Filha de Salgueiro Maia no
Luxemburgo depois de "convidada a sair" por Passos Coelho
Catarina Salgueiro Maia compara a
situação atual de Portugal ao terceiro mundo.
26-4-2015 in DN online
A filha do
capitão de Abril Salgueiro Maia, a viver no Luxemburgo há quatro anos, diz que
foi "convidada" a sair de Portugal pelo primeiro-ministro Passos
Coelho, lamentando a situação atual do país, que compara ao terceiro mundo.
Catarina
Salgueiro Maia, de 29 anos, deixou Portugal em 2011, ano em que a 'troika'
chegou a Portugal e "em que o primeiro-ministro aconselhou as pessoas a
ganhar experiência no estrangeiro", ironizou, recordando os apelos do
Governo à emigração. Com o marido desempregado e um filho asmático, a filha do
Capitão de Abril decidiu procurar trabalho no estrangeiro.
"O meu
marido esteve seis meses sem trabalho e foi quando decidimos arriscar. Ele
tinha cá família e acabámos por decidir vir", contou Catarina Salgueiro
Maia à Lusa, durante um jantar de homenagem ao pai, organizado no sábado, 25 de
Abril, pelo portal de notícias português Bom Dia, em que também participaram o
deputado socialista Paulo Pisco e o cônsul de Portugal no Luxemburgo.
"Eu saí do
meu país, porque precisava de estabilidade financeira para criar o meu filho,
que é asmático, e o medicamento não é comparticipado em Portugal, apesar de ser
uma doença crónica", explicou.
"Uma
consulta de alergologia no hospital público demora cerca de dois anos e meio, e
nem vou falar dos idosos que morrem nas salas de espera, é um horror",
lamentou, considerando que "Portugal, neste momento, é um país
terceiro-mundista".
Com três cadeiras
por terminar no curso de Línguas, Literaturas e Culturas, na Faculdade de Letras
da Universidade de Lisboa, Catarina Salgueiro Maia acabaria por só conseguir
emprego como empregada num café português, no Luxemburgo, onde chegou a
trabalhar "mais de 17 horas por dia", por um salário de 1.300 euros,
um valor inferior ao salário mínimo no país, que ronda atualmente os 1.900
euros.
Há um ano, a
família decidiu regressar a Portugal, mas em fevereiro acabariam por voltar
para o Luxemburgo.
"Mais valia
termos ficado quietos. Nós aqui temos uma ideia diferente da situação em que
Portugal está: sabemos que Portugal não está bem, mas não temos consciência de
que está tão mal", lamentou, garantindo que encontrou o país
"pior" do que quando emigrou em 2011.
No dia em que o
pai foi homenageado pela comunidade portuguesa no Luxemburgo, Catarina
Salgueiro Maia disse à Lusa que pensa "muitas vezes" no que diria
sobre a situação atual do país, o Capitão de Abril que comandou a coluna de
blindados que forçaria a rendição de Marcello Caetano.
"Às vezes
digo que o meu pai, lá em baixo, deve estar às voltinhas no caixão. O meu pai
lutou por uma democracia, por um país livre, correto, aberto", recordou,
lamentando que hoje haja "pessoas a passar fome, idosos que, ou comem ou
tomam medicamentos, e pessoas que são postas na rua, por não poderem pagar a
renda".
Durante a
homenagem a Salgueiro Maia, o deputado socialista Paulo Pisco considerou que o
capitão de Abril "é um exemplo para todos os portugueses", recordando
ainda a pensão que lhe foi recusada em 1988, sob o governo de Cavaco Silva,
tendo sido depois atribuída a dois antigos inspetores da PIDE, um episódio que
considerou "indigno da democracia".
Para Catarina
Salgueiro Maia, o caso revela a "falta de coerência" do atual
Presidente da República.
"Ele
primeiro deu prémios a ex-inspetores da PIDE que torturavam, que massacravam,
que matavam, que prendiam, e recusa prémios a quem lutou realmente pelo país? Onde
é que está a coerência dele?", questionou.
"Acho
ridículo uma pessoa que não deu o mínimo valor a quem lutou pelo país, na
altura em que devia ter dado, conseguir subir a um palanque, 41 anos depois e
dizer que vivemos em democracia e agradecer a quem fez o 25 de Abril",
criticou a filha de Salgueiro Maia.
Cerca de 60
pessoas participaram no jantar de homenagem ao capitão de Abril, organizado
pelo portal Bom Dia, um gesto que comoveu a filha.
"É bom saber
que, fora de Portugal, o meu pai continua a ser lembrado, e que há pessoas que
dão valor àquilo que ele e os outros capitães de Abril conseguiram para o
país", disse, considerando que os ideais da Revolução dos Cravos deviam
ser recordados durante "todo o ano".
"É preciso
que se vivam os ideais de Abril não só neste dia, mas ao longo do ano. Eu acho
que é disso que Portugal também está a precisar: defender os ideais de Abril
todos os dias, e não ser só para a fotografia", concluiu.
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