quinta-feira, 3 de abril de 2014

Mar ameaça inundar zonas urbanas da Vagueira e da Caparica até 2100

Na Costa da Caparica, as setas verdes representam o ponto em que o mar galga o paredão. Na zona a vermelho, assinala-se o avanço das ondas sobre o areal até 2050 PROJECTO CHANGE

Basta o mar tocar na cota dos três metros e a água inundará a aldeia da Cova do Vapor PROJECTO CHANGE


Marina de Vilamoura poderá ser atingida pela subida do nível do mar, basta que a água chegue à cota dos 3,7 metros PROJECTO CHANGE

Mar ameaça inundar zonas urbanas da Vagueira e da Caparica até 2100
Investigadores do projecto Change traçam cenários preocupantes sobre o avanço do mar na costa portuguesa
Marisa Soares / 3-4-2014 / PÚBLICO

Se o nível do mar subir um metro até 2100, como admitem os cientistas, as zonas actualmente urbanizadas nas praias da Vagueira, em Vagos (Aveiro), e da Costa da Caparica, Almada, vão ficar inundadas. O mesmo acontecerá, com menos gravidade, em Quarteira, Loulé. Mas segundo os mapas de vulnerabilidade elaborados por investigadores da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (UL) para o projecto Change, não é preciso esperar tanto para ver as ondas chegarem às casas.
No troço de costa Barra-Vagueira, que é o mais problemático a nível nacional e um dos mais preocupantes da Europa em termos de inundações costeiras, o mar pode avançar terra dentro ao longo de 11,6 metros já em 2025. Isto sem contar com o agravamento da erosão costeira, que nas últimas décadas se acentuou – só entre 1973 e 1996, a linha de costa recuou 200 metros a sul da Vagueira.
“Esta é uma ‘ bomba-relógio’ e deve ser uma das propriedades nacionais”, defende Luísa Schmidt, investigadora do Instituto de Ciências Sociais da UL e coordenadora do projecto Change, apresentado ontem em Lisboa. Os investigadores analisaram os impactos sociais e ambientais das alterações climáticas em três zonas costeiras: Barra-Vagueira, Costa da Caparica-Fonte da Telha e QuarteiraVale do Lobo. “São zonas vulneráveis, muito expostas às alterações climáticas, e simultaneamente muito construídas, o que aumenta o risco”, explica Luísa Schmidt.
Segundo os mapas de susceptibilidade traçados pela equipa de Filipe Duarte Santos, especialista em alterações climáticas, o areal da Vagueira está condenado a desaparecer se nada for feito. Em caso de tempestade, no período da preia-mar, a água vai galgar a linha de costa com cada vez mais frequência. Em 2100, o mar pode avançar 14,9 metros sobre a terra, inundando a zona construída na cota dos 4,1 metros, cerca de um metro acima da cota a que se encontram hoje as casas. A forte pressão urbanística na zona – entre 1970 e 2001, o número de alojamentos cresceu 244,2% – foi um dos factores que contribuíram para agravar a erosão costeira, concluem os investigadores.
Na Caparica, as projecções mostram que o mar deverá galgar o cordão dunar desde a Cova do Vapor até à Fonte da Telha já em 2025, mas o perigo de inundação é maior em 2100. “Em qualquer um dos cenários, mais ou menos gravoso, há inundação até à cota dos 4,1 metros”, afirmou Gil Penha-Lopes, um dos autores dos mapas. Quando a água chegar à cota dos três metros, a aldeia da Cova do Vapor ficará submersa.
No Algarve, em Quarteira, onde o número de alojamentos cresceu 2274% entre 1960 e 2001 e continuou a aumentar até 2011, basta que o mar chegue à cota dos 3,7 metros para atingir a marina de Vilamoura.
O que fazer com estes cenários sobre a mesa? Primeiro há que tomar medidas que resolvam no curto prazo os problemas causados pelos temporais deste Inverno, responde Luísa Schmidt. “Mas ao mesmo tempo tem que haver um plano geral para o país, assente num pacto de regime que permita definir prioridades”, acrescenta.

“Os ciclos curtos dos governos não podem hipotecar o futuro da nossa faixa costeira”, defende a especialista, reforçando a necessidade de criar equipas multidisciplinares de “mediadores” independentes para fazer a ponte entre as instituições e as populações, que de uma forma geral não confiam no Estado para resolver os problemas do litoral. A investigadora defende a necessidade de “monitorizar todo o litoral e não apenas um quarto da costa”, como é actualmente feito pela Agência Portuguesa do Ambiente.

Sem comentários: