Jovens detidos no meet do Vasco
da Gama condenados a prisão com pena suspensa
MARIA JOÃO LOPES
02/09/2014 - PÚBLICO
Ambos os rapazes obrigados a fazer trabalho a favor da comunidade numa
instituição de solidariedade social. Advogada vai recorrer.
Os dois jovens
acusados pelo Ministério Público (MP) na sequência de desacatos junto ao Centro
Comercial Vasco da Gama, em Lisboa, foram nesta terça-feira condenados a penas
de prisão efectiva, mas suspensas pelo período em que duram. O jovem de 20 anos
foi condenado a um ano e um mês, e o outro, de 23 anos, a dois anos e quatro
meses. Os dois ficam ainda obrigados a fazer trabalho a favor da comunidade em
instituições de solidariedade social. A advogada considerou a decisão do
tribunal "pesada".
Na sessão
anterior deste julgamento sumário, o MP, apesar de reconhecer que os jovens
estão inseridos socialmente e trabalham, pediu pena de prisão efectiva para um
e suspensa para outro. Um estava acusado de injúria agravada e os dois de
coacção e resistência a funcionário (no caso, à autoridade).
No caso do jovem
de 20 anos, que também estava acusado de injúria agravada, a juíza decidiu
alterar a qualificação jurídica dos factos provados, absolvendo-o do crime de
coacção e resistência a funcionário e condenando-o antes pelo crime de ofensa à
integridade física qualificada na forma tentada. O tribunal considerou que o
facto de o jovem ter esbracejado ou esperneado no momento da detenção não é um
comportamento que possa ser considerado como resistência e coacção a
funcionário, mas que o arremesso de pedras a agentes, embora não atingindo
nenhum, é uma ofensa à integridade física qualificada na forma tentada. Por
este crime e ainda pela injúria agravada – insultos aos agentes –, o jovem foi
condenado a uma pena única de prisão, suspensa, de um ano e um mês.
A juíza
considerou que o jovem, “inconformado” por ter sido impedido de entrar no
centro comercial devido à formação de uma barreira de segurança, chamou aos
polícias “filhos da puta” e “cabrões”, entre outros insultos. A juíza sublinhou
que o rapaz, com 19 anos à data dos factos, sabia que aquelas expressões eram
susceptíveis de atingir “a honra e consideração” dos agentes e que são
“generalizadamente reconhecidas como pejorativas”. Além disso, agarrou várias
pedras e arremessou-as. Mesmo não tendo acertado, agiu com o propósito de
atingir a integridade física dos agentes, disse a juíza. O tribunal considerou
que o jovem actuou “de forma livre e consciente”, sabendo que aquelas condutas
eram “proibidas e punidas”. O rapaz frequenta um curso vocacional de tratamento
de metais, em Setúbal, e tem um part time nas férias, numa estufa.
Na primeira
sessão, o jovem negou as injúrias e só admitiu ter atirado uma pedra, acto pelo
qual está “arrependido”. Contou que também foi agredido pela polícia, com
bastões e pontapés, e que chegou a perder a consciência.
O outro jovem,
lavador de carros de 23 anos, foi condenado pelo crime de coacção e resistência
à autoridade a dois anos e quatro meses de prisão, com pena suspensa. Segundo
disse a juíza, a namorada do rapaz, grávida de cinco meses naquela altura,
furou o cordão de segurança, junto das varandas, no piso térreo da Gare do
Oriente, e trocou gestos e palavras com agentes. As circunstâncias em que
caíram os óculos do polícia e os gestos e palavras trocados não ficaram
totalmente apurados. No caso desta jovem estará, aliás, a decorrer um outro
processo-crime autónomo.
Segundo o
tribunal, o jovem, ao ver ao longe a namorada naquela situação, também furou o
cordão e dirigiu-se ao agente pelas costas, agarrando-o pelos braços e ombros.
As pancadas que desferiu, quando outros agentes foram ajudar o colega,
resultaram na fractura do dedo de um polícia, considerou ainda o tribunal.
Também neste caso a juíza sublinhou que o jovem sabia que aquela conduta é
“proibida por lei”.
Na primeira
sessão, este jovem contou que um agente deitou a namorada dele ao chão e disse
estar-se a “borrifar” para a filha dele, que “era preta”. O rapaz negou os
socos e pontapés aos agentes e disse ainda que estes o agrediram na esquadra.
Exemplo
A juíza entendeu,
de uma forma geral, que os depoimentos dos agentes foram “objectivos”,
“isentos”, com “encadeamento lógico”, seguros e marcados pelo “rigor e
minúcia”. Pelo contrário, algumas testemunhas de defesa dos jovens, até pela
relação de parentesco, foram consideradas “menos seguras”, menos credíveis e
reveladoras de “incongruências”.
O tribunal fez
questão de sublinhar, por um lado, que é devido “respeito” aos agentes
policiais, mas, por outro, garantiu ter tido em consideração que os jovens não
têm antecedentes criminais, estão inseridos a nível social e escolar e que um
deles vai ser pai em Dezembro. No caso do jovem mais novo, foi considerada a
idade e aplicado um regime especial para jovens na definição da pena.
Os rapazes estão
também sujeitos ao regime de prova, que poderá passar por apresentações
periódicas em moldes a definir. O mais novo terá de cumprir 90 horas de
trabalho a favor da comunidade e o mais velho 120, em instituições de
solidariedade social. Neste sentido, a juíza frisou que os jovens devem cumprir
“escrupulosamente” o plano que for estipulado pela Direcção-Geral de Reinserção
Social. De acordo com a advogada que representou os jovens nesta sessão, Ana
Cristina Chéu, os moldes exactos em que decorrerá o trabalho a favor da comunidade
e o regime de prova ainda serão estipulados.
A advogada, que
vai recorrer, considerou a decisão do tribunal “pesada”. Lembrou que o caso
teve um grande eco na comunicação social, com “alarme acentuado”, e defendeu
que, pelas características dos jovens, as penas poderiam ter sido menos
severas. Para Ana Cristina Chéu, a pena de dois anos e quatro meses é “bastante
gravosa”. “No meio de 600 jovens, alguém tinha de ser chamado à justiça”,
disse, acreditando que estes rapazes podem ter sido, “talvez”, usados como
“exemplo”
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