos de soberania
sobrepõem-se ao direito da reserva da vida privada. Ser remediado e
transparente é uma conjugação muito feliz num político.
É importante
recordar o que Passos Coelho fez em 2012 quando surgiram suspeitas sobre a
forma como teria obtido a sua licenciatura em Economia pela Universidade Lusíada,
na mesma altura em que surgiu o mesmo problema com Miguel Relvas. Oprimeiro-ministro
foi célere e cortou o mal pela raiz: “Podem ver o meu curso à vontade”, foi a
resposta que deu, autorizando os jornalistas a consultar o seu processo
académico. Não tinha nada a temer e não hesitou em ceder dados privados à
comunicação social. Já devia ter feito o mesmo com os dados fiscais e
bancários.
Podemos
argumentar que quebrar o sigilo bancário ou fiscal será muito mais intrusivo do
que ver as notas e os exames académicos. Será, porventura. Mas o princípio é o
mesmo: o escrutínio do primeiro-ministro pode obrigar a ter acesso a dados da
sua vida privada. E tudo por uma razão: ochefe do governo não é um homem comum.
É eleito de forma universal e livre para liderar os destinos do governo de um
país e goza de um estatuto e de regalias especiais. Em troca, é escrutinado
pelos seus concidadãos de forma proporcional às suas obrigações. Uma delas é
cumprir a lei – de forma a ter moral para fazer cumprir a lei. Existindo uma
suspeita de fraude fiscal em cima da mesa, Passos Coelho deve clarificá-la de
forma total e absoluta.
É um erro
refugiar-se em afirmações de que as despesas de representação não são
remunerações, logo não passou recibos de rendimentos que não auferiu, ou no
arquivamento pelo Ministério Público da denúncia anónima, quando a mesma
aconteceu por prescrição. São questões formais que escondem o essencial: esta
questão não é judicial. É uma questão política concentrada em suspeitas que
ainda não desapareceram.
A oposição está a
avaliar uma comissão de inquérito parlamentar que só poderá ser verdadeiramente
útil se tiver direito a quebrar o sigilo bancário de Pedro Passos Coelho. Não é
claro que o possa fazer, na medida em que o caso já prescreveu. Mas a pressão
sobre o primeiro-ministro vai continuar. Este caso vai ter mais episódios.
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