Ou há moralidade
ou “comem” todos ....
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Auditoria revela descontrolo
financeiro no Tribunal Constitucional
PEDRO SALES DIAS
e MARIA JOÃO LOPES 21/04/2015 – PÚBLICO
Primeira auditoria feita ao TC
coloca em causa a "fiabilidade" da prestação de contas do tribunal e
aponta várias irregularidades. Cada juiz tem um veículo para uso pessoal e há
gastos não justificados. Constitucional reage com “verdadeiro desgosto”,
“preocupação” e fala em "infundadas conclusões".
A primeira
auditoria alguma vez feita ao Tribunal Constitucional (TC) revelou um
descontrolo financeiro nas contas daquela instância superior. O cenário
retratado pelo Tribunal de Contas (TdC), naquela que é a última auditoria a
tribunais superiores – antes foi fiscalizado o Supremo Tribunal de Justiça e o
Supremo Tribunal Administrativo –, é o de desorganização nas contas do
Constitucional relativas a 2013.
A auditoria,
revelada esta terça-feira no site do TdC, considera “desfavorável” a
“fiabilidade dos documentos de prestação de contas” desse ano face a erros e
irregularidades. Entre estes, o TdC destaca o facto de o sistema de controlo
interno do tribunal fiscalizado ser “deficiente”, de não existir um manual de
procedimentos de controlo interno, assim como o de não se registar o
cumprimento dos “princípios e regras orçamentais” relativamente a 1,4 milhões
de euros no âmbito da “contabilização da receita e da despesa no orçamento”.
Em comunicado, o
Tribunal Constitucional regista “com preocupação” que se formulem “infundadas
conclusões” e emitam “recomendações aparentemente assentes em deficiente
compreensão do seu estatuto constitucional próprio, do qual decorre a sua
autonomia administrativa e financeira”. Em resposta, o presidente do TC,
Joaquim Sousa Ribeiro, garante que vão corrigir “com a brevidade possível” as
situações que possam “estar em desconformidade” e foi com “verdadeiro desgosto”
e “preocupação” que reagiu ao relatório da auditoria: “Seguramente injusto
perante o que é a realidade” e a “gestão financeira” do TC, diz.
Fica também claro
no relatório que o TC não contabilizou nas suas contas 13 mil euros
correspondentes ao accionamento de garantias bancárias assim como a transacção
de 21 mil euros em gastos.
O exame às contas
do TC permitiu também perceber que cada um dos 13 juízes conselheiros tem
direito a um automóvel do tribunal para uso pessoal desde o ano 2000. Além das
viaturas, são ainda entregues cartões de combustível e de via verde, porém, o
TdC salienta que apenas o presidente e o vice-presidente do TC têm direito a
veículo oficial, não existindo regulamentação sobre o uso de veículos de
serviços gerais para os restantes juízes.
O TC responde que
a lei prevê que pode ser “afectado ao uso pessoal de cada juiz” um carro da
frota do tribunal, que pode ser conduzido pelo próprio, “designadamente
enquanto o quadro de pessoal do tribunal não estiver dotado de um número de
motoristas suficiente para a condução de cada uma dessas viaturas”.
Joaquim Sousa
Ribeiro alega ainda, numa extensa resposta, que “nos tribunais dotados de
autonomia administrativa e financeira compete ao presidente regular, por
despacho, a utilização pelos magistrados dos veículos da respectiva frota”. No
caso concreto, afectar aos magistrados um veículo foi uma “solução mais
económica para o Estado, pois a alternativa seria a entrada ao serviço de mais
onze motoristas”, lê-se.
As
irregularidades verificam-se ainda no pagamento do subsídio de refeição que os
juízes recebem em acumulação com as ajudas de custo por participação em cada
sessão do tribunal. O TdC considera que essa acumulação se regista sem
“conformidade legal”. Os magistrados não poderiam acumular as verbas pelo que o
“abono diário do subsídio de refeição” teria de ser descontado. O pagamento
global aos juízes de 12.329 euros a esse título entre Novembro de 2012 e
Dezembro de 2013 é ilegal e “resultaram num dano efectivo para o erário
público”.
Joaquim Sousa
Ribeiro ressalva, contudo, que “até ao presente, nunca as falhas e as
deficiências” trouxeram “perdas patrimoniais para o Estado”. O magistrado
considera ainda que “uma vez que a ajuda de custo é abonada por cada dia de
sessão do tribunal em que os juízes participem, e por mais dois dias por
semana, independentemente da deslocação implicar almoço, jantar ou dormida, não
pode afirmar-se que, neste caso, o pagamento da ajuda de custo corresponda ao
pagamento de duas refeições e alojamento”.
Nesse ponto, o
TdC aponta precisamente entre os responsáveis pela infracção sancionatória
continuada o presidente do TC, Joaquim Sousa Ribeiro, e a secretária-geral do
Constitucional, Maria Lopes.
O TdC sublinha
ainda que o Constitucional pagou os suplementos de disponibilidade permanente a
dois dirigentes sem um despacho de autorização que mesmo existindo não teria
“suporte legal”. A auditoria considera igualmente que o suplemento de forças de
segurança pago a guardas da GNR e o pagamento de suplementos de risco e de
disponibilidade permanente a agentes da PSP foram pagos indevidamente (todos
eles motoristas ao serviço do TC).
Durante a
fiscalização, o TdC verificou ainda que nas instalações deste funciona um bar
“explorado por particulares” sem contrato de arrendamento, autorização e mesmo
sem pagar renda. Além da “cedência gratuita”, o TC ainda assume as despesas de
luz, água e gás do bar cuja concessão de serviço pública está assim irregular. Joaquim
Sousa Ribeiro explicou, no contraditório, que a “solução é precária” e
“transitória”.
Face às
irregularidades detectadas, o TdC, que remeteu as suas conclusões para o
representante da Procuradoria-Geral da República junto do tribunal, recomenda
que o Constitucional implemente sistemas de “gestão e controlo”, “promova regulamentação
adequada de utilização e de controlo dos veículos de serviços gerais” e “deduza
o subsídio de refeição” nas ajudas de custo aos magistrados.
Por seu lado, o
presidente do TC salienta que “no decurso da auditoria, algumas decisões já
foram tomadas e alguns procedimentos adoptados, nesse sentido, estando outros
em vias de implementação”, acrescentando que “o TC procederá aos reajustamentos
necessários para aperfeiçoamento do seu sistema de controlo interno”, em
matéria de registos contabilísticos e financeiros. O presidente justifica ainda
que a “escassez de recursos, mormente humanos” poderá, “em muitos casos”,
explicar “o não cumprimento rigoroso de exigências formais”.
O presidente do
TC recorda também que, face à “conjuntura”, tomou medidas que o relatório
“silencia”: pôs termo a um contrato de fornecimento de almoços; denunciou o
contrato de arrendamento de um prédio contíguo ao Palácio Ratton; renegociou
contratos de comunicações móveis, de seguros individuais de automóveis com “a
celebração de um contrato de frota automóvel, o que implicou uma redução em
mais de 50% da despesa anual”. Entre outras medidas, cessaram “a colaboração de
cinco das onze secretárias do gabinete dos juízes”.
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