sábado, 6 de setembro de 2014

De banqueiro acidental a ex-ministro condenado

Armando Vara é próximo de Sócrates, mas também de Jorge Coelho, Edite Estrela, Laurentino Dias. Notícias não negadas têm-no dado como estando ligado à maçonaria do Grande Oriente Lusitano.

De banqueiro acidental a ex-ministro condenado
Cristina Ferreira / 6-9-2014 / PÚBLICO

Há cinco anos, quando foi constituído arguido no caso Face Oculta e ainda era administrador no BCP, o conselho de supervisão do banco mantinha a confiança em Armando Vara. O administrador não se sentia culpado. Os investidores do BCP davam-lhe o benefício da dúvida. E perguntavam: “Quem se suja por 10 mil euros quando ganha 500 mil por ano?”
Transmontano, de Lagarelhos, Vara subiu os degraus do poder ao lado de José Sócrates (deputado, secretário de Estado, ministro). É desde 1987 dirigente socialista, tinha apenas o liceu e trabalhava numa agência da Caixa Geral de Depósitos. Chega à presidência da distrital de Bragança, tomando o pulso ao aparelho partidário. Anos depois é chamado aos Governos de António Guterres.
Em 1998, como secretário de Estado, numa visita a Ourique, desentendeu-se com o presidente da câmara local de então. Acabou acusado de injúrias e difamação num processo que acabou amnistiado. Por conta ainda deste caso, mas numa acção cível, foi condenado a pagar uma indemnização de 450 contos ao autarca José Raul Santos (PSD). O julgamento ficou marcado pelo desfilar de testemunhas a garantir que, em Trás-os-Montes, onde Vara cresceu, as palavras por este dirigidas a José Raul Santos não eram insultuosas.
Armando Vara é próximo de Sócrates, mas também de Jorge Coelho, Edite Estrela, Laurentino Dias. Notícias não negadas têm-no dado como estando ligado à maçonaria do Grande Oriente Lusitano.
No seu percurso destaca-se o aparecimento no buzinão da Ponte 25 de Abril, contra o cavaquismo. Amigo de Joaquim Oliveira, da Olivedesportos, Vara também tentou, em vão, chegar à liderança do seu Benfica.
Em 2005 licencia-se em Relações Internacionais na Universidade Independente, a mesma onde Sócrates se diplomou. O regresso à CGD para ocupar o lugar de director dá-se em 2001. A mudança de “sector” reduzlhe a exposição mediática, resguardao do escrutínio público e oferece-lhe remunerações apetitosas.
Em 2005, o PS de José Sócrates ganha as legislativas. Vara tem 51 anos quando é nomeado administrador da CGD. Toma posse no meio de grande controvérsia: um job para um boy?
É certo que a alta finança é um espaço de encontro entre a política e os grandes interesses económicos, porque os negócios necessitam das autorizações governamentais. Uns dizem que faz parte do “polvo” socialista, outros pensam o contrário. Mas Vara vai procurar fazer esquecer a desconfiança que se gerou à sua volta, trabalhando.
É neste contexto que em 2008 chega à vice-presidência do BCP, por convite do socialista Santos Ferreira. A transição da CGD para o BCP deixa rasto, quando se apura terem sido dados créditos em larga escala a accionistas do BCP para que estes entrassem na disputa pelo controlo do banco. Em troca, a CGD recebeu acções cotadas. Com a crise, o banco assumiu menos-valias de centenas de milhões, o que levou o Estado a aumentar o capital. Mesmo as vozes hostis do sector reconheciam a Vara, no momento do escândalo rebentou, um gosto por resolver problemas.
Mas Armando Vara tem marcas que não são fáceis de apagar: ascendeu a banqueiro com o “rótulo” de emissário político e, em 2001, já como ministro da Juventude e Desporto, foi apanhado na polémica à volta da Fundação para a Prevenção e Segurança. Uma instituição privada que criou no final dos anos 90 com fundos estatais doados quando estava no Governo de António Guterres como secretário de Estado da Administração Interna.
Quando o caso é conhecido, o então Presidente da República Jorge Sampaio batalhou para que Vara deixasse o Governo. Vara demitiu-se. Em causa estavam irregularidades administrativas, e não criminais, e o processo foi arquivado. Vara volt a agora às páginas dos jornais. Aos olhos do grande público a desconfiança antiga materializou-se com uma condenação em tribunal. com

Álvaro Vieira Republicação (com alterações) de um texto publicado a 30/9/2009

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