domingo, 7 de setembro de 2014

A(s) “circunstância(s)” que terão condenado Armando Vara

O Curriculo Modelo de ascenção meteórica no “Nouveau Regime”
“Meritocracia” ou  "prise du pouvoir par la 'canaille'" !?

FACE OCULTA
A(s) “circunstância(s)” que terão condenado Armando Vara

SÓNIA SIMÕES - 6/9/2014, 19:30 / OBSERVADOR

O socialista condenado a cinco anos de cadeia passou de bancário a banqueiro na CGD. Pelo caminho, foi secretário de Estado e ministro de António Guterres.
Saiu combalido do Tribunal de Aveiro e disse estar em estado de choque. Armando Vara atirou, depois, uma justificação para a pena de cinco anos de prisão que acabava de lhe ser aplicada: “Acho que tem muito a ver com a minha circunstância”. Que circunstâncias são essas? Perguntaram-lhe. O ex-governante não respondeu mais e abandonou o tribunal.

Nascido em Vinhais, Bragança, em 1954, o contacto de Armando António Martins Vara com os números começou aos 17 anos com meia dúzia de oficinas de automóveis a quem fazia a contabilidade. Ambicioso, Vara conseguiu chegar ao serviço de atendimento da Caixa Geral de Depósitos de Mogadouro. O início de um percurso que o iria fazer ascender. E não demorou muito.

25 de abril de 1974. Liberdade. Mário Soares vai a Bragança e faz um discurso que incendeia a cabeça de Vara. De tal forma que Armando Vara corre para filiar-se no Partido Socialista. Chegou a secretário coordenador da Federação Distrital de Bragança e, até, fundou um jornal local com o apoio partidário. Começa a subir os degraus da carreira política. E a prova é que em 1985, com 31 anos, já estava a sentar-se na bancada socialista da Assembleia da República, em Lisboa, como deputado. Tinha apenas o 12º ano, mas era um homem organizado e com grande capacidade de trabalho – diz quem o conhece. E depressa chegou a líder da bancada socialista.

Em 1989, Vara abre uma empresa com o amigo José Sócrates. A Sovenco (Sociedade de Venda de Combustíveis) foi criada na sede de uma das empresas de José Guilherme, o empresário que já deu milhões de euros como prenda ao banqueiro Ricardo Salgado. Dois anos depois, a sua ligação à Amadora leva-o a candidatar-se a presidente da câmara. Perdeu e ficou como vereador.

Chega o ano de 1995 e quando António Guterres é eleito primeiro-ministro convida-o para secretário de estado da Administração Interna. Para o seu amigo José Sócrates – com quem foi apanhado a falar nas escutas do processo “Face Oculta”- Guterres escolhe a secretaria de estado do Ambiente.

E foi na secretaria de estado da Administração Interna, segundo o Público,  que Armando Vara, recorreu ao diretor-geral do GEPI (Gabinete de Estudos e Planeamento de Instalações do MAI) e a engenheiros que dele dependiam para projetar a moradia que construiu perto de Montemor-o-Novo. O engenheiro António José Morais tinha já sido seu assessor e foi Vara quem escolheu promovê-lo. Ali ficou até 2002.

Na equipa que planeou casa do então governante também trabalhou a companheira do engenheiro, a arquiteta Ana Simões, na altura companheira de António José Morais. Os dois acabariam por sentar-se no banco dos réus, depois de acusados de corrupção e branqueamento de capitais na construção de uma estação de tratamento de lixo na Cova da Beira. Acabaram absolvidos.

Antes desta acusação, António José Morais chegou a dar aulas na Universidade Independente. Foi professor de José Sócrates em quatro disciplinas. Em 2005, quando Sócrates chegou ao poder como primeiro-ministro, o engenheiro António José Morais foi nomeado para o Instituto de Gestão Financeira e Infraestruturas do Ministério da Justiça. Saiu ao fim de nove meses.

Corria o ano 2000 quando Vara é nomeado ministro da Juventude e Desporto. Não por muito tempo. Uma polémica em torno da Fundação para a Prevenção Rodoviária, que criara sob dependência do Ministério da Administração Interna (MAI), conduziu à sua demissão.

A Fundação tinha sido criada para fazer cumprir os objetivos do MAI. E, ao contrário do que a lei obriga, não dispunha de qualquer património. Vivia da receita transferida pelo MAI, para campanhas de prevenção rodoviária, por exemplo. O Tribunal de Contas ainda fez uma auditoria à Fundação. Comissões parlamentares sobre o tema tentaram perceber se havia irregularidades. Acabou tudo arquivado em 2005. A Procuradoria-Geral da República justificou que Vara não tinha cometido qualquer irregularidade.

Vara demitiu-se de funções, mas o seu caminho profissional continuava no sentido ascendente. Chegou a presidir à comissão para as eleições autárquicas. E aproveitou a altura para frequentar uma pós-graduação em Gestão Empresarial. Também aqui as suas habilitações já levantavam questões. Sempre disse no seu currículo que tinha frequentado a licenciatura de Filosofia na Universidade Nova de Lisboa, mas que não tinha terminado. No currículo que tornou público colocava sempre a informação:

- 2004: Pós-Gradução em Gestão Empresarial

- 2005: Licenciatura em Relações Internacionais na Universidade Independente.


 Nada que afetasse a sua ascensão profissional. Em 2005, o então ministro Teixeira dos Santos convida-o para voltar à casa onde começou, a Caixa Geral de Depósitos. Mas desta vez não era para o atendimento ao balcão. Vara progrediu de tal forma que se tornou num banqueiro. Integra como vogal o conselho de administração. Três anos depois transita para o Millenium BCP.

É em 2009 que o então vice-presidente do Millennium BCP, Armando Vara, é constituído arguido no âmbito do processo Face Oculta. Suspeito de ter sido contactado pelo empresário Manuel Godinho a troco de vantagens patrimoniais ou não patrimoniais para angariar negócios junto de empresas do setor empresarial do Estado, na área dos resíduos industriais.


Vara suspende funções (embora continue a receber ordenado) e acaba por demitir-se quando é formalmente acusado, já em 2010. Três meses depois, é nomeado presidente do conselho de administração da cimenteira Camargo Correa para África, onde se mantém. Ainda recebe 2 mil euros de pensão vitalícia pelos cargos políticos que desempenhou.

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