Um equívoco anunciado
AUGUSTO M. SEABRA
28/04/2015 / PÚBLICO
Embora com uma crispação
inusitada e uma rapidez muito maior do que se poderia prever, a demissão de
António Pinto Ribeiro das suas novas funções na Gulbenkian, como coordenador de
todos os serviços com actividade de programação cultural – para o qual tinha
sido nomeado no princípio de Fevereiro – e como consultor externo com a tarefa
de programador do fórum Próximo Futuro, é o desfecho de um equívoco anunciado.
No seu trabalho
ao lado de Madalena Perdigão nos Encontros Acarte da Gulbenkian, desde meados
dos anos 80, depois na programação da Culturgest (1992-2004) e de seguida
novamente na Gulbenkian, no Estado do Mundo e depois no Próximo Futuro, Pinto
Ribeiro, mais do que ninguém, impôs a figura do programador, com uma vocação
interdisciplinar, cosmopolita e multicultural, mesmo que no tocante a este
último ponto seja questionável a sua especial incidência no Brasil, na América
Latina e na África negra.
Esta nova figura
de coordenador justificava-se?
Há um historial
na Gulbenkian de difícil relação entre os diversos serviços, por isso o
propósito de pôr a dialogar os que programam de costas voltadas seria louvável.
Esqueceu-se todavia que a actividade desses diversos serviços, com o grau de
especialização e intensidade que cada um deles acarreta, não é compaginável com
uma figura solitária numa megaestrutura como a Gulbenkian. Esse era o equívoco
de base na nomeação de Pinto Ribeiro: uma ambivalência entre a figura de
coordenador e impulsionador do diálogo entre os serviços e um perfil, de facto,
de director-geral.
Mais: embora com
hesitações a Gulbenkian vinha dando passos, que só são de aplaudir, no sentido
dos directores de serviços serem escolhidos por concurso público internacional.
Como seria crível que esses responsáveis tivessem por sua vez de discutir o seu
plano de trabalho com alguém de cargo intermédio entre eles e a Administração,
o tal coordenador que fora uma escolha directa? Ora é o próprio Pinto Ribeiro
que afirma não se rever enquanto “técnico de coordenação” e mesmo,
surpreendentemente para alguém com a sua experiência, se queixa de que
encontrou já “a maior parte da programação definida” como se desconhecesse que
ela se estabelece com dois ou três anos de antecedência.
Com um tal
equívoco, o desfecho era previsível.
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